
Harold Pinter
Prémio Nobel da Literatura 2005
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Sou um amante do teatro. Vi muito, o mais possível, desde 68/69. Em Coimbra há(via) duas companhias estupendas e opostas: o TEUC (grego/clássico) e o CITAC (moderno/stavilasky-grotovskiano). A Gulbenkian subsidiava a contratação de encenadores sul-americanos (pelo espanholês) de renome internacional. Vi, aprendi, gozei e considero-me um meio-teatrólogo muito difícil de satisfazer.Não tenho culpa. Vi do melhor, do no Japão (Kabuki e Nô) a Nova Iorque (“Einstein on the Beach”, de Bob Wilson), E vi do mais melhor bom em Portugal (Coimbra, Porto e muito em Lisboa). Da tragédia grega ao Living Theatre. Do teatro do Absurdo ao Peter Brook (“Birds”, um espanto no Convento do Beato). Onde vi também “outra coisa do outro mundo”: «Novos Contos da Montanha», de Miguel Torga, que é(ra) de leitura obrigatória no secundário, numa encenação desse génio singular que é João Brites e do seu “O Bando” irrequieto.
Sem falar da “Ópera dos Três Vinténs”, de Bertolt Brecht, pelo TEC (Cascais), encenada por Carlos Avilez, em 1976. Esta trupe, já em 1968, tinha varrido muitas das teias de aranha que atrofiavam a cena teatral portuguesa com um inovador/brilhante “D. Quixote”, aplaudido em “n” países. Costumava dizer-se que quando um (actor(riz) (de)clamava "Fiquei cego! Não vejo nada!" só dava vontade de replicar "Ó filho(a) tira a mão dos olhos".
Podem, portanto, imaginar a minha felicidade pela atribuição do Nobel da Literatura a Harold Pinter por ter "recuperado para o teatro os seus elementos básicos: um espaço fechado e um diálogo imprevisível, onde as pessoas estão à mercê umas das outras". Estamos a falar de um “Figo”, ou melhor, no caso dele, britânico, de um “Lampard”.
É um “menino” (75 anos) que, além de ser um criador multifacetado, diz coisas como estas: “The laws are brutal and cynical. None of them has to do with democratic aspirations. All of them have to do with intensification and consolidation of state power. Unless we face that reality fairly and squarely, this free country is in grave danger of being strangled to death.” – in "Murder is the most brutal form of censorship", 1989. Na temporada 2001/2002, os Artistas Unidos (Jorge Silva Melo, um “must”) levaram à cena 8 peças de Pinter. Pois, mas já passou. Mesmo que sejam os mesmos intervenientes nunca será igual. Se é diferente todos os dias que está em cena…Este é também um dos fascínios do teatro.
Depois há ainda o texto, o cenário, a luz, o som, os desempenhos/actuações e o conjunto disto tudo, ali, à nossa frente, onde um passo em falso pode ser a morte do artista. Atribuir o Nobel a Harold Pinter foi dar o seu a seu dono.
zemari@
4 comentários:
O Harold Pinter diz efectivamente coisas muito interessantes. Justiça lhe seja feita também, pela homenagem neste post!
Não nos esqueçamos de Dario Fo, prémio Nobel anterior a Saramago.
Viva o Teatro que, curiosamente, começa cada vez mais a ser reconhecido como Literatura!
Fernando Rebelo
(P.s.ó André, desculpa lá mas não tenho aquelas coisas do blogger name e as outras merdas...)
Bravo ! Foi feita justiça ! Parabéns para o Harold Pinter e coragem para superar a grave doença que o atormenta.
Bravo também para o Zé Maria que nos presenteou com este belo texto, cheio de informação vivencial e paixão.
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