O "estatuto do aluno", especialmente no que toca ao fim das penalizações por faltas injustificadas, é a prova que faltava, se era preciso prova alguma mais, de que os "responsáveis" pelas políticas educativas em Portugal, ou perderam o juízo, ou estão completamente desligados da realidade do que é uma escola neste país, ou se preocupam apenas com as estatísticas do insucesso escolar e nada com os resultados das políticas que aplicam na formação das próximas gerações deste pobre país. Ou ainda, o que é mais assustador, mas que considero plausível, não acreditam sequer no modelo de Escola Pública.
O meu ilustre colega de blogue Armando Rocheteau, nas muitas conversas que já tivemos sobre estes temas, tem razão quando diz que o poder dos professores era muitas vezes usado por pequenos ditadores, que, todos o sabemos, destruiram a vida de muitos alunos, especialmente dos menos preparados culturalmente para a sobrevivência na selva. E tem também razão quando diz que o ensino obrigatório tem, necessariamente, de ser para todos. Mas há um limite que se ultrapassou, um limite de bom senso, inteligência, e resultado. Começou algures nos anos 90, com os disparates pedagógicos das "areas escolas" e afins, ao mesmo tempo que se diminuia a exigência dos programas das disciplinas nucleares. E foi prosseguindo até atingir o climax nesta Ministra da Educação, com a total descredibilização da autoridade prática e mesmo moral dos professores, cujo culminar é a criminosa rábula dos colocados com cancro e outras doenças incapacitantes, tratados como crápulas, vigaristas, usurpadores dos recursos do Estado em seu proveito próprio.
É que o problema principal já não é, sequer, as condições de trabalho dos professores. Neste momento, a questão é mesmo os alunos. Não se consegue entender que interesse futuro terão em sairem da escola aprendendo nada ou quase nada. A escola democrática, inclusiva, e a própria essência do conceito de ensino obrigatório, entende-se facilmente, são subvertidas nesta lógica de facilitismo. Há muitos anos que não era tão compensador para o futuro de uma criança colocá-la numa escola privada. Se pensarmos que, em breve, as universidades passarão a escolher os alunos que admitem, percebe-se o triste destino das próximas gerações daqueles que, por razões económicas ou culturais, definharão no caixote do lixo da escola pública. Nessa altura será tarde para pedir responsabilidades a esta ministra ou a outros responsáveis. As virtudes da democracia representativa fá-los-ão justificar-se com a "livre escolha dos eleitores", e os seus filhos e netos aprenderão felizes no colégio, esperando o bilhete garantido para a melhor faculdade e o seu futuro brilhante, onde cumprirão a especial e necessária função de se perpetuarem como casta dominante.