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domingo, 23 de março de 2008

Ser professor é difícil (4)

A escola do antigamente

"Os anjinhos dos bons velhos tempos

Fiquei chocadíssimo ao aperceber-me de que, afinal, só a minha turma do liceu é que gozava perdidamente com os professores.

Recordo-me do J. e do S. a emitirem um programa radiofónico lá da última fila nas aulas daquele professor de História surdo; da professora de Português estrábica a quem nunca respondia o aluno que interrogava, mas outro sentado no lado oposto da sala; ou da turma toda a uivar quando a professora de Inglês que usava mini-saia se esticava toda, de costas para nós, para escrever no alto do quadro. E fico-me por aqui.

Castigue-se quem deve ser castigado, mas poupem-me às prédicas sobre o respeito dos alunos pelos professores nas escolas do antigamente
(...)
"
João Pinto e Castro
. ...bl-g- -x-st

"Caderneta escolar

Frequentei uma escola exigente. No entanto qualquer professor que revelasse não ter pulso, passava por situações complicadas, que não se limitavam a “imitar as palavras da professora, berrar com os colegas e levantarem-se sem autorização”, nas palavras do famoso dr. Charrua, que agora surge encaixado no gabinete de apoio ao aluno da escola Carolina Michaelis.

Havia no entanto uma diferença essencial: os professores “sem pulso” não se punham a medir forças com os alunos. Chamavam o auxiliar administrativo — ou o responsável da escola.
(...)
"
Miguel Abrantes. Câmara Corporativa

"No meu tempo

Há dias recebi um convite dos colegas para participar no 30º aniversário do fim do nosso ano de liceu. Não poderei participar, mas sei quem lá encontraria: senhores e senhoras de meia idade, pais e mães de família, empresários, quadros superiores, médicos, advogados, arquitectos, certamente também alguns "falhados".
Frequentei o liceu numa cidade de província, uma escola pública. A escola, sem ser de elite, tinha uma boa reputação. O director era um padre jesuíta, muito respeitado dentro e fora da escola e, por nós, também temido. A maioria dos outros professores também não tinha problemas maiores de disciplina.
Mas havia as aulas de educação visual, em que sempre jogámos às cartas, o que a professora fingiu não ver. Tínhamos 14 ou 15 anos. As aulas de latim, dadas pelo Dr. S., de quem me lembro hoje com respeito e carinho: era um senhor perto da idade de reforma, tão delicado que quando nós cruzámo-nos com ele na rua, levantava mesmo para nós adolescentes o chapeu, cumprimento já na altura antiquado. Isso não impediu que, quando nos virava as costas na aula, lhe atirámos com bolinhas de papel.
E havia a professora de inglês, Mrs. T., que recentemente tinha enviuvado, o que poderá ter contribuído pela sua incapacidade de impor disciplina nas suas aulas. Lembro-me de uma em especial. Alguém tinha trazido uma bola de futebol para a sala, e a professora teve a triste ideia de tentar confiscá-la. Durante minutos, a bola voava de um para outro, para o gáudio de todos. Continuava a voar ainda algum tempo, mesmo depois de ela ter desistido e ter voltado a debitar a matéria, que nós ignorámos como ela então ignorava a bola.

O que distingue o nosso caso de 1974 do da Carolina Michaëlis é que não tínhamos como gravar e colocar o espectáculo no Youtube.
"
Lutz Brückelmann. quase em português

Frequentei o ensino público antes do 25 de Abril. Sou professor. Tenho filhos. A escola hoje é muito menos violenta, do que a do meu tempo de aluno, e responde a desafios maiores. Bendita democracia

Ser professor é difícil (3)

"(...)
Sempre houve indisciplina na escola e nas salas de aula. O tempo que as pessoas fantasiam nas suas cabeças desapareceu há umas décadas. Aceito, no entanto, que hoje seja mais grave. Algumas de muitas razões: famílias demissionárias ou ausentes (as mulheres hoje trabalham e espero que não as queiram de volta para casa), formas de socialização entre adolescentes que os pais e os professores desconhecem e com os quais não sabem lidar, concentração de miúdos problemáticos nas mesmas escolas e turmas, pais e alunos que não respeitam a escola porque não a vêem como uma forma de ascensão social, depreciação da imagem do professor, confusão entre autoritarismo e autoridade (sem a qual a educação - aceitação de que a pessoa que está à nossa frente tem qualquer coisa para nos ensinar - é impossível), uma escola cada vez mais distante da realidade quotidiana vivida pelos adolescentes, a hiper-mediatização de cada episódio que deixa de poder ser gerido dentro da sala de aula e passa a ser debatido por todos (para esta última contribuo eu próprio).
Alguns destes factores são inultrapassáveis. São assim mesmo. Outros não o são e vale a pena discuti-los. Mas há debates que não vejo muito bem para onde nos podem levar. O que propõem exactamente, para resolver os problemas de disciplina, alguns que aqui deixaram comentários?
1. Que o castigo físico volte a ser reintroduzido como forma de ensino?
2. Que os alunos complicados sejam proibidos de ir à escola e se acabe com o ensino obrigatório?
3. Que se acabe com a Internet e com a televisão?
4. Que se esterilizem os pais que não saibam educar os seus filhos?
(...)
A importância de preparar os professores para lidar com a indisciplina (que passa por saber gerir uma crise, mas também por saber dar aulas) e com adolescentes pareceu-me evidente. Defender a dignidade dos professores é defender os professores, mas não só. É defender a sua qualificação. E quem trabalha com adolescentes em 2008 tem de saber trabalhar com os adolescentes que existem em 2008, com todas as diferenças que há entre eles, e não com o adolescente que devia existir ou que um dia existiu (se é que existiu). Haverá sempre excelentes professores, professores medianos, professores maus e professores péssimos. Haverá sempre excelentes alunos, alunos medianos, alunos maus e alunos péssimos. A formação dos professores, a valorização da profissão para que os mais capazes queiram leccionar e a adaptação da escola à realidade que tem pela frente é o que podemos fazer. O resto depende, como em todas as profissões, da qualidade de cada um. Mas fazer de cada professor uma vítima aos olhos da sociedade, dos pais e dos adolescente só piora o problema. Uma coisa não está ao nosso alcance: escolher os adolescentes que podem estudar. E ainda menos os pais deles. Por isso é que faz sentido falar dos professores e, claro, do funcionamento da escola.
De resto, os que não querem resolver os problemas podem continuar a falar do seu tempo. Já foi. Era outro. E sobre o outro tempo podemos também falar. Há muito para dizer e está longe de ser consensual. Mas não serve de muito para aquilo que está em debate. Esse tempo passou. Passa sempre. A escola que temos tem estes adolescentes que têm estes pais. Acabada a indignação, vamos discutir o que interessa?
PS1: Uma coisa que não suporto ouvir: o meu papel é ensinar a matéria, não é educar, gerir conflitos ou resolver este tipo de problemas. E não suporto por uma razão simples: é falso. Mesmo que fosse justo (e não é), não aguentava um segundo de contacto com a realidade. E denuncia uma relação burocrática com a docência que é intolerável.
"
Daniel Oliveira. Arrastão

sexta-feira, 21 de março de 2008

Ser professor é difícil (2)

Inimigo de Classe



Ainda a propósito de um 9º ano.

A peça filmada e encenada por Peter Stein passou, faz uns anos, na RTP. Diogo Dória, salvo erro, numa adaptação de João Canijo, esteve soberbo numa de bad boy.

Ser professor é difícil

A propósito de um vídeo que por aí anda (Atlântico, A Barbearia do Senhor Luís, Blasfémias, Expresso, Do Portugal Profundo, O país do Burro, Spectrum).

Do Causa Nossa ao We Have Kaos In The Garden a blogosfera indigna-se em peso.

"Ser professor é difícil. Recebem-se na sala de aulas todos as falhas familiares, todas as falhas sociais, todas as falhas do sistema. E no fim, o mais provável é ser-se maltratado por quem falha em casa, por quem falha na sociedade, por quem falha no sistema. Mas é esta a profissão que se escolheu e todas as profissões têm partes difíceis. E nesta profissão, em que se trabalha numa escola em que todos entram e têm de entrar, não se escolhem os alunos. Há, haverá sempre, casos quase impossíveis. São esses os ossos do ofício. Já havia quando eu era aluno. Para uns professores era dramático, para outros era um problema que tentavam resolver com muito talento e esforço. É difícil, mas simples: a disciplina e a autoridade nunca estão garantidos, conquistam-se. Até com os filhos."
Daniel Oliveira. Arrastão

Tiro o meu chapéu a Daniel Oliveira. Vi, muito tempo atrás, uma reportagem esclarecedora na RTP. Lembram-se dela? Há quem tenha memória curta.

Via Ana Crisina encontrei a solução.

terça-feira, 11 de março de 2008

Da política (5)

"Sim, e agora?

Rui Tavares mistura várias coisas no mesmo saco no seu artigo de hoje no Público, entre elas: a) A avaliação dos méritos genéricos da escola pública; b) A avaliação da pedagogia dominante no nosso ensino; c) A avaliação do modelo de gestão escolar hoje vigente.

No fim, acusa a Ministra e o Governo de terem baralhado tudo: “Um discurso que nos diz que todo o ensino público está mal não é nem nunca será reformista.” Peço desculpa, mas a confusão é dele.

Deixo, porém, à Ministra o encargo de se defender a si mesma, e passo a explicar a minha opinião sobre o tema. Sinteticamente, porque tem que ser:

1. Avalio muito positivamente o desempenho global do ensino público após o 25 de Abril de 1974. Transformou o analfabetismo num fenómeno residual. Alargou drasticamente os anos de ensino obrigatório. Chegou a todo o país. Permitiu a milhões de jovens concluírem os seus estudos secundários e abriu as portas da universidade a centenas de milhares deles.

2. Repudio a retórica sobre o eduquês como uma catilinária reaccionária e ignorante que pretende fazer-nos recuar aos tempos anteriores a Coménio (o fundador da pedagogia moderna que os pobres críticos confundem com Rousseau).

3. Acredito que a escola pública tem condições para superar a sua actual crise de forma a continuar a assegurar a educação universal e gratuita primária e secundária a todos os que a ela queiram recorre.

4. Não tenho o menor desejo de polemizar sobre se as coisas teriam sido melhores ou piores se outro caminho tivesse sido seguido. Fizemos o que fizemos, e fizemo-lo genericamente bem.

5. Interessa-me exclusivamente discutir os problemas da escola pública de hoje e encontrar para eles as melhores soluções.

6. Não acredito que haja respostas definitivas para os problemas, válidas independentemente das épocas e das circunstâncias. Julgo, por isso, que certos arranjos que provaram ser adequados ou ao menos neutros no passado se encontram hoje obsoletos.

7. Tal como vejo as coisas, a escola pública tem hoje dois grandes desafios pela frente: a) o desafio da adaptação do conteúdo do ensino às necessidades da sociedade contemporânea; b) o desafio da gestão criteriosa dos recursos ao seu dispor.

8. O primeiro desafio é o mais difícil e exigente. Não falarei dele agora, excepto para dizer que as potencialidades da escola pública a esse nível só poderão ser libertadas se se resolver primeiro o segundo, dado que, sem isso, não teremos recursos para o fazer.

9. A escola pública é hoje um local de esbanjamento das capacidades dos professores e dos alunos. O sistema por ele responsável existe há muito tempo, mas só na última década se converteu num travão essencial ao progresso.

10. As escolas públicas têm sido geridas, perante a complacência do governo central, por uma aliança perversa entre a máquina burocrática da 5 de Outubro e os sindicatos dos professores.

11. Como tem sido observado por múltiplos comentadores, os professores presentemente não são avaliados nem prestam contas a ninguém. Esta situação insólita, sem par, ao que julgo, em qualquer país desenvolvido, tem que terminar. Este é que é o problema.

12. Tal como a pressão sobre o Ministério da Saúde atingiu o seu clímax quando se encontrava prestes a entrar em vigor o controlo dos horários dos médicos e a abertura de farmácias nos hospitais, os professores mobilizaram-se em massa para bloquearem o Ministério da Educação quando se aproxima o momento decisivo em que eles começarão a ser avaliados e em que entrará em vigor o novo regime de gestão das escolas.

13. Nestas condições, é ingénua a reivindicação do diálogo da Ministra com os professores, quando é claro que os sindicatos recusam qualquer forma de avaliação e temem perder o controlo sobre as gestão das escolas. Alguma vez propuseram outra coisa que não fosse a pura e simples manutenção do statu quo?

14. Soa-me estranha aos ouvidos a afirmação de que a reforma não pode ser feita contra os professores. Trata-se de uma constatação ou de uma ameaça? Porque, se, como parece, é uma ameaça, a resposta é muito simples: os professores que boicotarem a avaliação não serão promovidos e poderão eventualmente ser alvo de processos disciplinares.

15. Pretender o contrário é aceitar que a política educativa deve ser confiada ao soviete dos professores. Digo soviete para não dizer corporação, visto que esta palavra parece ferir muito certos ouvidos.

16. Sustento que a manifestação de sábado passado foi uma vitória de Pirro, pela simples razão de que nem o PCP, nem os sindicatos, nem os restantes partidos da oposição sabem o que fazer com ela? Semana de luto? Que tal semana da fome? Greve geral da função pública? E depois? É eleições antecipadas que pretendem? Para quê? Para serem derrotados nas urnas?

17. As mesmas pessoas que há semanas declaravam defunto o movimento sindical encontram-lhe agora insuspeitadas virtudes. Pois a verdade é que os sindicatos continuam, como sempre, amarrados à política suicida do PCP.

18. Já outros fizeram notar que o Governo continua a não depender de ninguém nesta matéria, desde que não se esqueça que o ensino existe para educar os alunos, não para empregar os professores, e desde que focalize as suas atenções no tema da gestão escolar, que é o nó da luta pelo poder que estamos a presenciar.

19. De modo que me parece que a pergunta do Rui - “Contentes, agora?” - deverá antes ser endereçada aos sindicatos e aos professores que com eles alinharam.
"

João Pinto e Castro, 10 Março 2008

Com a devida vénia ao Cinco Dias

segunda-feira, 10 de março de 2008

Uma estranha "lógica democrática" (3)


A.Cabral no Bitoque

Uma estranha "lógica democrática" (2)

Outra coisa que o nosso PM disse, na mesma entrevista, foi algo deste género: "existem muitos problemas nas escolas que tem de ser resolvidos, mesmo que isso custe aos professores". Depreende-se daqui que Sócrates considera os professores parte do problema e não da solução nas escolas.

Uma estranha "lógica democrática" (1)

Acossado pela manifestação dos professores, o nosso Primeiro-Ministro José Sócrates saiu-se hoje com esta maravilha:

«Os portugueses tem de entender que a alternativa às reformas é ficar tudo como estava»

Ora, como é evidente, existem muitas outras alternativas a "ficar tudo como estava" diferentes das "reformas". Este newspeak socrático tem por objectivo fazer-nos crer na inevitabilidade das políticas, enfim, como se escreveu já por aqui, na ideia de que as "reformas" são coisas feitas por técnicos, sem qualquer objectivo político ou motivação ideológica. Mais, a sua suposta "necessidade" inibe qualquer escrutínio aos seus próprios resultados; não se pode avaliar as linhas orientadoras de uma política, ou sequer a habilidade ou inabilidade de um político, quando tudo o que se faz é apresentado como absolutamente "necessário".
Chegou o momento de dizer: senhor PM, "reformas" há muitas. As suas "reformas" não são nenhum santo graal, e nada nelas nos diz a priori que avançam no sentido correcto. Como qualquer política está sujeita ao nosso escrutínio.

sexta-feira, 7 de março de 2008

Da política (3)

"Quanto pior, melhor

Caro Francisco, apesar de não saber o que é a “direita do comentário”, vou acusar o toque.
Quer queiras, quer não, a escola pública, com todos os seus problemas foi um dos, senão o maior, caso de sucesso da democracia portuguesa. Foi, provavelmente, o maior fenómeno de coesão social da nossa comunidade.
Não concordo com o modelo global do sistema mas não me custa admitir estes factos.
Não sei onde tu e o Vasco Pulido Valente viram essa catástrofe das últimas décadas (presumo que pensas que antes “dessas” décadas as coisas estavam melhores...) cheias de deslegitimação dos professores, de cultura do bom selvagem, e dessa coisa a que chamas “ideia torpe de democraticidade”.
Devolvo-te o comentário: este rapaz tem 3 filhos, dois numa escola privada e um na pública. O da pública (com 18 anos) já conta um lamentável “chumbo”, recebo periodicamente relatórios sobre a sua performance e ausências das aulas e para te ser franco não encontro esse estado miserável de facilitismo que tu vês. Bem sei que o Vasco Pulido Valente e outros como ele lidam, como eu, diariamente com problemas escolares mas devemos ter, com certeza, experiencias diferentes.
A questão das faltas é aliás um argumento que francamente me espanta. Por um lado vejo criticas ao facilitismo das escolas, por outro vejo as mesmas pessoas berrarem a favor do “chumbo” por faltas. Mas existirá coisa mais fácil que chumbar um aluno por faltas sem sequer querer saber o que se passa? O que será melhor: deixar a escola que conhece a situação decidir ou permitir que uma lei cega decida uma carreira académica? Isso não é educar, é facilitar a tarefa a quem está numa escola como quem está num qualquer serviço que não lida com a construção do futuro do maior activo de uma comunidade.
Como em quase todos os sectores da sociedade portuguesa grassa, isso sim, uma falta de cultura do mérito, de ausência de avaliação, de desresponsabilização, de amiguismo e de facilitismo. Estes defeitos não são exclusivos, pelo contrário, do nosso sistema de educação. Isto acontece em todos os sectores da nossa comunidade e, é preciso dizê-lo, também na iniciativa privada.
Sustentar que não se deve avaliar os professores porque eles, supostamente, não avaliam os alunos é pior que uma mentira, é um contributo para deixar tudo como está. Pior, é um argumento que serve para destruir o que de bom há no nosso sistema escolar. A verdade é que quem avalia (e é isso que os professores fazem todos os dias) não é avaliado e isso sim é causador das maiores iniquidades.
"
Pedro Marques Lopes.( Em reposta a post de Francisco Mendes da Silva). 31 Da Armada.
(Com a devida vénia ao 31 Da Armada)

Da política (2)

"Os professores

São muitos e até têm razões de queixa. Mas o grande número ainda não confere poder de veto político e os motivos para protesto não lhes dão razão na sua oposição global à reforma da escola pública. Como sucede com a generalidade das lutas de carácter sectorial, centradas na defesa de interesses profissionais, a sua capacidade para vingar na opinião pública e para vergar o poder político é reduzida.

Há quem tenha a ilusão de que milhares de professores na rua podem arrastar a demissão da ministra da Educação e paralisar as reformas em curso. Não se dão conta, porém, de duas coisas elementares: primeiro, Maria de Lurdes Rodrigues já deu sobejas provas de que não se deixa impressionar pela contestação; segundo, Sócrates nunca poderia ceder numa reforma essencial para a modernização do país, por causa do protesto profissional. Ainda que este conte com o apoio dos habituais (e dos novos...) "partidos de protesto", a instrumentalização partidária de lutas profissionais não ajuda nada ao seu êxito, antes lhes retira legitimidade. De resto, para além de justa em si mesma, a reforma da educação até pode render mais votos na população em geral do que os que faz perder entre os professores...

A reforma do ensino público é essencial à sustentabilidade da escola pública, à melhoria do seu desempenho e à correcção dos vergonhosos indicadores nacionais no que respeita ao insucesso escolar e ao défice de qualidade do ensino. Tínhamos escolas e professores a mais e qualidade e produtividade a menos. A escola funcionava a meio tempo para a generalidade dos alunos e nem sequer proporcionava aulas de substituição no caso de falta dos professores. Uma insólita carreira profissional "plana" fazia prevalecer a antiguidade, e não o mérito, na progressão profissional. Faltava tanto uma genuína avaliação de desempenho como mecanismos elementares de selecção qualitativa dos professores. Um sistema de autogestão no governo das escolas gerava "endogenia administrativa", défice de autoridade e falta de responsabilidade perante o exterior. Em consequência da sua degradação, a fuga da escola pública acentuava-se. Era preciso mudar quase tudo, portanto.

Os professores bem podem queixar-se da avalancha que lhes caiu em cima desde há três anos e que alterou profundamente a sua condição profissional. Mais tempo na escola, aulas de substituição e maior controlo da assiduidade, mais dificuldade de progressão na carreira, mais exigências de avaliação dos alunos e de informação aos pais, um exigente regime de avaliação, um novo sistema de governo escolar que lhes retira o monopólio na gestão escolar. Sentem-se vítimas de uma revolução que lhes cai em catadupa sobre a cabeça, sem tréguas, ainda por cima acompanhada do congelamento de progressões na função pública, que condena muitos professores à baixa remuneração de entrada na actividade.

Enquanto o Governo dá mostras de querer corrigir em quatro anos os erros e omissões de 30 anos, os professores adoptaram em geral uma posição radicalmente conservadora e reactiva. Mal habituados a levar sempre a melhor contra a 5 de Outubro, arrancaram logo em 2005 com uma greve a exames. Perderam, mas não se conformaram, tendo-se oposto irresponsavelmente a todas as mudanças, desde a redução das escolas sem alunos até ao concurso plurianual de professores, desde o novo estatuto da carreira à reforma da gestão escolar. O radicalismo sindical da Fenprof, instrumento sindical do PCP, não deixou margem para nenhum acordo nem nenhuma ponte.

Costuma dizer-se que as reformas devem ser feitas com os profissionais dos sectores em causa. A tese não é em geral verdadeira, verificando-se quase sempre a oposição dos interesses profissionais afectados. Na maior parte dos casos, os profissionais são mais forças de conservação e de reacção do que de mudança. No caso da reforma do ensino público, os professores mostraram desde o princípio que ela não podia contar com a sua aceitação, muito menos com a sua colaboração. Por culpa própria, forçaram uma reforma contra eles, já que partiram em guerra contra ela, sem concessões nem compromissos.

É sem dúvida desejável que as reformas sejam feitas, tanto quanto possível, em diálogo com os grupos profissionais afectados, procurando captar o apoio ou pelo menos a não hostilidade dos sectores moderados da profissão. Mas não pode haver ilusões quanto a realizar reformas sem ter de enfrentar e de vencer muitas resistências. Não há reformas absolutamente consensuais, pois quase todas afectam interesses de grupo. Quem não queira ou não possa vencer tais resistências não deve encetar nenhuma reforma de fundo.

Se se pode ter de fazer uma reforma contra a hostilidade dos profissionais, já é ilusório pensar que se pode levar de vencida essa resistência sem ganhar o apoio daqueles que delas são beneficiários, ou seja, os cidadãos e os contribuintes, em geral, que são os destinatários dos serviços públicos e suportam os seus custos. Estará votada ao fracasso toda a reforma que não estabeleça como ponto inegociável que os serviços públicos (escolas, hospitais, tribunais, etc.) não pertencem nem estão ao serviço dos respectivos grupos profissionais, mas sim da colectividade e dos seus utentes e beneficiários. De facto, por mais legítima que seja a defesa de interesses profissionais dos professores (o que não está em causa), não existe nenhuma razão para crer, pelo contrário, que eles coincidem com os interesses das escolas e dos seus utentes, que cabe ao poder político prosseguir. Como bem disse há dias um comentador, "sem professores não há escola, mas a escola não é dos professores".

Em seu próprio benefício, os professores deviam tornar-se parte da solução e não parte do problema. Também no interesse da reforma, a ministra da Educação deve trabalhar para isolar os sectores radicais e conquistar pelo menos a compreensão dos sectores mais moderados. Mas, chegada a hora de optar, não pode sacrificar nem adiar a reforma do ensino público de que o país não pode prescindir.
"

Vital Moreira (Público, 3ª feira, 4 de Março de 2008)
(Com a devida vénia a a aba da causa)

Da política (1)

"LUTA SINDICAL OU LUTA POLÍTICO-PARTIDÁRIA?

Nunca o interesse político do PCP em controlar os sindicatos foi tão evidente como no caso da Frenprof, desde o início da "luta" dos professores que é evidente a gestão política de todo o processo, bastando acompanhar as posições políticas do PCP para prever a actuação seguinte da frente sindical.

Depois de pedir a demissão da ministra a Fenprof já decidiu só aceitar negociar com o primeiro-ministro o que permite uma maior capitalização dos ganhos políticos, o próximo passo do PCP vai ser pedir a demissão de Sócrates.

Compreende-se que muitos professores se "encostem" às estruturas sindicais controladas pelo PCP por acharem que têm a garantia de que estas são mais combativas, mas desta vez arriscam-se a que as suas exigências acabem num beco sem saída. É evidente que se o diálogo interessa aos professores já não interessa ao PCP cujo objectivo é o confronto político com o governo, na esperança de o desgastar. Se é evidente que a ministra da Educação não é nenhum modelo de diálogo a questão que se coloca é saber se com a Fenprof há espaço para diálogo. Duvido, desde o primeiro momento que os sindicalistas do PCP obedeciam às suas orientações partidárias e visam o confronto político.

São os professores e as escolas que perdem, nenhum governo poderá ceder perante esta lógica dos sindicatos, as manifestações não se sobreporão à legitimidade política do poder e a opinião pública está longe de apoiar a "causa" dos professores. O conflito chegou a um ponto em que ou perde Sócrates ou perde o PCP e a Fenprof, no meio perdem os professores.

Alguns professores aperceberam-se deste resultado provável mas as suas manifestações espontâneas não foram suficientes, o PCP rapidamente abafou o fenómeno. Quem hoje viu Jerónimo de Sousa a dirige-se aos professores como se fosse Lenine a discursar num dia de Outubro percebeu que a defesa legítima dos direitos dos professores já foi absorvida pela estratégia política do PCP.
"
O Jumento.
(Com a devida vénia a O Jumento)

sábado, 1 de março de 2008

"A direita já não é o que era"

"Orfandade
Há coisas para as quais ainda não estou preparado. Provavelmente, o mal está na falta de leitura. Ando a ler pouco ultimamente, o que deve diminuir a minha capacidade de entendimento. Passo a explicar as minhas perplexidades. Tenho alguns amigos de direita ou de centro direita, para o caso tanto faz. O que é natural. E o que é para mim um «amigo de direita»? Primeiro é um amigo, o que é mais importante que ser de direita ou de esquerda. Depois, é um amigo que, nos últimos vinte anos, sem hesitações, votou sempre no PSD (nas legislativas, nas autárquicas ou nas presidenciais) ou que, sem desfalecimento, nem mal estar difuso, defendeu com unhas e dentes, a maioria absoluta de Cavaco Silva durante 8 anos (mesmo quando Cavaco dizia que não lia jornais ou pedia que o deixassem trabalhar). Ora, acontece que estes meus amigos, pelo menos os que contactei nos últimos dias, dizem-me que vão estar presentes nas manifestações de Março. Perguntei, incrédulo: - mesmo à do PCP? A essa não, é muito partidária. – Responderam-me. – Só vamos às outras, à dos professores e à da Função Pública. Eles – os meus amigos – que, ainda há pouco tempo, me diziam que os sindicatos eram apenas uma «correia de transmissão» do PCP. Só posso tirar uma conclusão: estes meus amigos estão órfãos. E o transtorno «psicológico» é tão grave que uns se viram para Salazar, outros para a «revolução». A direita já não é o que era. Perdeu a identidade.
"
TOMAS VASQUES

segunda-feira, 25 de fevereiro de 2008

Manifestar-se faz o professor (2)

Ainda sobre a polémica dos SMS: este sábado, milhares de professores manifestaram-se sem aviso prévio, em convocatórias através de blogues e, sobretudo, SMS. Desta vez já custou mais ao Sócrates considerar que "não eram professores mas militantes de outros partidos". O que é curioso nestes processos de intenções contra quem se manifesta, é que quando são os sindicatos a organizar, acusa-se-lhes, e muitas vezes com razão, de estarem ao serviço de agendas partidárias. Mas quando se dispensa os sindicatos (de um modo que estes não deixam, inclusivé, de temer), então culpa-se a mão invisível que escreve os SMS. Como sempre, o que nunca é valorizado é a capacidade de cada um pensar pela sua cabeça, e livremente decidir se quer ou não aderir a esta ou aquela manifestação, convocada desta ou daquela forma.
Mas o que é incontestável, por muito que custe a alguns, é que estas manifestações que escapam ao controlo dos sindicatos são ainda mais perigosas para o Governo. Elas revelam que o mal-estar e o descontentamento dos professores vai muito para além de lógicas sindicais e partidárias, e é um sintoma do desastre da sua política educativa, que conseguiu alienar das ditas "reformas" os agentes mais importantes na Educação. Se algum ministro supõe que consegue fazer uma "reforma" com sucesso (no sentido em que o objectivo da reforma seja melhorar a Educação, o que é muito discutível) colocando contra si a quase unanimidade dos professores, arrasando com a sua motivação, minando a sua autoridade, então temos mesmo de dar crédito às alegações de certos opinion makers: este Governo vive fechado numa redoma de tecnocratas, que independendentemente dos objectivos ideológicos que persigam, nem sequer são capazes de entender a realidade.

quarta-feira, 20 de fevereiro de 2008

Manifestar-se faz o professor


Daqui podemos pelo menos deduzir que: o "professor" que o Tomás Vasques imagina (e que o nosso Armando Rocheteau cauciona) não pensa, nem quer saber quem é, o remetente. Ele apenas se quer manifestar. O "professor" do Tomás e do Armando que quer, apenas e só, "manifestar-se", tal incauto desprevenido, assim como desta vez foi apanhado nas malditas correntes de SMS da CGTP, do PC, do BE, do PCTP, do POUS, ou do que mais se dedique a enviar SMS por razão alguma, pode, um destes dias, ser capturado pelas tramas terríveis dos SMS da extrema-direita: do PNR, da Juve Leo, do Grupo 1143. Pois este "professor", não sabendo bem porquê, sabe que se quer "manifestar". "Manifestar" é algo que faz o "professor". De algum modo constitui-se como "professor", ou seja, um ente contaminado pela espúria e pecaminosa presença do "aluno": um "contestatário"; um "manifestante". É a partir desta sabedoria que, avisadamente, a Ministra, o Tomás e o Armando nos previnem para a ilusão das "manifestações" de professores: umas atitudes vâs, tristes e manipuladas de gente convocada pelo primeiro SMS que lhes surja no telemóvel, a seguir ao que diz "maria, keres vir a festa d ze, rsponde p msg". Gente que não faz a mais pálida ideia do que se passa nos seus locais de trabalho. Aliás, como todos sabemos, as pessoas que trabalham não tem opiniões ponderadas sobre o que se passa nos seus locais de trabalho (porque estão enviesadas pelos seus interesses pessoais), nem entendem bem quais são os seus interesses (porque não percebem o que se passa nos seus locais de trabalho). É por isso que existem os especialistas, e a Democracia deve viver com os especialistas, dos especialistas, e para os especialistas. E mesmo que a realidade desminta os especialistas, o erro não é deles (pois são seres que analisam racionalmente a realidade), mas daqueles que, infelizmente, agem sobre ela, e assim estragam todos os modelos matematicamente estudados. E ainda quer esta gente pôr-se a protestar e a fazer "manifestações" convocadas por SMS... Um dia destes ainda os veremos a querer pensar o que só deve ser pensado pelos especialistas, e esse dia será o princípio da barbárie anti-democrática.

sábado, 8 de dezembro de 2007

domingo, 25 de novembro de 2007