A colectânea do filósofo e pensador desvenda os bastidores da génese de um dos gurus da Ultra-Esquerda mundial. É um verdadeiro acontecimento e um manual para a acção implacável dos que não se querem deixar agrilhoar por falsas questões e aldrabões de feira...
Aí está o que mais importa: a agitação de ideias, a crítica dos embustes e falsificações que do leninismo ao mao-spontex, de Altusser aos solavancos da Perestroika, e seus produtos derivados e incorporados, contribuiram para o preocupante impasse político actual, à escala universal.Tudo isso está analisado no grande pavé de Lefort, a assinalar os seus 80 anos de vida, que se arrisca a tornar-se num dos grandes momentos políticos do ano. Como o romance autobiográfico de Thomas Pynchon o há-de ser. Ou o processo teórico da candidatura de Obama Barack o será certamente pela novidade e rigor.
Mais de mil páginas de textos avulsos de Lefort, o companheiro e émulo crítico de Castoriadis e Morin, Manent e Thibaud, para ler e matutar. "O poder provém da divisão social e nisso se enreda", frisa o demiurgo pensador de Maio 68 que, dez anos antes, tinha rompido com os colegas de "Socialisme ou Barbarie", porque a ruptura com os conceitos de direcção, de revolução iria implicar a crítica substancial do legado de Marx. Anos depois(1976), os fundadores de "S.B." iriam reencontrar-se num projecto teórico capital em torno da revista Libre, que veio a gerar a terceira série da Esprit e a Le Débat. Esse folhetim exaltante é agora recuperado pela recolha dos textos de circunstância, o que é óptimo.
Justamente, sobre a grande e maravilhosa experiência do projecto político e teórico tecido em torno da constituição de "Socialisme ou Barbarie", Lefort traça e revela episódios de grande valor. As ligações de Castoriadis, logo ao início em 1949, com dissidentes de um partido trotskista americano, sobretudo Rya Stone, que já pensavam na via sobre a crítica à burocracia soviética e a resistência operária ao capitalismo industrial ; a entrada na revista dos luxemburguistas, dos bordiguistas e dos conselhistas, onde avultavam Lyotard e Mothé, Véga e Soueyris, que se tornaram famosos aos mais tarde são momentos detalhados de várias entrevistas agora reunidas no volume.
"O relativismo é a versão doce, pacífica, do nihilismo; e o nihilismo contém a virtualidade do terror. Quando nos interrogamos sobre o relativismo em democracia, é preciso pensar que, sob a exibição da tolerância ds pontos de vista, do "cada um com o seu direito, cada um com a sua verdade", projecta-se a ameaça do nada e do nada sai o nazismo - uma ameaça de auto-afirmação absoluta", aponta Lefort para denunciar os novos desafios do racionalismo contemporâneo.
Claude Lefort- Le temps présent.Écrits 1945-2005. Editorial Belin. Paris. Maio 2007
FAR