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quarta-feira, 8 de fevereiro de 2012
sexta-feira, 9 de dezembro de 2011
sexta-feira, 21 de outubro de 2011
Lições do 15 de Outubro (2- As vanguardas)
Eu tinha aqui escrito, no meu apelo à participação no 15 de Outubro, sobre como, muito naturalmente, e cito-me, esperava "irritar-me mais uma vez com os tiques da extrema-esquerda folclórica, exasperar-me com alguns que para lá irão competir na sua pequenina liga radical, e discutir o irrelevante, se o melhor é o consenso ou a maioria, que as doutrinas que seguimos nos obrigam a fazê-lo deste ou daquele modo" . É claro que há coisas que nunca mudam. Seja no passeio em frente à Assembleia da República, seja nas "reuniões", "assembleias populares", ou como as queiram chamar, seja, claro, por essa blogosfera fora, o que se discute agora é se "os anarquistas" estão a sabotar o movimento com as suas formas de acção "infantis", ou se, pelo contrário, é a organização do 15 de Outubro que se pretende tornar em "vanguarda" de um movimento que pretenderá excluir dele quem discorda deste ou daquele método e desta ou daquela resolução. Dando de barato o facto de ser muito discutível existir sequer "um movimento" sobre o qual se devam produzir estas asserções, a mim oferecem-se-me as seguintes três ideias sobre o caso: primeira, que ambos tem razão: é de facto difícil decidir se é mais infantil quem pretende "invadir" a Assembleia da República e desbaratar todo um capital político de uma grande manifestação para satisfação dos seus desejos de "justiça popular", ou para tirar satisfações da polícia por causa de acontecimentos passados; ou se quem acha que tal "movimento", a existir, pode ou deseja ser liderado por uma vanguarda de "dirigentes esclarecidos" doutrinados na pior versão do marxismo pronto-a-vestir, que não representam nada nem ninguém senão a habitual meia-dúzia. Segunda, que o facto de ambos terem razão quanto aos outros mas total incapacidade de entender as críticas que lhes são feitas é a grande tragédia deste tipo de acção política em Portugal, e não é de agora mas de há muitos anos. E terceira, e o mais importante, é que estas conversetas entre os habituais mais não fazem que debilitar o capital político desta manifestação de 15 de Outubro, e por uma razão muito simples, meus caros: é que a grande maioria dos que lá estavam não se reconhece nessas opções políticas, nesses métodos de acção, e muito menos nesses debates inconsequentes. Passe o facto de eu estar tão mandatado para falar em nome dos que lá estavam como os que convocaram aquela manifestação para se tornarem "a organização" (e muito menos "a direcção") deste "movimento", aquilo de que não tenho dúvidas nenhumas é que o que a grande maioria de todos nós deseja e espera é um programa mínimo, sublinho mínimo, de acção, apoiado nas reivindicações com que todos concordamos, anarquistas, trotsquistas, bloquistas, comunistas, desalinhados, mesmo aqueles que, mais ou menos ingenuamente, se declaram "apartidários". Só para dar um exemplo, que muitos seriam possíveis, algo que pareceu unir toda aquela gente foi a ideia de fazer acompanhar, desta vez, a Greve Geral de uma grande manifestação (algo que, estranhamente ou não, incomoda sobremaneira o PCP), já que nós conhecemos muito bem e estamos fartos daquela conversa de que "fazem greve para ficar em casa a descansar", porque muitos de nós estamos desempregados ou proibidos de facto de fazer greve, e porque, o mais importante, a experiência diz-nos que é preciso radicalizar a Greve Geral e fazer dela algo mais que a habitual válvula de escape do sistema. Pois que se parta para isso. Organize-se isso. Esclareçam-se as pessoas, discuta-se, façam-se "assembleias populares" para isso e não para decidir se a organização é vertical ou horizontal, ou se devemos adoptar "acções de base", "pequenos boicotes", ou antes um grande "movimento de massas". Note-se: possa eu ter ou não maior simpatia por estes ou aqueles, o que nem Lenine nem Bakunine achariam ajuizado seria perder um "movimento" devido ao excessivo radicalismo da sua "vanguarda".
sexta-feira, 14 de outubro de 2011
Às armas!
As nossas armas serão a demonstração das nossas opiniões, da nossa união, de que não esmorecemos, de que sabemos distinguir o essencial do acessório, de que conseguimos ver entre o nevoeiro mediático, de que estamos lúcidos e somos livres. Essa liberdade é a grande inimiga dos poderes de facto que ditam as ordens aos políticos-marionetas, e que literalmente nos vendem a ilusão da inevitabilidade. Não será uma manifestação perfeita; aliás, espero momentos de alguma desilusão, espero irritar-me mais uma vez com os tiques da extrema-esquerda folclórica, exasperar-me com alguns que para lá irão competir na sua pequenina liga radical, e discutir o irrelevante, se o melhor é o consenso ou a maioria, que as doutrinas que seguimos nos obrigam a fazê-lo deste ou daquele modo; e também com outros que para lá irão berrar contra "o governo", "o Passos Coelho", "o Sócrates", esperando outro e outro homem providencial, políticos mais "éticos", a cura do que é incurável. Mas porque é que a manifestação haveria de ser perfeita? Porque é que, agora, para nos manifestarmos exigimos tanto, reclamamos a perfeição de que não precisamos em tantas coisas da nossa vida em que a união é tão menos importante? Porque é que um não vai porque "não há programa definido", outro porque "são só esquerdistas", outro porque "vão para lá passear em vez de partir tudo", e ainda outro porque "depois de se queixarem vão votar nos do costume"? Que pureza, que virgindade, que inocência original deve ter uma manifestação, para que satisfaça quem tanto lhe exige? Isto quando os mesmos que assim objectam concordam na sua insatisfação, na sua revolta? Isso não deveria ser suficiente? Não é uma manifestação uma expressão da revolta popular?
Não será, obviamente, perfeita, mas esta manifestação será nossa, será dos que a fizerem, e por isso também terá algo de especial, livre de direcções centralizadoras e orientações tacticistas. Mas, acima de tudo, é uma manifestação essencial, urgente, porque é agora urgente como nunca demonstrar que não aceitamos tudo isto de ânimo leve, que não somos estúpidos e não gostamos que assim nos tomem, e que sabemos ver por dentro do nevoeiro. A nossa liberdade é a nossa arma. Às armas!
quinta-feira, 15 de setembro de 2011
Uma discussão exemplar...
Para que se entenda a tortuosa "argumentação" dos estalinistas (por exemplo, como Orwell era um bufo sem perdão, os processos de Moscovo uma necessária purga da conspiração nazi-trotskista, e como foram os anarquistas que chacinaram os comunistas em Espanha, apesar de, curiosamente, o resultado final ter sido o aniquilamento dos primeiros e a sobrevivência dos últimos). Aqui:
quinta-feira, 21 de abril de 2011
As quatro burlas
Em Portugal, um dos países do "mundo ocidental" em que os ricos menos contribuem para as despesas do Estado, um banco com nula vocação para depósitos ou empréstimos, e toda para avultados investimentos de alto risco efectuados por detentores de grandes fortunas à procura da multiplicação fácil do seu capital, chamado BPN, entrou em pré-falência devido ao crash de um sistema financeiro global assente num "esquema de Ponzi" (primeira burla). Alertado pelas sumidades do sistema bancário nacional, que nem por isso estavam menos envolvidas no esquema de Ponzi, para o risco de "contágio do sistema bancário", o governo investiu milhões e milhões de euros do erário público para salvar o referido banco, e assim também os tais investidores, que no final do processo não tiveram risco nenhum no investimento, já que os seus prejuízos foram assegurados pelo Estado, isto é, pelo conjunto dos cidadãos, "todos em geral e ninguém em particular" (segunda burla). Isto provoca a entrada do país em recessão técnica; aproveitando-se deste facto, agências de notação financeira directamente ligadas a grandes grupos de investimento vão aumentando o risco da dívida do país, o que origina que os empréstimos dos tais grandes grupos de investimento, a que estão directamente ligadas, sejam efectuados a juros cada vez mais altos, ou seja, com cada vez maior lucro (terceira burla). No final deste processo, incapaz de cumprir com os seus compromissos, Portugal "pede ajuda" ao FMI, "ajuda" essa que consiste em novos empréstimos, efectuados contra a garantia do "emagrecimento" das despesas do Estado, ou seja, de que o dinheiro dos contribuintes portugueses, em lugar de servir para as despesas do Estado português (como saúde, educação, transportes, infra-estruturas, investimento, etc.), sirva para pagar os empréstimos aos grandes investidores, e agora, ao FMI (quarta, e decisiva, burla). No passo, as mesmas sumidades do sistema bancário que foram salvas pelo Estado português, assim provocando a recessão e o empobrecimento dos cidadãos portugueses, declaram que os seus bancos "não ajudarão mais o Estado", esquecendo-se de mencionar que essa "ajuda" consistiu apenas em empréstimos a um juro relativamente mais baixo que o dos mercados internacionais, mas substancialmente mais alto que o do BCE, a quem esses bancos pedem emprestado. Isto apesar de a operação de resgate do BPN e do restante sistema bancário não ter sido efectuada através de nenhum empréstimo, mas apenas da injecção pura e simples de dinheiro, e da "nacionalização dos prejuízos". Perante isto, recusar pagar a dívida pública não é nenhum "calote"; pelo contrário, trata-se não só de uma medida essencial para a recuperação económica, e acima de tudo para a manutenção da soberania nacional, como também algo da mais elementar justiça.
quarta-feira, 16 de março de 2011
A revolução que os media não mostram
"Por incrível que possa parecer, uma verdadeira revolução democrática e anticapitalista ocorre na Islândia neste preciso momento e ninguém fala dela, nenhum meio de comunicação dá a informação, quase não se vislumbrará um vestígio no Google: numa palavra, completo escamoteamento. Contudo, a natureza dos acontecimentos em curso na Islândia é espantosa: um povo que corre com a direita do poder sitiando pacificamente o palácio presidencial, uma "esquerda" liberal de substituição igualmente dispensada de "responsabilidades" porque se propunha pôr em prática a mesma política que a direita, um referendo imposto pelo Povo para determinar se se devia reembolsar ou não os bancos capitalistas que, pela sua irresponsabilidade, mergulharam o país na crise, uma vitória de 93% que impôs o não reembolso dos bancos, uma nacionalização dos bancos e, cereja em cima do bolo deste processo a vários títulos "revolucionário": a eleição de uma assembleia constituinte a 27 de Novembro de 2010, incumbida de redigir as novas leis fundamentais que traduzirão doravante a cólera popular contra o capitalismo e as aspirações do povo por outra sociedade.
Quando retumba na Europa inteira a cólera dos povos sufocados pelo garrote capitalista, a actualidade desvenda-nos outro possível, uma história em andamento susceptível de quebrar muitas certezas e sobretudo de dar às lutas que inflamam a Europa uma perspectiva: a reconquista democrática e popular do poder, ao serviço da população."
"Desde Sábado, 27 de Novembro, a Islândia dispõe de uma Assembleia constituinte composta por 25 simples cidadãos eleitos pelos seus pares. É seu objectivo reescrever inteiramente a constituição de 1944, tirando nomeadamente as lições da crise financeira que, em 2008, atingiu em cheio o país. Desde esta crise, de que está longe de se recompor, a Islândia conheceu um certo número de mudanças espectaculares, a começar pela nacionalização dos três principais bancos, seguida pela demissão do governo de direita sob a pressão popular.
As eleições legislativas de 2009 levaram ao poder uma coligação de esquerda formada pela Aliança (agrupamento de partidos constituído por social-democratas, feministas e ex-comunistas) e pelo Movimento dos Verdes de esquerda. Foi uma estreia para a Islândia, bem como a nomeação de uma mulher, Johanna Sigurdardottir, para o lugar de Primeiro-Ministro."
quarta-feira, 9 de março de 2011
O 12 de Março, feito por todos
Este excelente tema do Chullage tem sido reaproveitado, como outros, para bandeira do movimento que se vai manifestar a 12 de Março. Outros tem produzido videos, temas musicais, organizado flashmobs, simplesmente divulgando e discutindo, no seus facebooks, blogues, em casa, preparando acções, tudo de forma espontânea e descentralizada, a partir de um simples manifesto inicial. À atenção das gentes dos partidos de esquerda: não é por acaso que tanta gente tem feito tanta coisa para esta manifestação. Sente-se aqui algo de novo, e há um perfume de genuína revolta popular no ar. Aqueles que tentarem cavalgar isto, serão desmascarados como os saudosistas das vanguardas que são. Os que genuinamente se manifestam não lhes perdoarão. O tempo agora é de ir para a rua, e exprimir a revolta que sentimos contra todos aqueles que são responsáveis por, mais uma vez, adiar a nossa vida. Muito caro pagarão todos os que aparecerem, neste momento, como intrusos aproveitando uma boleia alheia. Espero sinceramente que os partidos de esquerda percebam isto.
terça-feira, 8 de março de 2011
A manifestação de 12 de Março e o PCP (2)
Esta decisão do PCP em participar na manifestação também me fez matutar sobre a atitude que esse partido teve quando da recente manifestação anti-NATO. Nessa altura foi ver os comunistas a distinguir entre a "sua" manifestação e a "dos outros": "nada temos contra fazerem manifestações, mas façam-nas noutro sitio, não parasitem a nossa manifestação". Era muito engraçado ver este raciocínio agora aplicado à manifestação de 12 de Março.
A manifestação de 12 de Março e o PCP
(via oblogouavida)
O PCP anunciou que "estará presente" na manifestação de 12 de Março. Há amigos que nos fazem pior do que os inimigos, e apoios que certamente se dispensariam. Não se trata do "direito" de o PCP se fazer representar, de se solidarizar ou até apoiar; a questão é outra. Partindo do princípio que o PCP está de facto ao lado da manifestação, e pretende que esta seja um êxito (vamos acreditar nisso), então esta declaração é um tiro no pé (e vamos acreditar que não é uma facada nas costas). A pior coisa que pode acontecer a esta manifestação é ver-se submergida num mar de bandeiras vermelhas. Primeiro, porque isso desmobilizará uma parte dos seus aderentes, menos politizados, mas igualmente com razões para a revolta (e isso já começou a acontecer com este anúncio). Segundo, porque isso desvalorizará o impacto da manifestação, que reside na sua originalidade, tanto pela forma como foi convocada, à revelia dos partidos, como pelo conteúdo do seu manifesto, que é suficientemente abrangente de uma forma que só um grupo apartidário é capaz de produzir. Lá veríamos os comentadores de serviço a reduzir esta manifestação a "mais uma" de inspiração PC, com os resultados que tem tido todas as anteriores (e Miguel Sousa Tavares já sentenciou: se for muita gente à manifestação, é porque o PC está por trás). Esta gente esfregará as mãos se conseguir colar este movimento ao PCP, e assim esvaziar aquilo que tem de fundamentalmente diferente e original. Irão os comunistas fazer-lhes a vontade? É que isso acabaria por dar razão aos que consideram que o que o PCP pretende é não deixar os movimentos escapar-lhe do controlo, mais que o sucesso desses mesmos movimentos. Comunistas, e já agora outros que sofrerão do mesmo mal, mostrem-me que estou enganado. Compareçam em massa à manifestação, mas despidos dos símbolos partidários, compareçam como cidadãos que apoiam uma causa e não como membros de organizações que a parasitem. Ajudem ao sucesso deste movimento.
terça-feira, 22 de fevereiro de 2011
A moção de censura
Via O País do Burro, eis o texto da moção de censura que o Bloco de Esquerda irá apresentar:
MOÇÃO DE CENSURA N.º 2/XI
MOÇÃO DE CENSURA AO XVIII GOVERNO CONSTITUCIONAL
EM DEFESA DAS GERAÇÕES SACRIFICADAS
Ao longo do ano e meio do seu mandato, o XVIIIº Governo adoptou uma política económica e social que tem atingido essencialmente os trabalhadores sem emprego e os jovens da geração mais preparada que o país já formou, que são marginalizados das suas competências para se afundarem num trabalho sem futuro. Existe hoje mais de um milhão de trabalhadores em situação totalmente precária, incluindo uma parte significativa sendo paga a troco de falso recibo verde, e promessas do Programa de Governo, como o fim dos recibos verdes no Estado, foram clamorosamente violadas. Ora, uma economia de exploração de salários mínimos é um cemitério de talentos e uma democracia amputada das melhores qualificações.
Esta Moção de Censura recusa por isso o gigantesco embuste da distribuição equilibrada dos sacrifícios e sublinha que o emprego e o salário têm sido destruídos pela cruel insensibilidade social que corrói a economia em nome da ganância financeira, e propõe uma ruptura democrática que evite a destruição implacável dos trabalhadores mais velhos pelo desemprego e dos mais novos no altar da precarização.
De facto, ao reduzir o apoio aos desempregados, o Governo deu um passo na sua estratégia agressiva quanto ao mercado de trabalho. O subsídio de desemprego passou a ser apresentado como um custo e não como um direito que decorre do próprio desconto do trabalhador, como um prejuízo e não como um acto de justiça. Agora, o Governo vai mais longe, procurando impor a redução da indemnização pelo despedimento, para o embaratecer e facilitar.
Deste modo, durante o seu mandato, apesar de ter perdido a sua maioria absoluta, o governo ignorou os sinais dos eleitores. Promoveu o agravamento da crise social com o aumento dos impostos, a queda do investimento público, a redução de salários, a degradação dos apoios sociais com a retirada do abono de família e de outras prestações a centenas de milhares de famílias, o aumento dos preços de medicamentos e outros bens essenciais e o congelamento das pensões.
Esta orientação conduz o país para o abismo da recessão. Agrava as dificuldades da economia em vez de lhes responder. Condena uma parte da população ao desemprego estrutural permanente, em números que a democracia portuguesa jamais conheceu. Reduz os rendimentos de trabalhadores e pensionistas. Esta política condena o país ao império do abuso.
A chantagem dos mercados financeiros, incluindo da finança portuguesa, que impõem juros em redor dos 7% ao refinanciamento a dez anos da dívida soberana, aprofunda as dificuldades da economia. Mas o governo respondeu a esta pressão favorecendo a finança ao agravar a transferência dos salários e dos impostos para os juros e, ainda, permitindo que os grandes bancos privados não paguem o IRC de lei. Esta situação é portanto insuportável. O país está endividado e a política orçamental precipita maiores custos de endividamento e restrições ao investimento, à produção e ao emprego.
Ora, um factor suplementar que agrava a crise actual é a forma como o governo tem desprezado os grandes combates democráticos pela qualidade dos serviços públicos do Estado Social, pela economia do emprego e contra a agiotagem financeira. Esta insensibilidade social é a causa da falta de confiança numa governação desgastada, que foge à responsabilidade, cultiva o favorecimento e provoca o apodrecimento da decisão política.
Exige-se por isso um novo caminho, com uma viragem da política económica para o combate à recessão. Exige-se a solução do défice fiscal para corrigir o défice orçamental, a solução do investimento criador de emprego e promotor de exportações e de substituição de importações, a solução da recuperação da agricultura para promover a soberania alimentar, a recuperação da procura interna com a defesa dos salários, a valorização das pensões e o combate à precariedade em nome da vida das pessoas.
O Governo, apesar de ter sido suportado por uma grande maioria parlamentar nas mais importantes decisões económicas, não responde às grandes prioridades nacionais, que são o combate ao desemprego, pobreza e precariedade, antes agrava as condições do trabalho para facilitar os despedimentos e portanto os salários baixos, seguindo a orientação do FMI que recomenda a desprotecção dos rendimentos e dos contratos dos trabalhadores. Esta resposta agrava as desigualdades na sociedade portuguesa e é por isso imperativo, em nome de uma política que se comprometa com a defesa das gerações sacrificadas, derrotar as medidas que promovem o desemprego e a precariedade e convocar a democracia para que decida as soluções para o país. Assim,
A Assembleia da República, ao abrigo do artigo 194º da Constituição da República Portuguesa, delibera censurar o XVIII Governo Constitucional.
As Deputadas e os Deputados do Bloco de Esquerda
terça-feira, 15 de fevereiro de 2011
A moção de censura e o Bloco de Esquerda
A decisão do Bloco de Esquerda em apresentar uma moção de censura ao governo Sócrates é discutível. É-o, sobretudo, porque se segue ao desastre que foi o apoio a Alegre nas presidenciais (o apoio nas condições em que foi feito, não o apoio em si), e porque aparece aos olhos de todos como uma tentativa do BE de se defender de ataques à sua esquerda, que repetidamente o acusam, algo infantilmente, acrescento, de colagem ao governo. Ora, o pior nesta moção pode muito bem ser esta aparência de "tacticismo" politiqueiro, que contrasta com o que a actuação do BE nos tem habituado. Para mais, não é segredo que os últimos tempos a definição sobre o caminho que o Bloco irá tomar tem originado divergências, primeiro do seu lado esquerdo (no apoio a Alegre), e agora da sua ala direita (vide Daniel Oliveira). E depois, como nota o Filipe Tourais, no BE há esse estranho hábito de, quando há divergências, as pessoas as assumirem em público, demitirem-se dos orgãos a que pertencem, etc, o que, é bom de ver, contrasta e de que maneira com os hábitos monolíticos e de rebanho dos restantes partidos parlamentares.
Mas o que me motiva a escrever este post é outra coisa: a propósito destes últimos acontecimentos, e, como acontece habitualmente quando se trata do Bloco, confundindo os seus desejos com a realidade, vieram os comentadores instalados anunciar o inicio de um "processo de definhamento" do BE, da sua "decadência", do "fim de um ciclo". Vasco Pulido Valente, com o mau gosto habitual, chega a chamar-nos, a nós, votantes do BE, de atrasados mentais (não vê como alguém com um QI maior que 50 possa votar em tal partido. A este respeito, uma boa resposta é esta do Zé Neves); e o inefável Rui Moreira, no Jornal da RTP2 de ontem, anunciava, de dentes arreganhados e a salivar da boca, o início do processo de "PRDização" do Bloco ("até envolve uma moção de censura e tudo"...), ignorando o evidente absurdo de comparar um partido efémero, originado por um projecto de poder unipessoal, e sem ideologia definida, com um partido-movimento de crescimento sustentado de eleição para eleição nos últimos 10 anos, e com um lugar perfeitamente definido no espectro ideológico, o que permite, evidentemente, a fixação do seu eleitorado de uma maneira que seria impossível a um partido como o PRD. Acrescentam as patranhas e os mitos sempre repetidos e sempre desmentidos de eleição para eleição, os de que o eleitorado do Bloco é "flutuante", "inconstante", "jovem", quiçá querendo dizer que os eleitores do BE são um monte de freaks que fumam ganza e não sabem bem o que fazem, ou miúdos que saíram agora da escola, coitadinhos, ou os restos dos líricos de 74-75. Ou, com um ar mais grave e analítico, juram para quem os quiser ouvir que o partido "não tem bases", "não tem implantação" ou "tem poucos militantes", por mais que a realidade desminta qualquer uma destas mentiras. Estes comentadores, movidos pelo seu ódio ao BE, que sabem ser o grande factor de novidade da política portuguesa, e a grande ameaça ao status quo instalado da "alternância democrática", tomam, como disse, os seus desejos por realidades, porque tem medo do Bloco. Tem medo que o Bloco chegue ao poder e estrague o arranjinho politico-constitucional de 1975; tem medo que o Bloco provoque uma verdadeira inflexão do panorama político à esquerda, porque o Bloco, ao contrário do PCP, um partido instalado nos seus feudos, ambiciona crescer, quer o poder, quer alterar o status quo onde estes comentadores se sentem como peixes na água, já que o sistema os tem tratado bem nos últimos 30 anos.
O que conforta é saber como estes vampiros se enganam. É que o Bloco de Esquerda, sabemo-lo bem, não é nenhum PRD. O lugar que ocupa corresponde ao posicionamento político de centenas de milhar de portugueses, que estão à esquerda do PS mas rejeitam os tiques autoritários, anti-democráticos, burocráticos e controleiros do PCP. É a esquerda democrática em Portugal: verdadeiramente esquerda, e verdadeiramente democrática. Quer trabalhar também em formas outras de modificar as relações sociais e económicas, e aprofundar a democracia, a participação e a cidadania, rejeitar e revolucionar o modo de vida capitalista, mas sabe que é essencial que este projecto político-social esteja representado no parlamento de uma maneira forte, e não rejeite chegar ao poder por via eleitoral (porque não? Desde que não renegue os seus princípios, isso significaria uma mudança evidente nas relações de poder neste país). Houve erros estratégicos nos últimos tempos, sim, e devem ser discutidos, com certeza, e se calhar pela primeira vez o Bloco vai perder votos nas legislativas, pois é bem possível. São dores de crescimento. Mas aqueles que sonham com a implosão do BE, sonham acordados, e se confundem de modo tão espúrio os seus desejos com a realidade, então para que servirão esses analistas? Mais uma vez a realidade, na forma de eleições, irá desmentir os sonhos húmidos destas luminárias, e acordá-los para a dura verdade: o Bloco de Esquerda veio para ficar, é melhor contarem com ele.
P.S: Alguns amigos, de que o efémero colaborador deste blogue Luís Palácios é exemplo, sabem que eu costumava dizer que ponderaria juntar-me ao Bloco no dia em que as coisas começassem a correr mal pela primeira vez. Talvez seja este o momento.
quarta-feira, 9 de fevereiro de 2011
Jornadas Anticapitalistas
"Num momento em que o capitalismo se revela como crise e esta serve de pretexto à dissolução das últimas garantias do Estado social, numa altura em que dinheiros públicos pagam a bancarrota de bancos e seguradoras perdidos nas aventuras dos mercados, em que o capital desbasta recursos naturais em prol do benefício de muito poucos, em que a democracia procura sobreviver à crescente perda de legitimidade representada pela corrupção no seio do poder político ou pelas elevadas taxas de abstenção nos actos eleitorais, num contexto de generalização do uso de dispositivos de segurança, controlo e mercadorização da palavra e do corpo, nós, como outros em todo o mundo, escolhemos organizar-nos.
Ocupamos um espaço fora da política institucional. Não pretendemos representar ninguém, nem nos orientamos por uma lógica programática. Não nos junta uma direcção, mas uma afinidade que se encontra mais numa rejeição óbvia do capitalismo do que em eventuais proximidades ideológicas. Entregamos em exclusivo a uma assembleia, horizontal, aberta e informal, todos os momentos de decisão. Uma assembleia em que todos podem a todo o tempo tudo decidir.
As Jornadas anticapitalistas são a proposta que apresentamos. O seu programa permanece e permanecerá sempre em aberto e outras acções, que com ela se identifiquem ou solidarizem, poderão e deverão ter lugar. Este documento é, por isso, também um apelo à mobilização de todos os anticapitalistas e antiautoritários.
Propomos um conjunto de diferentes actividades e acções a decorrer no período de 1 a 8 de Março, que conte com acções de rua, debates, visionamento de filmes, jantares e festas, entre outros, que proponham saídas para este modo de vida e que critiquem de forma radical e directa o sistema capitalista. Estamos de acordo que não queremos esta ou qualquer outra economia capitalista e, nessa recusa, criamos um terreno comum, onde os contributos acompanham as diferentes sensibilidades num processo colectivo de discussão, decisão e acção."
sexta-feira, 21 de janeiro de 2011
Porque vou votar em Manuel Alegre
Esta é uma declaração de voto a contragosto. Somando erro atrás de erro, Manuel Alegre perdeu muito do capital político e de esperança que uma figura com a sua, que pertence aquela pequena parte do PS com que vale a pena fazer pontes, certamente não merecia. Hoje por hoje toda a gente já percebeu o erro crasso que foi trabalhar para o apoio envenenado do PS de Sócrates. O próprio Bloco de Esquerda, o partido em que costumo votar nas legislativas, vai pagar caro (já está a pagar com algumas dissensões) a contradição que é estar a apoiar um candidato que, nesta campanha, anda a jogar um perigoso jogo do equilibrista, procurando agradar à esquerda sem comprometer o centro. Mesmo a campanha, em si, é uma desilusão, sem chama, sem rumo (o jogo do equilíbrio), e deixando transparecer uma imagem de solidão. Posto isto: vou votar Manuel Alegre. Por duas razões, que se mantém absolutamente válidas: primeiro, porque como a direita pura e dura percebeu muito bem, mas a esquerda mais "radical" parece incapaz de compreender, o verdadeiro candidato de Sócrates não é Alegre, mas Cavaco. Ou será que todo o processo inquinado que levou a um apoio tardio e com ares de forçado, ou a ausência da máquina-PS na campanha, são meras coincidências? A previsível derrota de Alegre vai também, como a direita pura e dura igualmente percebeu, dar uma machadada na ala esquerda do PS, e acabar com veleidades "secessionistas" e de aproximação ao BE, o que interessa a Sócrates e aos seus, e a mais ninguém. Segundo, porque se não vejo grandes diferenças para Sócrates entre ter Alegre ou Cavaco na presidência, já com um possível governo Passos Coelho tudo será diferente. Passos, Cavaco e o FMI: eis a tríade para destruir de vez o estado social em Portugal, e fazer-nos ainda ter saudades dos anos negros de Sócrates.
Pelos motivos que apresentei, preparo-me para engolir um sapo e depositar o meu voto num candidato que pouco me entusiasma. Mas fá-lo-ei sem remorsos: a política é, também mas não só, a arte do possível. Evitar a reeleição de Cavaco deve ser visto como um dever de cidadania para todos os que ainda acreditam num país solidário e livre, e nas funções sociais do Estado. É com muita pena que vejo que alguns não tem noção do facto de este ser um momento paradigmático e crucial para Portugal; preparam-se hoje as condições finais para o derradeiro ataque ao que resta do 25 de Abril, e para trocarmos o estado social pela selvajaria neoliberal. E é com alguma revolta que assisto a uma certa extrema-esquerda atacar todos os dias Alegre mas nunca Cavaco, trabalhando activamente para a vitória da direita, provando mais uma vez, se preciso fosse, que o seu papel actual na história define-se em uma palavra: reaccionário.
terça-feira, 30 de novembro de 2010
A falência moral de uma certa extrema-esquerda
É com posts como este que é posta a nu a miséria moral de uma certa parte da "extrema-esquerda", enredada na ilusão das escolhas obrigatórias, e perdida ideologicamente e praticamente, de tal modo que, cega pelo seu ódio ao sistema vigente, desesperada pela aparente falta de respostas (que não as vê, o que não quer dizer que elas não existam), resolve "escolher": escolher tudo o que (aparentemente, pois se o faz de facto, é outra conversa) se "oponha" ao "capitalismo". É assim que esta esquerda escolhe o Hamas e o Irão contra os Estados Unidos, o que se é um erro e uma prova de ingenuidade e de infantilidade na forma de olhar para a complexidade do Mundo, pelo menos pode-se discutir. Mas é também assim que esta esquerda escolhe nem mais nem menos que o lado dos gangsters, que aterrorizam e oprimem os habitantes das favelas brasileiras, e são pelo menos tão responsáveis pela falta de saída das vidas dessa gente como o estado brasileiro e a ordem social vigente (aliás: não serão eles parte da ordem social vigente?), posto que do outro lado está "o estado", e o exército, e a lei do Brasil. Temos assim que os criminosos das favelas brasileiras, que assassinam os seus vizinhos, que enriqueceram à custa dos seus concidadãos e dos quais não se conhece um pingo de um programa de solidariedade social, são elevados a verdadeiros revolucionários urbanos, quiçá à esperança dos desesperados da extrema-esquerda, que detestam o sistema, não encontram alternativas, e alucinam com exércitos revolucionários onde apenas está o fascismo (no caso islamita) ou a pura delinquência (no caso em apreço). Preto ou Branco. Capitalismo ou os seus inimigos. Esta é a armadilha teórica que resulta na falência moral das posições do Renato Teixeira.
Manifesto dos economistas aterrorizados (falsa evidência nº 3)
Falsa evidência n.º 3:
OS MERCADOS SÃO BONS JUIZES DO GRAU DE SOLVÊNCIA DOS ESTADOS
Segundo os defensores da eficiência dos mercados financeiros, os operadores de mercado teriam em conta a situação objectiva das finanças públicas para avaliar o risco de subscrever um empréstimo ao Estado. Tomemos o exemplo da dívida grega: os operadores financeiros, e todos quantos tomam as decisões, recorreram unicamente às avaliações financeiras para ajuizar sobre a situação. Assim, quando a taxa exigida à Grécia ascendeu a mais de 10%, cada um deduziu que o risco de incumprimento de pagamento estaria próximo: se os investidores exigem tamanho prémio de risco é porque o perigo é extremo.
Mas há nisto um profundo erro, quando compreendemos a verdadeira natureza das avaliações feitas pelos mercados financeiros. Como não é eficiente, o mais provável é que apresente preços completamente desconectados dos fundamentos económicos. Nessas condições, é irrazoável entregar unicamente às avaliações financeiras a análise de uma dada situação. Atribuir um valor a um título financeiro não é uma operação comparável a medir uma proporção objectiva, como por exemplo calcular o peso de um objecto. Um título financeiro é um direito sobre rendimentos futuros: para o avaliar é necessário prever o que será o futuro. É uma questão de valoração, não uma tarefa objectiva, porque no instante t o futuro não se encontra de nenhum modo predeterminado. Nas salas de mercado, as coisas são o que os operadores imaginam que venham a ser. O preço de um activo financeiro resulta de uma avaliação, de uma crença, de uma aposta no futuro: nada assegura que a avaliação dos mercados tenha alguma espécie de superioridade sobre as outras formas de avaliação.
A avaliação financeira não é, sobretudo, neutra: ela afecta o objecto que é medido, compromete e constrói um futuro que imagina. Deste modo, as agências de notação financeira contribuem largamente para determinar as taxas de juro nos mercados obrigacionistas, atribuindo classificações carregadas de grande subjectividade, contaminadas pela vontade de alimentar a instabilidade, fonte de lucros especulativos. Quando baixam a notação de um Estado, as agências de notação aumentam a taxa de juro exigida pelos actores financeiros para adquirir os títulos da dívida pública desse Estado e ampliam assim o risco de colapso, que elas mesmas tinham anunciado.
Para reduzir a influência da psicologia dos mercados no financiamento dos Estados, colocamos em debate duas medidas:
Medida n.º 8: As agências de notação financeira não devem estar autorizadas a influenciar, de forma arbitrária as taxas de juro dos mercados de dívida pública, baixando a notação de um Estado: a sua actividade deve ser regulamentada, exigindo-se que essa classificação resulte de um cálculo económico transparente;
Medida n.º 8 (b): Libertar os Estados da ameaça dos mercados financeiros, garantindo a compra de títulos da dívida pública pelo BCE.
sábado, 20 de novembro de 2010
Amanhã, a NATO e a manif
Foi uma semana complicada. Primeiro, a ressacar do Barreiro Rocks, depois os problemas no acesso à net, e eis que o momentum para se escrever sobre a cimeira da NATO, e os protestos contra a mesma, de algum modo se esfumou. Ou será que não? Ter-me-ia apetecido, certamente, abordar dois ângulos: o primeiro, o da nojenta campanha lançada pelas autoridades e patrocinada pelos media (desculpem-me os ofendidos, mas cada vez concordo mais com o post do Luiz mais abaixo), destinada a lançar o medo e confundir os protestos contra a cimeira com acções perpetradas por criminosos, ou a envolver a desobediência civil e mesmo a resistência violenta nessa capa estúpida mas conveniente, o "terrorismo". Hoje, já em cima da hora, todos já sabemos que: não vem, nem nunca planeou vir a Portugal, ninguém do "Black Bloc", ou do que o valha; e que se preparam coisas feias contra os mesmos de sempre (a meia dúzia de anarcas portugueses, e desta vez as outras dúzias de anarcas de outros países que cá estarão). O que me leva exactamente ao segundo ângulo, já que temo que a porrada seja aplicada com a indiferença, e mesmo com o aplauso, de outras "organizações de esquerda" que pretendem monopolizar o protesto na sua agenda, e ao serviço não da luta contra a NATO, o militarismo ou mesmo o capitalismo, mas dos interesses de um partido político, o do costume. A este respeito, exemplar, exemplar, é a troca de argumentos nos comentários a este post do Cinco Dias (138 comentários ao momento!). Leiam, e descubram, se ainda não conhecem, não só o sectarismo e a desunião da Esquerda no seu esplendor, como ilustradas as razões pelas quais eu quero que o PCP se extinga. Nada há de mais sectário e controlador que o PCP, e a união da Esquerda, mesmo que por causas pontuais, só será conseguida à custa do enfraquecimento desse partido. Não acreditam? Pois vejam como pretendem controlar a "sua" manifestação, e mesmo impedir os outros de o fazer como pretendem. O argumentário utilizado é todo um programa: "os outros que vão fazer A SUA manifestação para outro lado, esta é a NOSSA manifestação", and so on (há ali até um ponto em que a coisa chega ao delírio, quando defendem que uma lei se superioriza à constituição, ou quando utilizam em seu benefício pareceres do MAI - a fidelidade ao partido exige todos os desmandos).
Aqui neste blogue somos sectários à vontade, pelo que colocamos o cartaz da organização menos sectária,
a tal que foi mandada fazer "a sua" manifestação para outro lado.
sexta-feira, 19 de novembro de 2010
Manifesto dos economistas aterrorizados (falsa evidência nº2)
Falsa evidência n.º 2:
OS MERCADOS FINANCEIROS FAVORECEM O CRESCIMENTO ECONÓMICO
A integração financeira conduziu o poder da finança ao seu zénite, na medida em que ela unifica e centraliza a propriedade capitalista à escala mundial. Daí em diante, é ela quem determina as normas de rentabilidade exigidas ao conjunto dos capitais. O projecto consistia em substituir o financiamento bancário dos investidores pelo financiamento através dos mercados de capitais. Projecto que fracassou porque hoje, globalmente, são as empresas quem financia os accionistas, em vez de suceder o contrário. Consequentemente, a governação das empresas transformou-se profundamente para atingir as normas de rentabilidade exigidas pelos mercados financeiros. Com o aumento exponencial do valor das acções, impôs-se uma nova concepção da empresa e da sua gestão, pensadas como estando ao serviço exclusivo dos accionistas. E desapareceu assim a ideia de um interesse comum inerente às diferentes partes, vinculadas à empresa. Os dirigentes das empresas cotadas em Bolsa passaram a ter como missão primordial satisfazer o desejo de enriquecimento dos accionistas. Por isso, eles mesmos deixaram de ser assalariados, como denota o galopante aumento das suas remunerações. De acordo com a teoria da “agência”, trata-se de proceder de modo a que os interesses dos dirigentes estejam alinhados com os interesses dos accionistas.
Um ROE (Return on Equity ou rendimento dos capitais próprios) de 15% a 25% passa a constituir a norma que impõe o poder da finança às empresas e aos assalariados e a liquidez é doravante o seu instrumento, permitindo aos capitais não satisfeitos, a qualquer momento, ir procurar rendimentos noutro lugar. Face a este poder, tanto os assalariados como a soberania política ficam, pelo seu fraccionamento, em condição de inferioridade. Esta situação desequilibrada conduz a exigências de lucros irrazoáveis, na medida em que reprimem o crescimento económico e conduzem a um aumento contínuo das desigualdades salariais. Por um lado, as exigências de lucro inibem fortemente o investimento: quanto mais elevada for a rentabilidade exigida, mais difícil se torna encontrar projectos com uma performance suficientemente eficiente para a satisfazer. As taxas de investimento fixam-se assim em níveis historicamente débeis, na Europa e nos Estados Unidos. Por outro lado, estas exigências provocam uma constante pressão para a redução dos salários e do poder de compra, o que não favorece a procura. A desaceleração simultânea do investimento e do consumo conduz a um crescimento débil e a um desemprego endémico. Nos países anglo-saxónicos, esta tendência foi contrariada através do aumento do endividamento das famílias e através das bolhas financeiras, que geram uma riqueza assente num crescimento do consumo sem salários, mas que desemboca no colapso.
Para superar os efeitos negativos dos mercados financeiros sobre a actividade económica, colocamos em debate três medidas:
Medida n.º 5: Reforçar significativamente os contra-poderes nas empresas, de modo a obrigar os dirigentes a ter em conta os interesses do conjunto das partes envolvidas;
Medida n.º 6: Aumentar fortemente os impostos sobre os salários muito elevados, de modo a dissuadir a corrida a rendimentos insustentáveis;
Medida n.º 7: Reduzir a dependência das empresas em relação aos mercados financeiros, incrementando uma política pública de crédito (com taxas preferenciais para as actividades prioritárias no plano social e ambiental).
quinta-feira, 11 de novembro de 2010
Manifesto dos economistas aterrorizados (falsa evidência nº1)
Falsa evidência n.º 1:
OS MERCADOS FINANCEIROS SÃO EFICIENTES
Existe hoje um facto que se impõe a todos os observadores: o papel primordial que desempenham os mercados financeiros no funcionamento da economia. Trata-se do resultado de uma longa evolução, que começou nos finais da década de setenta. Independentemente da forma como a possamos medir, esta evolução assinala uma clara ruptura, tanto quantitativa como qualitativa, em relação às décadas precedentes. Sob a pressão dos mercados financeiros, a regulação do capitalismo transformou-se profundamente, dando origem a uma forma inédita de capitalismo, que alguns designaram por “capitalismo patrimonial”, por “capitalismo financeiro” ou, ainda, por “capitalismo neoliberal”.
Estas mudanças encontraram na hipótese da eficiência informacional dos mercados financeiros a sua justificação teórica. Com efeito, segundo esta hipótese, torna-se crucial desenvolver os mercados financeiros e fazer com que eles possam funcionar o mais livremente possível, dado constituírem o único mecanismo de afectação eficaz do capital. As políticas obstinadamente levadas a cabo nos últimos trinta anos seguem esta recomendação. Trata-se de construir um mercado financeiro mundialmente integrado, no qual todos os actores (empresas, famílias, Estados, instituições financeiras) possam trocar toda a espécie de títulos (acções, obrigações, dívidas, derivados, divisas), em qualquer prazo (longo, médio e curto). Os mercados financeiros assemelharam-se cada vez mais ao mercado “sem fricção”, de que falam os manuais: o discurso económico convertera-se em realidade. Como os mercados se tornaram cada vez mais “perfeitos”, no sentido da teoria económica dominante, os analistas acreditaram que doravante o sistema financeiro passaria a ser muito mais estável que no passado. A “grande moderação” – o período de crescimento económico sem subida dos salários, que os Estados Unidos conheceram entre 1990 e 2007 – parecia confirmá-lo.
Apesar de tudo o que aconteceu, o G20 persiste ainda hoje na ideia de que os mercados financeiros constituem o melhor mecanismo de afectação do capital. A primazia e integridade dos mercados financeiros continuam por isso a ser os objectivos finais da nova regulação financeira. A crise é interpretada não como o resultado inevitável da lógica dos mercados desregulados, mas sim como um efeito da desonestidade e irresponsabilidade de certos actores financeiros, mal vigiados pelos poderes públicos.
A crise, porém, encarregou-se de demonstrar que os mercados não são eficientes e que não asseguram uma afectação eficaz do capital. As consequências deste facto em matéria de regulação e de política económica são imensas. A teoria da eficiência assenta na ideia de que os investidores procuram (e encontram) a informação mais fiável possível quanto ao valor dos projectos que competem entre si por financiamento. Segundo esta teoria, o preço que se forma num mercado reflecte a avaliação dos investidores e sintetiza o conjunto da informação disponível: constitui, portanto, um bom cálculo do verdadeiro valor dos activos. Ou seja, supõe-se que esse valor resume toda a informação necessária para orientar a actividade económica e, desse modo, a vida social. O capital é, portanto, investido nos projectos mais rentáveis, deixando de lado os projectos menos eficazes. Esta é a ideia central da teoria: a concorrência financeira estabelece preços justos, que constituem sinais fiáveis para os investidores, orientando eficazmente o crescimento económico.
Mas a crise veio justamente confirmar o resultado de diversos trabalhos científicos que puseram esta proposição em causa. A concorrência financeira não estabelece, necessariamente, preços justos. Pior: a concorrência financeira é, frequentemente, destabilizadora e conduz a evoluções de preços excessivas e irracionais, as chamadas bolhas financeiras.
O principal erro da teoria da eficiência dos mercados financeiros consiste em transpor, para os produtos financeiros, a teoria usualmente aplicada aos mercados de bens correntes. Nestes últimos, a concorrência é em parte auto-regulada, em virtude do que se chama a “lei” da oferta e da procura: quando o preço de um bem aumenta, os produtores aumentam a sua oferta e os compradores reduzem a procura; o preço baixa e regressa, portanto, ao seu nível de equilíbrio. Por outras palavras, quando o preço de um bem aumenta, existem forças de retracção que tendem a inverter essa subida. A concorrência produz aquilo a que se chama “feedbacks negativos”, forças de retracção que vão em sentido contrário ao da dinâmica inicial. A ideia da eficiência nasce de uma transposição directa deste mecanismo para o mercado financeiro.
Mas neste último caso a situação é muito diferente. Quando o preço aumenta é frequente constatar não uma descida mas sim um aumento da procura! De facto, a subida de preço significa uma rentabilidade maior para aqueles que possuem o título, em virtude das mais-valias que auferem. A subida de preço atrai portanto novos compradores, o que reforça ainda mais a subida inicial. As promessas de bónus incentivam os que efectuam as transacções a ampliar ainda mais o movimento. Até ao acidente, imprevisível mas inevitável, que provoca a inversão das expectativas e o colapso. Este fenómeno, digno da miopia dos “borregos de Panurge”1, é um processo de “feedbacks positivos” que agrava os desequilíbrios. É a bolha especulativa: uma subida acumulada dos preços que se alimenta a si própria. Deste tipo de processo não resultam preços justos mas sim, pelo contrário, preços inadequados.
O lugar preponderante que os mercados financeiros ocupam não pode, portanto, conduzir a eficácia alguma. Mais do que isso, é uma fonte permanente de instabilidade, como demonstra de forma clara a série ininterrupta de bolhas que temos vindo a conhecer desde há vinte anos: Japão, Sudeste Asiático, Internet, mercados emergentes, sector imobiliário, titularização. A instabilidade financeira traduz-se assim em fortes flutuações das taxas de câmbio e da Bolsa, que manifestamente não têm qualquer relação com os fundamentos da economia. Esta instabilidade, nascida no sector financeiro, propaga-se a toda a economia real através de múltiplos mecanismos.
Para reduzir a ineficiência e instabilidade dos mercados financeiros, avançamos com quatro medidas:
Medida n.º 1: Limitar, de forma muito estrita, os mercados financeiros e as actividades dos actores financeiros, proibindo os bancos de especular por conta própria, evitando assim a propagação das bolhas e dos colapsos;
Medida n.º 2: Reduzir a liquidez e a especulação destabilizadora através do controle dos movimentos de capitais e através de taxas sobre as transacções financeiras;
Medida n.º 3: Limitar as transacções financeiras às necessidades da economia real (por exemplo, CDS unicamente para quem possua títulos segurados, etc.);
Medida n.º 4: Estabelecer tectos para as remunerações dos operadores de transacções financeiras.
terça-feira, 9 de novembro de 2010
Manifesto dos economistas aterrorizados (introdução)
Crise e Dívida na Europa:
10 falsas evidências, 22 medidas em debate para sair do impasse
Philippe Askenazy (CNRS, Ecole d’économie de Paris), Thomas Coutrot (Conselho Científico da Attac), André Orléan (CNRS, EHESS, Presidente da AFEP), Henri Sterdyniak (OFCE)
(Tradução de Nuno Serra; Revisão de João Rodrigues)
Introdução
A retoma económica mundial, que foi possível graças a uma injecção colossal de fundos públicos no circuito económico (desde os Estados Unidos à China) é frágil, mas real. Apenas um continente continua em retracção, a Europa. Reencontrar o caminho do crescimento económico deixou de ser a sua prioridade política. A Europa decidiu enveredar por outra via, a da luta contra os défices públicos.
“Na União Europeia, estes défices são de facto elevados – 7% em média em 2010 – mas muito inferiores aos 11% dos Estados Unidos. Enquanto alguns estados norte-americanos com um peso económico mais relevante do que a Grécia (como a Califórnia, por exemplo), se encontram numa situação de quase falência, os mercados financeiros decidiram especular com as dívidas soberanas de países europeus, particularmente do Sul. A Europa, de facto, encontra-se aprisionada na sua própria armadilha institucional: os Estados são obrigados a endividar-se nas instituições financeiras privadas que obtêm injecções de liquidez, a baixo custo, do Banco Central Europeu (BCE). Por conseguinte, os mercados têm em seu poder a chave do financiamento dos Estados. Neste contexto, a ausência de solidariedade europeia incentiva a especulação, ao mesmo tempo que as agências de notação apostam na acentuação da desconfiança.
Foi necessário que a agência Moody baixasse a notação da Grécia, a 15 de Junho, para que os dirigentes europeus redescobrissem o termo “irracionalidade”, a que tanto recorreram no início da crise do subprime. Da mesma forma que agora se descobre que a Espanha está muito mais ameaçada pela fragilidade do seu modelo de crescimento e do seu sistema bancário do que pela sua dívida pública.”
Para “tranquilizar os mercados” foi improvisado um Fundo de Estabilização do euro e lançados, por toda a Europa, planos drásticos – e em regra cegos – de redução das despesas públicas. As primeiras vítimas são os funcionários públicos, como sucede em França, onde a subida dos descontos para as suas pensões corresponderá a uma redução escondida dos seus salários, encontrando-se o seu número a diminuir um pouco por toda a parte, pondo em causa os serviços públicos. Da Holanda a Portugal, passando pela França com a actual reforma das pensões, as prestações sociais estão em vias de ser severamente amputadas. Nos próximos anos, o desemprego e a precariedade do emprego vão seguramente aumentar. Estas medidas são irresponsáveis de um ponto de vista político e social, mas também num plano estritamente económico.
Esta política, que apenas muito provisoriamente acalmou a especulação, teve já consequências extremamente negativas em muitos países europeus, afectando de modo particular a juventude, o mundo do trabalho e as pessoas em situação de maior fragilidade. A longo prazo, esta política reactivará as tensões na Europa e ameaçará por isso a própria construção europeia, que é muito mais do que um projecto económico. Supõe-se que a economia esteja ao serviço da construção de um continente democrático, pacífico e unido. Mas em vez disso, uma espécie de ditadura dos mercados é hoje imposta por toda a parte, particularmente em Portugal, Espanha e Grécia, três países que eram ditaduras no início da década de setenta, ou seja, há apenas quarenta anos.
Quer se interprete como um desejo de “tranquilizar os mercados”, por parte de governantes assustados, quer se interprete como um pretexto para impor opções ditadas pela ideologia, a submissão a esta ditadura não é aceitável, uma vez que já demonstrou a sua ineficácia económica e o seu potencial destrutivo no plano político e social. Um verdadeiro debate democrático sobre as escolhas de política económica deve pois ser aberto, em França e na Europa. A maior parte dos economistas que intervém no debate público, fazem-no para justificar ou racionalizar a submissão das políticas às exigências dos mercados financeiros. É certo que, um pouco por toda a parte, os poderes públicos tiveram que improvisar planos keynesianos de relançamento da economia e, por vezes, chegaram inclusive a nacionalizar temporariamente os bancos. Mas eles querem fechar, o mais rapidamente possível, este parêntese. A lógica neoliberal é sempre a única que se reconhece como legítima, apesar dos seus evidentes fracassos. Fundada na hipótese da eficiência dos mercados financeiros, preconiza a redução da despesa pública, a privatização dos serviços públicos, a flexibilização do mercado de trabalho, a liberalização do comércio, dos serviços financeiros e dos mercados de capital, por forma a aumentar a concorrência em todos os domínios e em toda a parte…
Enquanto economistas, aterroriza-nos constatar que estas políticas continuam a estar na ordem do dia e que os seus fundamentos teóricos não sejam postos em causa. Mas os factos trataram de questionar os argumentos utilizados desde há trinta anos para orientar as opções das políticas económicas europeias. A crise pôs a nu o carácter dogmático e infundado da maioria das supostas evidências, repetidas até à saciedade por aqueles que decidem e pelos seus conselheiros. Quer se trate da eficiência e da racionalidade dos mercados financeiros, da necessidade de cortar nas despesas para reduzir a dívida pública, quer se trate de reforçar o “pacto de estabilidade”, é imperioso questionar estas falsas evidências e mostrar a pluralidade de opções possíveis em matéria de política económica. Outras escolhas são possíveis e desejáveis, com a condição de libertar, desde já, o garrote imposto pela indústria financeira às políticas públicas.
Procedemos de seguida a uma apresentação crítica de dez postulados que continuam a inspirar, dia após dia, as decisões dos poderes públicos em toda a Europa, apesar dos lancinantes desmentidos que a crise financeira e as suas consequências nos revelam. Trata-se de falsas evidências, que inspiram medidas injustas e ineficazes, perante as quais expomos vinte e duas contrapropostas para debate. Cada uma delas não reúne necessariamente a concordância unânime dos signatários deste manifesto, mas deverão ser levadas a sério, caso se pretenda resgatar a Europa do impasse em que neste momento se encontra.
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