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terça-feira, 22 de fevereiro de 2011

A moção de censura

Via O País do Burro, eis o texto da moção de censura que o Bloco de Esquerda irá apresentar:

MOÇÃO DE CENSURA N.º 2/XI
MOÇÃO DE CENSURA AO XVIII GOVERNO CONSTITUCIONAL
EM DEFESA DAS GERAÇÕES SACRIFICADAS
Ao longo do ano e meio do seu mandato, o XVIIIº Governo adoptou uma política económica e social que tem atingido essencialmente os trabalhadores sem emprego e os jovens da geração mais preparada que o país já formou, que são marginalizados das suas competências para se afundarem num trabalho sem futuro. Existe hoje mais de um milhão de trabalhadores em situação totalmente precária, incluindo uma parte significativa sendo paga a troco de falso recibo verde, e promessas do Programa de Governo, como o fim dos recibos verdes no Estado, foram clamorosamente violadas. Ora, uma economia de exploração de salários mínimos é um cemitério de talentos e uma democracia amputada das melhores qualificações.
Esta Moção de Censura recusa por isso o gigantesco embuste da distribuição equilibrada dos sacrifícios e sublinha que o emprego e o salário têm sido destruídos pela cruel insensibilidade social que corrói a economia em nome da ganância financeira, e propõe uma ruptura democrática que evite a destruição implacável dos trabalhadores mais velhos pelo desemprego e dos mais novos no altar da precarização.
De facto, ao reduzir o apoio aos desempregados, o Governo deu um passo na sua estratégia agressiva quanto ao mercado de trabalho. O subsídio de desemprego passou a ser apresentado como um custo e não como um direito que decorre do próprio desconto do trabalhador, como um prejuízo e não como um acto de justiça. Agora, o Governo vai mais longe, procurando impor a redução da indemnização pelo despedimento, para o embaratecer e facilitar.
Deste modo, durante o seu mandato, apesar de ter perdido a sua maioria absoluta, o governo ignorou os sinais dos eleitores. Promoveu o agravamento da crise social com o aumento dos impostos, a queda do investimento público, a redução de salários, a degradação dos apoios sociais com a retirada do abono de família e de outras prestações a centenas de milhares de famílias, o aumento dos preços de medicamentos e outros bens essenciais e o congelamento das pensões.
Esta orientação conduz o país para o abismo da recessão. Agrava as dificuldades da economia em vez de lhes responder. Condena uma parte da população ao desemprego estrutural permanente, em números que a democracia portuguesa jamais conheceu. Reduz os rendimentos de trabalhadores e pensionistas. Esta política condena o país ao império do abuso.
A chantagem dos mercados financeiros, incluindo da finança portuguesa, que impõem juros em redor dos 7% ao refinanciamento a dez anos da dívida soberana, aprofunda as dificuldades da economia. Mas o governo respondeu a esta pressão favorecendo a finança ao agravar a transferência dos salários e dos impostos para os juros e, ainda, permitindo que os grandes bancos privados não paguem o IRC de lei. Esta situação é portanto insuportável. O país está endividado e a política orçamental precipita maiores custos de endividamento e restrições ao investimento, à produção e ao emprego.
Ora, um factor suplementar que agrava a crise actual é a forma como o governo tem desprezado os grandes combates democráticos pela qualidade dos serviços públicos do Estado Social, pela economia do emprego e contra a agiotagem financeira. Esta insensibilidade social é a causa da falta de confiança numa governação desgastada, que foge à responsabilidade, cultiva o favorecimento e provoca o apodrecimento da decisão política.
Exige-se por isso um novo caminho, com uma viragem da política económica para o combate à recessão. Exige-se a solução do défice fiscal para corrigir o défice orçamental, a solução do investimento criador de emprego e promotor de exportações e de substituição de importações, a solução da recuperação da agricultura para promover a soberania alimentar, a recuperação da procura interna com a defesa dos salários, a valorização das pensões e o combate à precariedade em nome da vida das pessoas.
O Governo, apesar de ter sido suportado por uma grande maioria parlamentar nas mais importantes decisões económicas, não responde às grandes prioridades nacionais, que são o combate ao desemprego, pobreza e precariedade, antes agrava as condições do trabalho para facilitar os despedimentos e portanto os salários baixos, seguindo a orientação do FMI que recomenda a desprotecção dos rendimentos e dos contratos dos trabalhadores. Esta resposta agrava as desigualdades na sociedade portuguesa e é por isso imperativo, em nome de uma política que se comprometa com a defesa das gerações sacrificadas, derrotar as medidas que promovem o desemprego e a precariedade e convocar a democracia para que decida as soluções para o país. Assim,
A Assembleia da República, ao abrigo do artigo 194º da Constituição da República Portuguesa, delibera censurar o XVIII Governo Constitucional.
As Deputadas e os Deputados do Bloco de Esquerda

terça-feira, 15 de fevereiro de 2011

A moção de censura e o Bloco de Esquerda

A decisão do Bloco de Esquerda em apresentar uma moção de censura ao governo Sócrates é discutível. É-o, sobretudo, porque se segue ao desastre que foi o apoio a Alegre nas presidenciais (o apoio nas condições em que foi feito, não o apoio em si), e porque aparece aos olhos de todos como uma tentativa do BE de se defender de ataques à sua esquerda, que repetidamente o acusam, algo infantilmente, acrescento, de colagem ao governo. Ora, o pior nesta moção pode muito bem ser esta aparência de "tacticismo" politiqueiro, que contrasta com o que a actuação do BE nos tem habituado. Para mais, não é segredo que os últimos tempos a definição sobre o caminho que o Bloco irá tomar tem originado divergências, primeiro do seu lado esquerdo (no apoio a Alegre), e agora da sua ala direita (vide Daniel Oliveira). E depois, como nota o Filipe Tourais, no BE há esse estranho hábito de, quando há divergências, as pessoas as assumirem em público, demitirem-se dos orgãos a que pertencem, etc, o que, é bom de ver, contrasta e de que maneira com os hábitos monolíticos e de rebanho dos restantes partidos parlamentares.
Mas o que me motiva a escrever este post é outra coisa: a propósito destes últimos acontecimentos, e, como acontece habitualmente quando se trata do Bloco, confundindo os seus desejos com a realidade, vieram os comentadores instalados anunciar o inicio de um "processo de definhamento" do BE, da sua "decadência", do "fim de um ciclo". Vasco Pulido Valente, com o mau gosto habitual, chega a chamar-nos, a nós, votantes do BE, de atrasados mentais (não vê como alguém com um QI maior que 50 possa votar em tal partido. A este respeito, uma boa resposta é esta do Zé Neves); e o inefável Rui Moreira, no Jornal da RTP2 de ontem, anunciava, de dentes arreganhados e a salivar da boca, o início do processo de "PRDização" do Bloco ("até envolve uma moção de censura e tudo"...), ignorando o evidente absurdo de comparar um partido efémero, originado por um projecto de poder unipessoal, e sem ideologia definida, com um partido-movimento de crescimento sustentado de eleição para eleição nos últimos 10 anos, e com um lugar perfeitamente definido no espectro ideológico, o que permite, evidentemente, a fixação do seu eleitorado de uma maneira que seria impossível a um partido como o PRD. Acrescentam as patranhas e os mitos sempre repetidos e sempre desmentidos de eleição para eleição, os de que o eleitorado do Bloco é "flutuante", "inconstante", "jovem",  quiçá querendo dizer que os eleitores do BE são um monte de freaks que fumam ganza e não sabem bem o que fazem, ou miúdos que saíram agora da escola, coitadinhos, ou os restos dos líricos de 74-75. Ou, com um ar mais grave e analítico, juram para quem os quiser ouvir que o partido "não tem bases", "não tem implantação" ou "tem poucos militantes", por mais que a realidade desminta qualquer uma destas mentiras. Estes comentadores, movidos pelo seu ódio ao BE, que sabem ser o grande factor de novidade da política portuguesa, e a grande ameaça ao status quo instalado da "alternância democrática", tomam, como disse, os seus desejos por realidades, porque tem medo do Bloco. Tem medo que o Bloco chegue ao poder e estrague o arranjinho politico-constitucional de 1975; tem medo que o Bloco provoque uma verdadeira inflexão do panorama político à esquerda, porque o Bloco, ao contrário do PCP, um partido instalado nos seus feudos, ambiciona crescer, quer o poder, quer alterar o status quo onde estes comentadores se sentem como peixes na água, já que o sistema os tem tratado bem nos últimos 30 anos.
O que conforta é saber como estes vampiros se enganam. É que o Bloco de Esquerda, sabemo-lo bem, não é nenhum PRD. O lugar que ocupa corresponde ao posicionamento político de centenas de milhar de portugueses, que estão à esquerda do PS mas rejeitam os tiques autoritários, anti-democráticos, burocráticos e controleiros do PCP. É a esquerda democrática em Portugal: verdadeiramente esquerda, e verdadeiramente democrática. Quer trabalhar também em formas outras de modificar as relações sociais e económicas, e aprofundar a democracia, a participação e a cidadania, rejeitar e revolucionar o modo de vida capitalista, mas sabe que é essencial que este projecto político-social esteja representado no parlamento de uma maneira forte, e não rejeite chegar ao poder por via eleitoral (porque não? Desde que não renegue os seus princípios, isso significaria uma mudança evidente nas relações de poder neste país). Houve erros estratégicos nos últimos tempos, sim, e devem ser discutidos, com certeza, e se calhar pela primeira vez o Bloco vai perder votos nas legislativas, pois é bem possível. São dores de crescimento. Mas aqueles que sonham com a implosão do BE, sonham acordados, e se confundem de modo tão espúrio os seus desejos com a realidade, então para que servirão esses analistas? Mais uma vez a realidade, na forma de eleições, irá desmentir os sonhos húmidos destas luminárias, e acordá-los para a dura verdade: o Bloco de Esquerda veio para ficar, é melhor contarem com ele.

P.S: Alguns amigos, de que o efémero colaborador deste blogue Luís Palácios é exemplo, sabem que eu costumava dizer que ponderaria juntar-me ao Bloco no dia em que as coisas começassem a correr mal pela primeira vez. Talvez seja este o momento.

sexta-feira, 21 de janeiro de 2011

Porque vou votar em Manuel Alegre

Esta é uma declaração de voto a contragosto. Somando erro atrás de erro, Manuel Alegre perdeu muito do capital político e de esperança que uma figura com a sua, que pertence aquela pequena parte do PS com que vale a pena fazer pontes, certamente não merecia. Hoje por hoje toda a gente já percebeu o erro crasso que foi trabalhar para o apoio envenenado do PS de Sócrates. O próprio Bloco de Esquerda, o partido em que costumo votar nas legislativas, vai pagar caro (já está a pagar com algumas dissensões) a contradição que é estar a apoiar um candidato que, nesta campanha, anda a jogar um perigoso jogo do equilibrista, procurando agradar à esquerda sem comprometer o centro. Mesmo a campanha, em si, é uma desilusão, sem chama, sem rumo (o jogo do equilíbrio), e deixando transparecer uma imagem de solidão. Posto isto: vou votar Manuel Alegre. Por duas razões, que se mantém absolutamente válidas: primeiro, porque como a direita pura e dura percebeu muito bem, mas a esquerda mais "radical" parece incapaz de compreender, o verdadeiro candidato de Sócrates não é Alegre, mas Cavaco. Ou será que todo o processo inquinado que levou a um apoio tardio e com ares de forçado, ou a ausência da máquina-PS na campanha, são meras coincidências? A previsível derrota de Alegre vai também, como a direita pura e dura igualmente percebeu, dar uma machadada na ala esquerda do PS, e acabar com veleidades "secessionistas" e de aproximação ao BE, o que interessa a Sócrates e aos seus, e a mais ninguém. Segundo, porque se não vejo grandes diferenças para Sócrates entre ter Alegre ou Cavaco na presidência, já com um possível governo Passos Coelho tudo será diferente. Passos, Cavaco e o FMI: eis a tríade para destruir de vez o estado social em Portugal, e fazer-nos ainda ter saudades dos anos negros de Sócrates.
Pelos motivos que apresentei, preparo-me para engolir um sapo e depositar o meu voto num candidato que pouco me entusiasma. Mas fá-lo-ei sem remorsos: a política é, também mas não só, a arte do possível. Evitar a reeleição de Cavaco deve ser visto como um dever de cidadania para todos os que ainda acreditam num país solidário e livre, e nas funções sociais do Estado. É com muita pena que vejo que alguns não tem noção do facto de este ser um momento paradigmático e crucial para Portugal; preparam-se hoje as condições finais para o derradeiro ataque ao que resta do 25 de Abril, e para trocarmos o estado social pela selvajaria neoliberal. E é com alguma revolta que assisto a uma certa extrema-esquerda atacar todos os dias Alegre mas nunca Cavaco, trabalhando activamente para a vitória da direita, provando mais uma vez, se preciso fosse, que o seu papel actual na história define-se em uma palavra: reaccionário.