sábado, 24 de dezembro de 2005

Ladaínha dos Póstumos Natais...

Há-de vir um Natal e será o primeiro
em que se veja à mesa o meu lugar vazio

Há-de vir um Natal e será o primeiro
em que hão-de me lembrar de modo menos nítido

Há-de vir um Natal e será o primeiro
em que só uma voz me evoque a sós consigo

Há-de vir um Natal e será o primeiro
em que não viva já ninguém meu conhecido

Há-de vir um Natal e será o primeiro
em que nem vivo esteja um verso deste livro

Há-de vir um Natal e será o primeiro
em que terei de novo o Nada a sós comigo

Há-de vir um Natal e será o primeiro
em que nem o Natal terá qualquer sentido

Há-de vir um Natal e será o primeiro
em que o Nada retome a cor do Infinito
*
David Mourão-Ferreira, in “Cancioneiro de Natal“

1 comentário:

Anónimo disse...

David Mourão-Ferreira foi um grande poeta e homem de cultura. A beleza deste poema leva-nos para a insignificância de muitos dos nossos quotidianos, enrolados em situações sem interesse e preocupados com aspectos da vida pouco relevantes. Daí a mensagem ser: viver a vida da melhor forma possível e pôr de lado o supérfluo. Bom Natal e Bom Ano.