Nem de propósito, como que para ilustrar o meu post anterior, o blasfemo jcd escreve um post revelador. Nele se retoma polémica antiga sobre o papel de Milton Friedman, guru do ultraliberalismo, e dos seus "Chicago Boys", na definição da política económica do Chile de Pinochet. Como estes "ultraliberais" ou "neo-liberais" são quasi-anarco-capitalistas, temos aqui matéria para perceber o que escrevi. Para o jcd o Chile da ditadura é um caso de sucesso; isto porque, independentemente das perseguições, torturas e mortes, transformou-se numa economia capitalista moderna. Aqui está, preto no branco, um exemplo da definição que se tem de liberdade. Inclusivé, acrescenta, o golpe é justificado porque Allende, embora democraticamente eleito, em 3 anos destruiu a economia. Na mouche!
Sobre este tema recomenda-se a série de posts que o João Pinto e Castro publica no bl-g- -xs-t-, que inclui um artigo de Greg Grandin sobre o papel de Friedman e Hayek no Chile de Pinochet, e este post opinativo final do autor, o qual, aliás, é o que origina a resposta do jcd.
4 comentários:
Ó André, tanto diaparate.
1. "Milton Friedman e os 'seus' Chicago Boys.
Os seus? Os Chicago Boys eram chilenos que tinham estudado em Chicago e foram eles que tomaram as rédeas da política económica chilena. Quem o lê pode ficar a pensar que está a falar de assessores de Friedman.
2. "Milton Friedman, guru do ultraliberalismo."
Imagino o que chamará aos economistas austríacos.
3. "Como estes "ultraliberais" ou "neo-liberais" são quasi-anarco-capitalistas"
Friedman, anarco-capitalista, eheheh. Ó André, sabe mesmo do que é que está a falar?
4. "Para o jcd o Chile da ditadura é um caso de sucesso;"
Para o jcd nenhuma ditadura é um caso de sucesso, por definição. O desenvolvimento económico do Chile nos anos 80 e 90 é que é um caso de sucesso. Para o jcd e para toda a gente que queira ver. E de tanto sucesso que a ditadura foi-se e chegou a democracia.
5. «isto porque, independentemente das perseguições, torturas e mortes, transformou-se numa economia capitalista moderna. Aqui está, preto no branco, um exemplo da definição que se tem de liberdade.»
Isso é uma constatação. Apesar das perseguições, torturas e mortes, o Chile transformou-se numa economia capitalista moderna, o que arrastou a democracia e foi o país de maior crescimento em toda a América Latina nos anos 80 e 90. O que é um facto histórico têm a ver com a definição de liberdade? Quer reescrever a história para contar uma história diferente?
6. «Inclusivé, acrescenta, o golpe é justificado porque Allende, embora democraticamente eleito, em 3 anos destruiu a economia. Na mouche!»
André, isso é mentira, porque em lado nenhum escrevi que o golpe é justificado. O que escrevi, e é verdade, é que Allende destruiu a economia. E talvez por isso, tantos chilenos suportaram Pinochet por tanto tempo.
Compreendo que para quem defende o que o André costuma defender, seja muito incómodo que a economia do Chile tenha sido um sucesso e as experiências da economia socialista, por exemplo, da também latina Cuba, a tragédia que todos conhecemos, para mais com um número de vítimas significativamente superior.
Fiquei agora a saber que o André apluade a lei de Helms-Burton e o 'embargo' e que o Amorim é um filho de mãe porque está a tentar desenvolver Cuba, investindo em Varadero. Coerentemente, só pode defender isso. Quem colabora com regimes que perseguiram, torturaram e mataram, não pode ser boa gente porque os fins não justificam os meios.
Espero que nunca tenha ido de férias a Cuba. tal viagem, para si, seria muito censurável.
Caro jcd:
Primeiro, acho que não leu o meu post anterior. Este post deve ser relacionado com esse.
Quanto ao seu comentário, vou responder em duas partes, porque tem aspectos interessantes e outros que só se esplicam por querer ler no que eu escrevi coisas que eu não disse.
Começando por estes últimos: concerteza que os Chicago Boys não eram assessores de Friedman. Foram, no entanto, alunos dele. Eram seguidores dele. O próprio Friedman os assessorou. What's the big deal?
Sinceramente, as diferenças que encontro entre Friedman e os austriacos são acessórias.
Agora a parte que interessa: o jcd, se reparar bem, verá que eu não disse que o Friedman é anarco-capitalista. Disse que ele é o papa dos ultraliberais, e que estes são quasi-anarco-capitalistas. Ora, isto é interessante porque é uma reacção psicológica: compreendo que seja dificil aos ultraliberais aceitar como estão próximos ideololgicamente de uma teoria tão desacreditada e mesmo ridicularizada: faz cair a capa séria e académica e revela o radicalismo ideologista (quase religioso, como já apontei várias vezes) que vos subjaz. Mas agora desafio-o a sí, jcd, a apontar-me diferenças substanciais.
A questão do Chile, especificamente, é muito interessante para demonstrar certos mitos. Diz o jcd que o Allende arruinou o país em 3 anos e que foi por isso que os chilenos "suportaram" o Pinochet durante tanto tempo. Engraçado. Eu pensava que o Allende tinha sido derrubado por um coup com apoio americano, não por ter arruinado seja o que for, mas porque defendia nacionalizações, expropriações e queria romper com os EUA. Fico a saber que, afinal, o golpe de Pinochet acontece por causa da ruína do país, o que o torna um patriota movido das melhores intenções. Pela lógica, deverá ter sido apoiado, aclamado nas ruas, como salvador do caos económico em que o país caiu. Eu por acaso pensava que não tinha sido assim, que ao golpe tinha-se sucedido uma repressão terrível, que tinha sido instaurado o recolher obrigatório, a censura da imprensa, etc. Mas devo estar enganado.
Também devo estar enganado quando pensava que quem tinha arruinado o país não era o Allende mas o próprio Pinochet nos primeiros anos da ditadura, e que tinha sido por isso que tinha chamado, um bocado contra-vontade, afinal o homem não era bem um liberal, os Chicago Boys. Mas devo estar, mais uma vez, enganado.
E folgo em saber que o jcd é contra todas as ditaduras. Só acho curioso que vcs, os "ultra" ou "neo" liberais, estejam sempre tão dispostos a encontrar aspectos positivos de extraordinária relevância em ditaduras como a do Pinochet (p. ex., "salvar o país da bancarrota") e aspectos dramáticos em democracias governadas pela Esquerda como no caso do Allende (p. ex., "levar o país à bancarrota"). Eu, pelo meu lado, não sofro desse mal, nem do seu oposto, pelo que o exemplo de Cuba, para mim, é irrelevante. Mas saiba que para mim, mesmo que o Allende estivesse a levar o país à bancarrota, o que carece de prova, isso nunca seria justificação para o que se seguiu.
Mas o mais interessante deste seu comentário é esta parte: «O desenvolvimento económico do Chile nos anos 80 e 90 é que é um caso de sucesso(...). E de tanto sucesso que a ditadura foi-se e chegou a democracia.». Isto de facto é que é revelador do modo religioso como vcs encaram o capitalismo. Não há maneira de perceberem que o capitalismo e a democracia não são a mesma coisa, que um não leva necessariamente ao outro, e que abundam os exemplos no mundo que o provam. Além disso, como é habitual nos neo-liberais, ignoram por completo a dimensão histórica e política: se há mercado, há-de haver, mais cedo ou mais tarde, uma democracia. A fase histórica em que se está, com as suas condicionantes políticas, sociológicas, etc., é um pormenor, se tanto. Genial! Podemos acabar de uma vez com a cadeira de Filosofia Política, aliás, com o curso de Ciência Política por inteiro, e mandar os miúdos para Economia, que tem as respostas todas.
Devo-lhe apenas referir, para finalizar, que não sou eu, de certeza, que tenho telhados de vidro quanto a apoiar ditaduras. Se não apoio a resolução Helms-Burton é porque a acho perniciosa e irrelevante, senão mesmo contraproducente. Eu compreendo perfeitamente que os Chicago Boys, como chilenos, pretendessem, como "técnicos", simplesmente a recuperação do seu país, e compreendo até que Friedman os pudesse auxiliar, também como "técnico". Mas o que não compreendo são certas afirmações de Friedman e Hayek, p. ex., que você sabe muito bem quais são, a respeito desta questão do Chile. E por aqui me fico, que isto já vai longo.
Ou andré olha aqui esta artigo
http://dn.sapo.pt/2006/11/28/economia/salarios_recebem_a_menor_parcela_pib.html
LC
JCD, você vai gostar do blog.
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