terça-feira, 21 de novembro de 2006

Da capital do Império

Olá,
Desculpem o atraso mas estou ainda a recuperar das eleições ganhas pelos gajos da quadrilha da Lucky Pelosi. Como se previa e para usar a analogia do “underworld” de Los Angeles (a que eu chamo de Terra do LA LA LA) os Crips bateram os Bloods
Agora estamos todos à espera de Godot que aqui nos States é conhecido pelo nome de James Baker, o “consiglieri” da família Bush, transformado em D. Sebastião que vai salvar o vosso “schadenfreund” americano dos Mujahidin Sem Fronteiras.
Tenho a dizer que eu gosto das eleições americanas que se prolongam por meses sem fim, custam massa a granel e em que à medida que a data da votação se aproxima se transformam com cada vez mais intensidade num jogo de insultos pessoais impensável aí do outro lado do charco.
É bacano. Anúncios da televisão em que um candidato é acusado de ser mentiroso, é respondido com outro anúncios acusando o acusador de ser amigo de prostitutas e gangsters ou, horror dos horrores ter ido a festas de homossexuais. Imaginem isso aí na Lusitânia …. com o que se diz do Sócrates e do Portas.
Jornais na Geórgia noticiaram por exemplo que um candidato (Harold Ford) tinha em tempos ido a uma festa da revista Playboy e logo de seguida apareceu um anúncio com um gaja com aspecto de pêga, ombros nus a piscar o o olho e a dizer “Harold Ford! Estou à tua espera”.
Outro dos meus favoritos foi aquele em que uma voz funda dizia “Brad Miller paga para sexo mas não quer pagar para dar coletes de protecção aos nossos soldados”, uma referência ao facto de Miller ter sido acusado de pagar por prostitutas mas ter votado contra o aumento de gastos no orçamento de defesa. Gramei à brava, assim como aquele em que se mostrava o candidato Michael Steele a abraçar George Bush e uma voz com tom irónico dizia “Micahel Steel ama George Bush”, dando ênfase à palavra “ama”. Nos tempos que correm isso foi pior do que acusar Steele de ir às putas.
Aparte isso tenho a dizer que estou chateado porque o Rumsfeld se vai embora. Os seus briefings eram a coisa mais popular entre jornalistas e não só. As cadeias de televisão dizem que sempre que o Rumy falava os ratings subiam. O Rumy (como a malta dos jornais o conhece) não queria necessariamente ser controverso mas, ao contrário do que é normal entre políticos, não tinha medo de ser impopular. Devia ser da idade. Mas isso tornou-o popular e controverso. Como ele próprio gostava de dizer: Coisas da vida. Claro que se pode afirmar que o Rumsfeld é também prova que o perigo existe não quando os estadistas não podem viver de acordo com os seus princípios, mas sim quando o podem fazer.
Mas de qualquer modo o seu modo de responder a perguntas com perguntas retóricas, o seu uso de expressões do tempo dos nossos avós, faziam com que os jornalistas (e não só) vissem Ramy como um tio-avô onde se ia todas as semanas para uma lição de gramática, filosofia, retórica e o ocasional esbofeteamento verbal, uma mistura de arrogância e de palavreado de tio-avô sem igual.
É agora parte da mitologia do Pentágono em como Rumsfeld mandou um destacado oficial redigir dez vezes o mesmo memorando porque todas as vezes que o recebeu detectou erros de gramática. As “regras Rumsfeld” – uma série de princípios adoptados ao longo da sua vida – tornaram -se se num enorme sucesso na internet, entre as quais o conselho para ninguém se sentir enfatuado ou insultado pela imprensa que “é um facto da vida”
Vocês podem não acreditar nisto mas houve uma altura em que Rumsfeld tinha a imagem de uma estrela de rock e mesmo de “sex symbol”. Até chávenas de café se venderam com a foto do Rumsfeld a afirmar “ não quero perguntas idiotas antes do café”. Isto depois de numa conferência de imprensa quando todos começaram a gritar perguntas o Rumy respondeu: “Calma, calma. Que diabo, eu sou um velho, é muito cedo de manhã e ainda estou a tentar pôr a cabeça em ordem”.
Lembro-me de um briefing em que o Rumsfeld respondeu quando interrogado sobre uma noticia citando “fontes no pentágono”: “O Pentágono é grande. Centenas e centenas, milhares de pessoas. Quem são essas pessoas? Ninguém sabe. É um mistério. A vida é assim”
E quando pressionado a responder ao facto do “mundo” não apoiar a invasão do Iraque:
“Um, dois ou três países levantaram-se e manifestaram a sua oposição. E por razões que desconheço isso é considerado o mundo por alguns de vocês”
“Há unanimidade? Não. Havia alguém que esperava unanimidade? Não. A vida não é assim,” respondeu ele antes da invasão do Iraque.
E quando se tornou claro que não havia armas de destruição em massa: “A ausência de provas não é prova de ausência”
“Você havia de gostar da minha mulher. Quando me pede para ser “breve” está-me a impôr limites,” outra das respostas do Rumy.
Tenho que vos dizer que eu comecei a gostar do Rumsfeld quando ele irritou o snob do Villepin ao dizer que a França era parte da “velha Europa”. Na altura bem me recordo que um jornalista francês disse-me que o Rumsfeld deveria ter acrescentado … “e Paris é o museu”. Não sei se isso era insulto ou elogio mas fiquei com a impressão obvia que esse francês não gostava de Paris.
Não sei se o Villepin vai sentir a fatal do Rumsfeld quando sair do governo para se dedicar a ler poesia dos Taliban nos “salons” de Paris para agradar aos jovens revoltados dos “banlieus”. Sei de certeza que quem vai sentir a falta do Rumsfeld é o Paulo Portas. O Rumsfeld gostava dele. Lembro-me de ver os dois a trocarem presentes quando o Portas veio como aqui como ministro da Defesa. As minhas notas indicam que a 18 de Junho de 2002 Rumsfeld recordou que tanto ele como Portas tinham sido eleitos para as legislaturas dos respectivos países “com pouco mais de 30 anos”.
Depois recordou que tanto ele como Portas tinham sido nomeados para as respectivas pastas de defesa “com pouco mais de 40 anos” (Rumsfeld pela primeira vez)
“Para vocês mais jovens estou a avisar-vos. Pode ser que vocês voltem a ver este homem (o Portas) de volta aqui em 2030”. Só isto deve ser suficiente para irritar muita gente ai na Lusitânia, mas o Portas, esse… gostou. Eu vi-o a sorrir.

Um abraço

Da Capital do Império

Jota Esse Erre

4 comentários:

Anónimo disse...

Ahahahahaha...
O JotaEsseErre é mesmo bom!
Do coração e da escrita.
"Americanices" são com ele.
"Titio... dá bombom"...
"Africanices"... fôôôdá-se!
P´rá rima,
com Rita,
(a minha querida prima)
já basta a escrita!!!
Ahahahahahhah...

Anónimo disse...

Mais um texto muito bom do JSR. Textos como devem ser: escritos com o sangue, como dizia o Nietzsche. De quem vive e quer... estar por dentro das coisas. Nós na Velha Europa gostamos da tridimensionalidade dos textos da Maureen e das reportagens inolvidáveis de Seymour Hersch da N. Yorker. Tudo porque falta tempo para ler mais, a Atlantic Review ou a New Quartely, entre outras. Como já todos perceberam, eu sou mais francófono e devoro tudo que me aparece pela frente,do LÉxpress ou Nouvel.Obs. às revistas de Sensação e Glamour, de que a Vogue é um must incrível de snobice e charme a n- megaorgasmos por página. Papívoro, pois, e lamento que a Globe tenha desaparecido pela doença e morte desse feiticeiro genial mefistofélico chamado François Mitterrand, primo de Isabel II de Inglaterra. Vamos ver o que nos aporta o futuro, que é já amanhã!!! FAR

Anónimo disse...

Mais um texto muito bom do JSR. Textos como devem ser: escritos com o sangue, como dizia o Nietzsche. De quem vive e quer... estar por dentro das coisas. Nós na Velha Europa gostamos da tridimensionalidade dos textos da Maureen e das reportagens inolvidáveis de Seymour Hersch da N. Yorker. Tudo porque falta tempo para ler mais, a Atlantic Review ou a New Quartely, entre outras. Como já todos perceberam, eu sou mais francófono e devoro tudo que me aparece pela frente,do LÉxpress ou Nouvel.Obs. às revistas de Sensação e Glamour, de que a Vogue é um must incrível de snobice e charme a n- megaorgasmos por página. Papívoro, pois, e lamento que a Globe tenha desaparecido pela doença e morte desse feiticeiro genial mefistofélico chamado François Mitterrand, primo de Isabel II de Inglaterra. Vamos ver o que nos aporta o futuro, que é já amanhã!!! FAR

Anónimo disse...

Na sequência do que diz JSR, eu já me tinha esquecido- da biblioteca tentei enviar um post...- logo no dia do texto,claro- de sublinhar o alto merecimento pela personalidade fora-de-série de Rumsfeld, de quem os alemães da Alemanha são tão orgulhosos... No princípio da guerra e invasão do Iraque, desencadearam-se os protestos de meio Mundo. Um dos mais fortes proveio de Norman Mailer, que atacava forte e feio o GW Bush, no início da tarimba presidencial. Disse Mailer que Rumsfeld é que teria dado um presidente a sério pela sua craveira intelectual ser muito acima da média já habitual dos títeres que dominam os partidos, se não fosse o seu feitio intratável, e etc e tal. Chegando ao ponto de atirar no WB como um pobre homúnculo que nem sabe falar...e não iria durar muito tempo, por causa disso tudo. FAR