Que palavras, as do mais crescido…
O saber da passagem de tudo, de quanto não foi semi-agarrado mas antes cuspido, adiado, ignorado, como se voltasse a acontecer de novo ininterruptamente. Ter tido a cabaça com água e ter encolhido os ombros em pretensioso desapego, em frívola atenção e inadequado agradecimento. O ter vivido tanto tempo sem os olhos de dentro escancarados!!!
De repente sofre-se uma fuga que parece que vem de fora, tudo o que está para além de nós parece que quer entrar e ficar.
Dói-me um olho e os pensamentos enclausurados que se arrastam discretamente como aves fechadas no céu. Parece que tenho um corpo próprio com uma vontade que não é necessariamente a minha. As veias salientes nas costas das mãos, consigo-as arrancar do seu relevo ao elevar os braços para as nuvens. O que me custa mais é o não puder fazer uma revolução em relação ao fim dos dias. O emagrecido tempo angustia-me, a vida a não puder ser empurrada mais para lá, parecido o gesto a um objecto afável.
Continua a doer-me o onde guardo tudo. Já são tantas coisas que as não acho pela ordem em que as vivi, vão-me espreitando qual vizinho curioso, que se mudou sem destino para a casa da frente que nunca existiu.
Vou entendendo, é gradual e nem sequer está relacionado com a verdade, apenas com a paisagem que vai sendo, se chove ou não... Temo pela hora seguinte, talvez tudo se torne diferente de repente, basta acontecer algo com intensidade para a vida já nunca mais ir pelos mesmos ideais. Uma ideia repetitiva a invadir o cérebro é um nevoeiro para sempre. Isto já é tão antigo, os meus filhos há sessenta anos, também me provocavam a terrível sensação de que eram temporários, que em breve mais do que escolherem os seus caminhos seriam o mesmo que nada. Levantava-me de madrugada para os ouvir respirar tal como se vai ouvir o mar para se não morrer.
Pode-se viver com isto a correr nos olhos com que se vê a suposta realidade.
Hoje em dia as casas são pequenos aglomerados de sensações com acessórios dispensáveis.
Vive-se como uma galinha que olha ternamente o seu ovo e percebe nele uma omelete.
1 comentário:
Essa galinha entrava no "Império dos Sentidos" de Nagisha Oshima? Ou é uma metáfora para designar Paula Rego?
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