Vamos proteger os dias contra o desgaste
dos dias, a invasão do medo e a dissociação das coisas
repetidas. É preciso, excessivamente, promover
a comunicação do grande e do pequeno tempo,
convidar o imprevisto e o rosto inicial. Dispensaremos
os especialistas da evocação, os funcionários
que administram os lugares e comemoram o eterno.
Vamos antes recriá-lo todos nós para além
do espaço dos templos, teatros,
estádios, nadar no rio elástico
dos gestos e das vozes. É preciso
virar o forro as palavras, deixar que fervam
nelas a alegria e o vigor dos risos, recuperar o jogo livre onde, a arder,
foram pronunciadas as primeiras regras
e deixar circular o amor, como um vinho, entre os lábios,
abrir os dedos, trocar as almas, emprestar os rostos
confundir as vozes no canto unânime e completo,
pegar fogo ao corpo dançando uns para os outros
nosso único público, hospedados no êxtase
e no possível, para explicarmos com palavras e corpos
o excesso e as fronteiras, a terra e o céu
a luz e a sombra, a vida e a morte.
Vítor Matos e Sá. 1968
Sem comentários:
Enviar um comentário