Olá,
Hoje vai uma carta fora do normal que sei que vai irritar muitos dos multilatis que há por aí. (Multilati: Pessoa que acredita que o multilateralismo resolve todos os problemas do mundo e que as instituições internacionais são melhores a resolver problemas que os povos soberanos de qualquer país).
E para esse efeito começo por vos fazer duas perguntas: Quem sabe mais sobre as realidades do Uganda? Yowerri Musseveni ou o Juiz Philippe Kirch do Canadá sentado no seu escritório do Tribunal Penal Internacional na gentil e civilizada Haia?
Quem tem mais em conta as prioridades do povo ugandês? O Arcebispo ugandês John Baptist Odama e o chefe David Onen ou o procurador espanhol do dito tribunal Luís Moreno Ocampo atarefado de trabalho no seu escritório em Haia?
Faço estas perguntas porque na semana passada mantive aqui uma conversa com um amigo ugandês que embora ele próprio seja um multilati (os ugandeses não têm outra opção) está agora perante um dilema que de repente pôs em causa todo o apoio que deu em tempos ao tão famoso Tribunal Penal Internacional que foi entusiasticamente apoiado aí do outro lado da poça e a que, como vocês se recordam, os Estados Unidos (e não só) se opuseram. Vocês lembram-se que a recusa do Bush em aceitar o dito tribunal provocou aí uma crise de Bushite aguda com tudo aos berros e aos gritos… foi o fim da macacada ou como dizem os imigrantes tugas “the end of monkeyness” mas não do tribunal.
Pois o meu amigo ugandês estava visivelmente irritado não por causa do Bush mas porque o espanhol Luis Moreno Ocampo tinha feito uma declaração a dizer que o Uganda “têm a obrigação de aplicar o mandato internacional de detenção que pende sobre o líder rebelde Joseph Koni”.
Há que dizer que todos nós concordamos que o “combatente da liberdade” Koni é prova viva que a inevitabilidade do progresso e civilização é um mito e que este líder do “Exército da Libertação do Senhor” é directa ou indirectamente responsável por crimes horrorosos que fazem concorrência séria aos Mujahedin Sem Fronteiras no Iraque com as suas degolações ao vivo na internet, bombas em mercados e mesquitas, fuzilamento de professores e médicos etc.
Mas acontece que aproveitando o facto do Sudão já não querer dar apoio a Koni o governo do Presidente Musseveni decidiu iniciar discussões com o tal “Exército de Libertação do Senhor” para pôr termo às suas actividades no norte do Uganda que nos últimos anos custaram a vida a milhares de ugandeses.
Para incentivar Koni e os seus “combatentes da liberdade” a acabarem com a guerra Musseveni ofereceu-lhes uma amnistia. E para isso conta com o apoio de David Onen chefe da etnia Acholi que mais tem sofrido na guerra e do influente arcebispo John Baptis Odama que conhece a região afectada como a palma das suas mãos.
O Tribunal Penal Internacional é que não gostou nada da ideia. Há um mandato de captura emitido pelo Señor Moreno Ocampo cujo emprego em Haia e as ajudas de custo dependem claro está de lhe darem credibilidade. Pelo que o tribunal foi rápido em afirmar que quaisquer que sejam as decisões do Uganda e do seu processo de paz o tribunal “tem um mandato” pelo que o mandato de procura do Koni mantêm-se quer os ugandeses gostem ou não (Isto claro está dito em modos diplomáticos e no meio de muito vocabulário jurídico que ninguém entende, nem mesmo os multilatis.)
O chefe Onen não concorda e diz que o tribunal deve respeitar o desejo do seu povo alcançar a paz a qualquer preço.
O meu amigo ugandês está furioso e diz que “a mãe do Senor Ocampo não vive num campo de deslocados” e acrescenta que “somos nós e não ele que temos que lidar com as realidades e viver no mundo real”. O que é verdade.
Os burocratas do tribunal argumentam que Koni está apenas a tentar comprar tempo. Pode ser verdade. Mas se não for? Quem tem poderes de decidir sobre a justiça no Uganda. O Señor Moreno Ocampo no seu escritório em Haia ou os ugandeses? Quem tem poderes para decidir o futuro de Koni? O juiz Philippe Kirsch ou as autoridades político/jurídicas ugandesas eleitas pelos ugandeses?
E isso levanta outras questões: Perante quem respondem Moreno Ocampo ou Kirsch? Perante a ONU? Se sim, o que é a ONU?
Outra pergunta: O tal “mandato” a que o Senõr Moreno Ocampo se refere é mais importante que o mandato de Musseveni?
Pode o tão querido tribunal dos multilatis decidir-se por exemplo a levar a tribunal o Frederick de Klerk ou o PW Botha por “crimes de apartheid” se o Mandela e os sul-africanos decidiram já que “águas passadas não movem moinhos”?
Ou pode o tribunal internacional julgar Pinochet se o processo jurídico de um Chile democrático disser que não?
Ou pode o Senor Moreno Ocampo indiciar o Joaquim Chissano, e o Armando Guebuza por terem fuzilado o Urias Simango e a Joana Simião se os acordos de paz com a Renamo “amnistiam” na prática todos os crimes cometidos durante o PREC pelas duas partes e há agora uma democracia em Moçambique?
Pelos vistos e a julgar pela sua reacção ao Uganda o Senõr Moreno Ocampo obviamente acredita que sim que tem um “mandato” para tal e que o Tribunal Penal Internacional está acima do direito de cada nação. Julga portanto pelos vistos que o direito internacional (que requer definição) se sobrepõe ao direito nacional.
Eu cá vou pelo que diz o Arcebispo John Baptist Odama que sendo um apoiante do conceito de um tribunal internacional diz haver a possibilidade de “algo de bom sair deste processo (de negociações) pelo que as ameaças do tribunal não são nada de bom”.
“É uma boa altura para o tribunal calar a boca,” disse o Arcebispo.
E eu respondo: Ámen.
Da capital do Império (onde os multilatis não são muito populares)
Um abraço,
Jota Esse Erre
2 comentários:
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