segunda-feira, 20 de fevereiro de 2006

domingo, 19 de fevereiro de 2006

Funcionários viram polícias de secretaria

António Costa quer aumentar o investimento nas Forças de Segurança e diminuir a despesa com o pessoal. Segundo o ministro, 85% do orçamento do Ministério da Administração Interna vai para a GNR e PSP e, deste, 95% é gasto com pessoal. Só os 5% que sobram vão para investimento. Por isso, na reestruturação do conjunto das forças policiais e de segurança vai deslocar funcionários públicos excedentários para as secretarias das esquadras, que vão substituir os agentes que lá exercem funções. Saiba a razão desta medida AQUI.

sábado, 18 de fevereiro de 2006

O TIPO DA JANELA EM FRENTE

Podem não ver o que vejo e daí, onde estais, arreganhar o dente céptico e não crer, tal como o outro, mas o tipo da janela da varanda em frente está em actividade permanente. E o que é estranho é que o vejo sempre dobrado, olhos no chão – olhos que nem pressinto, pois nunca vêem na minha direcção -, e a vassoura em movimento contínuo, o cabo a surgir como um periscópio, esse sim visando-me. Parece-me uma ilustração animada da lei da inércia. Algum deus grego o castigou e ele cumpre eterna pena, tipo mito de Sísifo, mas menos cruel, aqui caindo eternamente um pó quase afectuoso para um chão que assim nunca se acaba de limpar. Ainda não percebi se é o chão, esse sistema de acumulação de toda a porcaria que este Ajax doméstico quer preparar para a comunhão solene, se a criatura é marreca e tem portanto de dobrar a espinha por azares da vida que não descobrirei, pois a minha démarche não entrará pelos caminhos do detective privado.
O que me atrai não é o facto de o tipo ser eventualmente marreco e por isso se dedicar àquela actividade, condenado a uma posição contra picada, e portanto aproveitando a boleia da sua deformidade, menos ainda o facto de, não sendo marreco, passar o dia de cerviz dobrada a expulsar o povo das bactérias do horizonte pés, o que virá mais da cabeça que da espinha.
O que me atrai é que o sujeito não pára – a não ser escassos momentos de reiniciação ritual - , impelido por qualquer coisa muito funda e que não quero acreditar seja o ter caído, em pequenino, no pacote do OMO.
A coisa parece-me tão estranha que me tornei olheiro de um único jogador da vida, pois trata-se certamente de um sujeito desse género, absolutamente dedicado a uma paixão exclusiva – ele há coleccionadores até de pintelhos tosquiados, estão a ver o João César?
Não me acusem de invadir a privacidade de ninguém, o que é que faz a televisão, vinte e quatro horas por dia? Não só invade como ocupa, potência neocolonial planetária que é. E não só impõe uma dependência patológica, vende um modo de vida disfarçado de vários, assim como destrói a intimidade, essa flor que cresce nos espaços privados e que se alimenta de humidade artesanal ( em vias de extinção como é sabido).
Comprei um binóculo, confesso. Tendo chegado à maturidade creio que posso fazê-lo. É como comprar uma bicicleta da categoria plumas, embora neste caso sejamos nós a entrar pela paisagem dentro. Com o binóculo são obviamente os olhos que pedalam.
Vocês não vão acreditar : a criatura tinha as paredes cheias de fotos de aspiradores, em todas as cores, formatos e marcas, da Hoover à Bosh, passando pela Singer – será que são aspiradores, os da Singer, ou máquinas de tirar bicas, ou mesmo escovas de dentes eléctricas incorporadas na máquina das bicas para uma pré lavagem obrigatória antes da bica?
E assim era, paredes de aspiradores repletas. Todas eles em molduras rectangulares imitando o tamanho real dos aspiradores, plastificadas a ouro velho e ordenadas na parede como um pequeno exército preparando-se para destruir toda a merda planetária – o que só um visionário pode alcançar.
Estou convencido que quando deixo de o ver, isto é, quando deixo de ver a sua cabeça e o cabo da vassoura, a cabeça de um corpo marioneta que pouco passa os limites da parede da janela da varanda da frente, o tipo se senta e olha ternamente para os aspiradores. Esse o momento de carregar a bateria, para replay a coisa no ponto de arranque.
É certamente um fundamentalista, solitário claro, a quem a porcaria até ajuda, espécie de inimigo externo, diabo e personificação do mal, o que lhe dá uma razão para viver. E a todo este amor do pó se pode chamar intimidade de novo tipo.

f.arom

Cartoons: Polémica chega a Moçambique

M a p u t o, 17.02.2006
S A V A N A, semanário independente

Vários muçulmanos moçambicanos manifestaram-se sexta-feira contra a publicação das caricaturas do profeta Maomé no jornal moçambicano Savana, em Maputo. Este protesto inédito em Moçambique, surgiu depois da edição de sexta-feira do semanário ter saído para as bancas e vendas de rua, e muitos muçulmanos se terem confrontado com as polémicas caricaturas nas páginas do jornal. Os desenhos indignaram os sectores mais conservadores e radicais islâmicos da capital moçambicana.
Durante três horas, vários responsáveis da comunidade muçulmana e seus apoiantes, concentraram-se junto às instalações do semanário, para mostrar o seu desagrado pela reprodução dos cartoons. Alguns acabaram por provocar distúrbios, partindo vidros e vasos no pátio do jornal.
O director do jornal, Kok Nam, disse aos líderes muçulmanos que "se quiserem que nós peçamos desculpas tudo bem, pedimos desculpas, mas isso é um acto forçado". No entanto, os líderes muçulmanos presentes no encontro anunciaram de imediato o cancelamento de publicidade no jornal. Não houve de actos de violência a registar.
As caricaturas de Maomé foram publicadas em Setembro passado pelo jornal dinamarquês Jyllands-Posten, mas só nos finais de Janeiro é que a polémica se espalhou nos países árabe e na comunidade islâmica um pouco por todo o mundo.

sexta-feira, 17 de fevereiro de 2006

SEM NADA DE MEU


Ilustração de Ivone Ralha


Dei-me inteiro. Os outros
fazem o mudo (ou crêem
que fazem). Eu sento-me
na cancela, sem nada
de meu e tenho um sorriso
triste e uma gota
e ternura branda no olhar.
Dei-me inteiro. Sobram-me
coração, vísceras e um corpo.
Com isso vou vivendo.

Rui Knopfli

A contradição essencial da poesia

Por Antonin Artaud

" Existe em toda a poesia uma contradição essencial. A poesia, é a multiplicidade dilacerada e que projecta chamas. E a poesia, que restaura a ordem, ressuscita, de início,a desordem, uma desordem com aspectos inflamados; e entrechoca aspectos que reduz para um ponto único: fogo, gesto, sangue, grito.

Projectar a poesia e a ordem num mundo onde a próxima existência é um desafio à ordem, é recuperar a guerra e a permanência da guerra; é recuperar um estado de crueldade aplicada, é suscitar uma anarquia sem nome, a anarquia das coisas e dos aspectos que despertam antes de cairem de novo e de se fundirem na unidade.Mas aquele que desperta esta anarquia perigosa transforma-se sempre na sua primeira vítima ".

( OC. A. Artaud, Héliogabale ou lánarchiste couronné, T.VII )

Copyright FAR

Foto de José Carlos Mexia

Londres, o centro do Tropicalismo

É o maior evento de sempre deste movimento cultural brasileiro. Foi inaugurado ontem, quinta-feira, no cultural Barbican Centre, em Londres. Vai durar até 22 de Maio. Durante três meses, no Festival Tropicália vão acontecer vários concertos, filmes, conferências e exposições de artes plásticas.

Os grandes destaques vão para os principais nomes do movimento: Caetano Veloso, Gilberto Gil, Tom Zé, Gal Costa e Os Mutantes. Este grupo, que inclui Rita Lee, não se junta num palco há mais de 30 anos. Por isso, tem uma hipótese única de os ouver. Eu sei que eles também desejosos de nos ver por aquelas bandas e também sei que não vão perder esta oportunidade. Por isso, já têm viagens marcadas para Londres, onde nos querem brindar com actuações memoráveis.

Em suma, há muita coisa para ver e curtir neste Inverno/Primavera, in London Town. Com passagens ao preço da chuva nos voos Low Cost, que tal pensar em dar lá um salto?
Todas as informações AQUI

quinta-feira, 16 de fevereiro de 2006

Planta de absinto
Jardins de Serralves, Porto, Janeiro de 2006
Fotografia de António Oliveira
*
LA CHANSON DES VIEUX AMANTS
Bien sûr nous eûmes des orages/ Vingt ans d'amour c'est l'amour fort/ Mille fois tu pris ton bagage/Mille fois je pris mon envol/Et chaque meuble se souvient/Dans cette chambre sans berceau/Des éclats des vieilles tempêtes/Plus rien ne ressemblait à rien/Tu avais perdu le goût de l'eau/Et moi celui de la conquête/
*
Mais mon amour/Mon doux mon tendre mon merveilleux amour/De l'aube claire jusqu'à la fin du jour/Je t'aime encore tu sais je t'aime/
*
Mais je sais tous les sortilèges/Tu sais tous mes envoûtements/Tu m'as gardé de piège en piège/Je fais perdue de temps en temps/Bien sûr tu pris quelques amants/Il fallait bien passer le temp/Il faut bien que le corp exulte/Finalement finalement/Il nous fallut bien du talent/Pour être vieux sans être adultes/
*
0 mon amour/Mon doux mon tendre mon merveilleux amour/De l'aube claire jusqu'à la fin du jour/Je t'aime encore tu sais je t'aime/
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Et plus le temps nous fait cortège/Et plus le temps nous fait tourment/Mais n'est-ce pas le pire piège/Que vivre en paix pour des amants/Bien sûr tu pleures un peu moins tôt/Je me déchire un peu plus tard/Nous protégeons moins nos mystères/On laisse moins faire le hasard/On se méfie du fil de l'eau/Mais c'est toujours la tendre guerre/
*
O mon amour/Mon doux mon tendre mon merveilleux amour/De l'aube claire jusqu'à la fin du jour/Je t'aime encore tu sais je t'aime

quarta-feira, 15 de fevereiro de 2006

Quem tem medo do holocausto?

Não percebo a altitude dos governos ocidentais de se armarem em virgens ofendidas quando o Irão quer por em causa o holocausto. Parece ser um assunto tabu. Não os perturba as guerras religiosas que se travam em diversas partes do mundo, não se sentiram chocados quando se deu o genocídio do Ruanda, em que morreram cerca de um milhão de pessoas, não se incomodam com os milhões de mortos no Sudão, na Libéria, no Haiti, e num sem número de locais em todo o mundo. Mas quando se questiona o holocausto, alto e pára o baile. Assunto intocável. Deve haver mais levantamentos, estudos, análises, estatísticas sobre o holocausto do que muitas guerras passadas, presentes e que ainda estarão para acontecer. Desmontar argumentos que o põem em causa parece não oferecer grandes problemas.
*
Por isso não se percebe que quando a nomenclatura teocrática do Irão questiona o holocausto em retaliação à polémica das caricaturas, os governos ocidentais venham, tipo reflexo condicionado, reagir em fila indiana a condenar quem põe em causa o holocausto. Se alguém viesse dizer que não morreram 21 milhões de soviéticos mas apenas cinco mil, os governos reagiam da mesma forma? Se há inúmeras provas que o holocausto existiu, porquê este exagero? Não é óbvio que tudo isto é apenas uma reacção de um governo autocrático aos factos relacionados com as caricaturas do Jyllands-Posten?
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Por isso a análise tem de ser feita de outra forma. É que o problema não é o holocausto, que só gente pouco séria o põe em causa, mas sim o lobbie judeu em seu pleno funcionamento. Que tem por trás, nada mais, nada menos do que os “nossos aliados norte-americanos”. Ao que parece, os amigos são para as ocasiões. E não venha agora o Pacheco Pereira armado em porta-voz da indignação da direita contra Freitas do Amaral, só porque ele não actuou "by the book", como o lobbie judeu pretendia.
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Pessoalmente não concordo com a gestão desta mini-crise dos cartoons feita pelo ministro dos negócios estrangeiros e muito menos a mea culpa perante os pecados do passado que a história já condenou. Mas calma. Aqui não é o Médio Oriente, nem Lisboa é Tel Aviv. Por isso esta questiúncula entre Pacheco Pereira e Freitas do Amaral, mais parece uma luta de galos de capoeira. É uma trica de indígenas, a pretender mostrar quem tem mais reverência a Israel. Pacheco Pereira vem agora afirmar algo que em termos figurativos é do tipo “a minha circuncisão é mais tradicional que a tua”. Por isso quer Freitas fora do Palácio das Necessidades. Tem graça. Pacheco não se indignou com invasões a países em busca de armas de destruição massiva, cuja acção provocou milhares de mortos e agora incomoda-o Freitas, o Pio? Por favor Pacheco Pereira, quadrature-se.

Heresia das heresias

Não gostei do primeiro comunicado de Freitas. Revelou os seus piores tiques católicos ao defender que "a liberdade de expressão tem limites", designadamente o de não ofender as religiões. Se a liberdade de expressão tem limites não são esses: numa sociedade democrática as religiões estão sujeitas ao mesmo tipo de regras que qualquer outra instituição legítima. Mostrou-nos como, neste tipo de assuntos, os interesses da Igreja Católica são por vezes coincidentes com os dos mullahs. Já quanto a esta declaração:

«O maior agressor temos sido nós. Para já não falar das Cruzadas, que vão longe mas que estão presentes como alguma coisa que se passou anteontem, para já não falar na colonização de África e de vários povos islâmicos e asiáticos, para já não falar da política de canhoneira seguida pela Inglaterra em relação a esses países, veja o que foi a estratégia seguida pela maior potência mundial no mundo árabe neste momento.»

Subscrevo-lhe inteiramente o conteúdo. Freitas formulou com palavras exactas a heresia das heresias no mundo ocidental- reconhecer a nossa responsabilidade, a nossa enorme responsabilidade, no atraso de outros povos, pelo colonialismo que praticámos e pelo neo-colonialismo que continuamos a praticar.

terça-feira, 14 de fevereiro de 2006

E se um blog lhe oferecer uma flor?

"Escrever, é entrar, é penetrar na fonte branca ...."
António Ramos Rosa, in "O Livro da Ignorância", 1988
*
PS. Este post é dedicado a todas as mulheres que visitam o 2+2=5.
O blog pede desculpa pela erecção da flor. Não é costume. Por dois motivos. Primeiro: é de facto uma flor e, por outro lado, deveria comportar-se como tal. Mas devido à solenidade do momento, não se soube controlar. E já agora, um clitóris daquele tamanho, oh la la, é muita fruta.....
No entanto, penso que a rigidez foi involuntária, provocada talvez pela solenidade do momento. As florzinhas na ponta da hastezinha erecta, é outro mistério. Deve ser um milagre do dia dos namorados. Nunca tal tinha acontecido. Às pessoas mais sensíveis e susceptíveis peço que olhem bem para deixarem de o ser. Agradeço desde já a vossa compreensão, mas é a excitação do momento. Ainda por cima, em público. Atenção voyeurs: não se animem muito.
Mas voltando à alegria e ao prazer da flor, vão sendo felizes sempre que puderem, não só no dia de hoje. Sejam rebeldes.

Filme moçambicano vence em Biarritz

O filme moçambicano “O Grande Bazar” recebeu o troféu de prata na secção de ficção, no 19º Festival Internacional de Programas Audiovisuais que se realizou em Biarritz, no sul da França. Realizado pelo cineasta Licínio de Azevedo, a película esteve em competição com mais de 2000 filmes, provenientes de 36 países. Quando, há três anos, o mesmo realizador se apresentou no Festival com “Desobediência”, tornou-se no primeiro filme africano a ser seleccionado para o certame.

O filme decorre num grande mercado africano, e a estória centra-se em dois meninos com vivências diferentes e objectivos opostos. Um procura trabalho para readquirir o que lhe foi roubado e poder um dia voltar para casa. Já o outro não olha a meios para não ter de regressar para junto da família. Gosta da liberdade e da independência. Mas apesar das diferenças e desavenças constantes, juntos enfrentam com coragem um destino adverso.

Lições da História

O Charlie Hebdo é um jornal humorístico francês que resolveu publicar diariamente cartoons de Maomé, "em defesa da liberdade de expressão". O seu director justificou esta decisão dizendo que "quando se mataram pessoas em nome de Maomé não se viram manifestações de rua". Este argumento tem sido repetido ad nauseaum; acontece que é falso. Por exemplo, quando do 11 de Setembro, houve, no mundo islâmico, bastantes manifestações, vigílias, actos espontâneos e organizados de solidariedade com o povo americano. A grande maioria das pessoas demarcou-se, se não da causa, pelo menos do método. Nós, por cá, é que pouco as vimos: a imagem mais repetida foi a de duas jovens palestinianas em celebração, e, sabe-se agora, era uma grosseira falsificação (as imagens tinham um ano). Entretanto, mais de quatro anos depois, com invasões ao Afeganistão e sobretudo ao Iraque pelo meio, é pouco provável que volte a ser assim.
Entretanto, no nosso mundo "ocidental e civilizado", muitos parecem esquecer as lições da História. Ouvem-se opiniões incríveis vindas das pessoas mais insuspeitas. Não será o caso de Vasco Pulido Valente, que diz que os árabes são uns "falhados", ou de Miguel Sousa Tavares, que, como não conhece os cientistas, médicos, desportistas ou músicos árabes, numa formidável manifestação de umbiguismo parte do princípio que eles "não existem". Mas já será o caso de um ilustre comentador neste blogue que se lembra de Beethoven e Chopin! Será possível que não se perceba o desenlace lógico desta linha de raciocínio? "Eles são uns falhados, não acrescentam nada à humanidade, não atingiram o nosso nível superior, e se ainda por cima só causam problemas... Que tal exterminá-los?"

Rushdie foi condenado à morte há 17 anos


A 14 de Fevereiro de 1989, faz portanto hoje 17 anos, o escritor britânico de origem indiana Salman Rushdie foi condenado à morte pelo Ayatollah Khomeiny. O líder iraniano da época considerou que a sua mais recente obra "Os Versículos Satânicos" era blasfema e contrária aos princípios religiosos do Islão. Foi um indício bem visível do novo fundamentalismo islâmico, iniciado com a tomada do poder pelos mullahs e ayatollahs no Irão, algum tempo antes.
Também a 14 de Fevereiro mas de 1821, ou seja, 185 anos antes, o jurista e constitucionalista português Manuel Fernandes Tomás, discursava assim nas Cortes Constituintes, num dia em que o tema era a liberdade de imprensa: "A liberdade de Imprensa traz consigo males, mas os que resultam da censura são mais e maiores. Repugna ser livre sem ter meios de observar a Liberdade".

O mundo sem diferenças

Num livro muito polémico e empolgante, Alain Minc, um dos consultores económicos e políticos mais representativos da França, " O Mundo que se aproxima ", publicado em edição de bolso este mês , compara o fervor de religiosidade múltipla que se vive nos EUA, com os cultos e seitas a influenciarem o aparelho de estado, e a crescente marginalização a que se assiste na Europa das Igrejas, ao mesmo tempo que, e é uma das suas fascinantes teses, confessa admitir que o " ascendente crescente do modelo económico chinês sobre o ocidental irá, ao contrário do que se dizia, alterar a relação de poderes e contra-poderes do seu funcionamento global ". Caminhamos para o que, Thomas Friedman, apelida de ciclo " do pós-pós Guerra Fria ", de imprevisíveis consequências no âmbito das liberdades fundamentais e na extensāo do welfare mínimo.

Minc, que é o príncipe-confidente dos patrões da Europa via pareceres e programas de investimento, planifica o que etiqueta de "rolo compressor " da estratégia americana de hyper-potência: " Os EUA guardam os melhores entre os melhores dos estudantes chineses e indianos atraídos pela irradiação das Universidades de Berkley, Standford e Harvard, no capítulo da alta tecnologia ", abrindo caminho para que outro escol sino-indiano se forme nos pólos de gestão e ciência política , preliminar da entrada em acção do old boys network, clubes de reflexão, que estreitarão os contactos entre as élites políticas e económicas dos dois países respectivos, " americanizando o mundo e tornando os EUA mais cosmopolitas".

" Quem ganhará nesse jogo? Ninguém ainda o sabe. Mas os EUA serão cada vez mais a atracção do Mundo. Possuir as fábricas que transmitem o poder e o saber às élites do planeta é mais decisivo do que impôr o consumo de Coca-Cola ou o porte do jean aos adolescentes de todos os lugares, mesmo aos que detestam o modelo americano. ", frisa Alain Minc, que acrescenta sem hesitar: " O fosso não cessa de aumentar entre os EUA e os grandes países industrializados. Nada resiste à aliança entre uma pesquisa militar dez vezes mais importante que qualquer outra, uma pesquisa civil mais ambiciosa, universidades sem concorrência de espécie alguma possível, a simbiose perfeita entre o mundo académico e as empresas, e as posições de dominância como a de Microsoft, inexpugnável a longo termo. O país-mundo é o motor tecnológico do planeta ".

Numa semana em que surgiram significativos desabafos do SE da Defesa yankee, Rummsfeld, sobre a "guerra errada " do Iraque, em que a balança comercial inglesa apresenta um déficite record de perto de 100 biliões de euros, a vanguarda dos países islâmicos aproveitou-se de um desaire processual da publicação dos cartoons sobre Maomé
para manter o elevado preço do barril de petróleo, cimentando as suas despóticas teocracias e influenciando as tensões de poder e influência entre a América, a Rússia e a China , que precisam de cada vez mais ouro negro para confortarem as suas ambiçōes.

FAR

FALA!


Foto de Ivone Ralha


Fala a sério e fala no gozo
fá-la p'la calada e fala claro
fala deveras saboroso
fala barato e fala caro

Fala ao ouvido e fala ao coração
falinhas mansas ou palavrão

Fala à miúda mas fá-la bem
Fala ao teu pai mas ouve a tua a mãe

Fala franciú fala béu-béu

Fala fininho e fala grosso
desenrulha a garganta levanta o pescoço

Fala como se falar fosse andar
fala com elegância muita e devagar.

Alexandre O'Neill

Contos do Ano Novo .8

Acabei de ler a monumental biografia de Mao. Espantoso como a Ana, a Maria José e o Zé Manel nadaram,tão tarde, naquelas águas. Que reconhecidos devem estar à nossa democracia burguesa. Devem, no entanto, sentir remorsos quando vêem um pardal. Se o marxismo, com a sua canga de despotismo asiático, revela na prática a natureza sinistra do pensamento m-l, o combate às pragas mostrou o seu lado hilariante. Pelo que me contaram, e aqui vai mais uma história, em Moçambique os m-l portaram-se com outra elevação. Alguns alcandoraram-se a postos na secreta. Aí o modelo era eclético. O estilo o dos policiais americanos à mistura com métodos dos "killing fields". Um dia um jornalista apanhou boleia de um amigo das forças de segurança. Entrou numa bruta máquina com matrícula da África do Sul. Parcaram dentro do pátio de um dos locais de detenção dos contra-revolucionários. "That's my car" gritou da janela, com grades, que dava para o estacionamento, um sul-africano. "Your car?", responde o super-polícia saindo do carro, ajeitando o coldre. "Our car!" concluiu. A justiça revolucionária e o colectivo salvaguardados. O jornalista, que me contou a história, é hoje, na América, uma voz dela. O "Dirty Harry" da revolução está reformado, em Portugal, a gozar dos proventos das malfeitorias. O sul-africano onde estará? Aposto em três sítios: Austrália, Nova Zelândia ou Moçambique. Em Moçambique, caso tenha sobrevivido ao trauma, será um machambeiro com coutada privada?

Josina MacAdam

domingo, 12 de fevereiro de 2006

Pelo direito à blasfémia

É notória a manipulação política que existe nesta crise dos cartoons, não só pelo lado dos europeus mas também pelo lado dos árabes.
Basta estar atento às manobras de bastidores que se desenvolvem em ambas as barricadas para perceber que mais uma vez eles, políticos árabes e europeus, querem fazer de nós meros peões de um jogo viciado e acabar em consensos absurdos. Essa questão é fundamental porque pode colocar conquistas históricas em causa. É importante relembrar que há valores fundamentais que há séculos estão profundamente entranhados na cultura dos diversos povos europeus.
Esses avanços num mundo então de trevas, foram igualmente adoptados em muitos sistemas políticos de diversos países do mundo. Estou a falar na separação entre o Estado e a Igreja. Por muito politicamente correctos que queiramos ser nesta questão dos cartoons, o direito à crítica religiosa foi uma conquista pela qual muitos morreram nos fogos da inquisição, e que é necessário não perder.
Nesses Tribunais do Santo Ofício bem tentaram travar os ventos da história, mas a liberdade também estava a passar por ali.
Hoje, é perigoso entrar em terrenos lamacentos na defesa de novos princípios que acabam por ser recuos nos valores fundamentais, que têm na liberdade de expressão um dos seus expoentes máximos.

OPA VERDADEIRAMENTE HOSTIL

O Director da Biblioteca Nacional espuma de raiva e arranha-se no rosto, bacante traída em pleno quase orgasmo: Belmiro lança uma OPA Hostil contra a Biblioteca Nacional e esta adquirira no momento a mais preciosa edição do grande poema épico que nos canta num velho alfarrabista da Madragoa.
O velho e tranquilo pó que tem habitado os livros e o silêncio das reservas definitivamente entregues a um alvoroço nevrótico : que será deles, dos manuscritos matriciais, da língua, dos nossos sonhos retrospectivos, desse flash back recorrente que tanto amamos das Descobertas, do toque a vagas quase líquidas que se respira nos textos e de todo esse sal que chorámos e choramos, verdadeira flor lacrisalmejante e eterna?
O problema é este : A OPA ataca mesmo as Golden Share, isto é, toda aquela parte das reservas que incluem o Camilo menos conhecido, as primeiras edições dos Lusíadas e mesmo algum material cartográfico da Lisboa pré terramoto ( há dúvidas sobre se a Opa ataca também a Torre do Tombo. Seria o Tombo definitivo claro, o que não aconteceu à de Pisa, pois Pisa tem-se oposto à berlusconização galopante, uma variante da gripe, a das aves raras canoras. Diga-se em aparte que o cantor romântico mandou guilhotinar uma edição das completas de Goldoni após comprar a Einaudi, dado que o mercado não lhe atribuía valor.)
Em matéria de Camões a Opa Hostil roça os cem por cento – 100%.
O Belmiro palma tudo para ele. Também o Miranda, o Ribeiro, da Castro, o Judeu, o Garrett e a arca do Pessoa, vai tudo na mesma OPA - o Herberto parece estar por uma unha, há hesitações sobre o seu valor de mercado, é de leitura não linear segundo uma fonte autorizada da empresa e o empresário quer clareza, transparência, mais valias.
É uma nova Tróia a cair nas mão do seu império e todos dizem, de conluio com o filósofo nosso primeiro ( que aproveitou o fim de semana para desopilar na neve, mas agora usando apenas o binóculo de lentes escuras. Antes torcer o olho que o calcanhar).
Uma notícia preocupante entretanto expedida pela Lusa : a partir de agora a arca de Pessoa só abrirá os preciosos manuscritos a quem sonaefor, cartão electrónico de cliente fidelizado na lapela – tipo via verde - e shopping obrigatório todos os dimanches no Continente ( que passará a ter uma secção de manuscritos raros digitalizados com a patine do tempo e pó arcaico para remexer a dedo, ao vivo, hiper-real e em tamanho de pó claro).
Última hora : consta que inúmeros manuscritos resolveram atravessar o Atlântico a nado e pediram asilo à Academia Brasileira de Letras. O presidente Lula não fez declaração nenhuma ao cardume de jornalistas que o instou a comentar, manteve a boca fechada e lançou nuvens de tinta negra sobre o caso.
O Ex. Presidente Jorge Sampaio fechou-se entretanto em copas diz também a Lusa.
Hora póstuma : o Director da Biblioteca Nacional barricou-se na secção das reservas da vetusta instituição e ameaça fazer-se explodir com os Cocktails Molotoves de aguardente amarela de Reguengos atados à cintura, caso a Opa não deixe de ser hostil e não se assuma como uma OPA fraterna.
Do fundo da epopeia Camões agradece e destapa o olho acidentado na esperança de voltar a ver dos dois.

f.arom

sábado, 11 de fevereiro de 2006


Foto de José Carlos Mexia
"É melhor morrer-se de vodka, do que de tédio"
Vladimir Maiakóvsky

A verdadeira vitória de Bush

Ana Sá Lopes no Diário de Notícias, artigo completo disponível aqui:

«O epifenómeno dos cartoons revela como George Bush conseguiu impor o "ou nós ou eles" aos mais improváveis cidadãos. O debate em Portugal, na praça pública, é disso revelador, ultrapassando as habituais fracturas esquerda/direita. A gritaria panfletária sobre o direito à liberdade de expressão (como se fosse isso que estivesse em causa e não o crescendo de antagonismo Ocidente-Islão) serviu de mote às mais inopinadas proclamações guerreiras apelando ao choque. (...)
O tema, em si, ajudou. A "liberdade de expressão" é um assunto que se presta às maiores demagogias. A liberdade de expressão já contém em si dois antagonismos, a liberdade de exprimir e a liberdade de recusar a expressão. O ministro dos Negócios Estrangeiros dinamarquês usou a sua liberdade de recusar receber alguns embaixadores de países islâmicos que queriam fazer uso da sua liberdade de expressão. Foi bom para a liberdade de expressão? Ou, como dizia no El País Juan Goytisolo citando o Financial Times "A liberdade de expressão não inclui o direito de gritar 'fogo' num teatro a abarrotar." Ou sim?»
World Press Photo of the Year 2005
Mãe e filho num centro alimentar de emergência
em Tahoua, Niger, 1 de Agosto de 2005
Fotografia de Finbarr O'Reilly, Canada, Reuters

O que é a verdade senão uma impressão?

Escreve Luciano Amaral:

"...Seguidores de Maomé destroem torres gémeas de Nova Iorque e uma ala do Pentágono, matando mais de três mil pessoas,enquanto nas ruas de Ramallah se celebra dançando; destroem a embaixada americana em Nairobi, matando 250 pessoas; destroem uma composição ferroviária em Madrid, matando 200 pessoas;destroem umas quantas carruagens de metro em Londres, matando 50 pessoas;destroem uma rua turística de Bali, matando 200 pessoas; o Presidente do Irão promete riscar Israel do mapa e afirma que o Holocausto não passa de de uma fantasia judaica.Tudo isto acontece e repetem-se as vozes dizendo-nos que é preciso "compreendê-los" e às suas "razões de queixa" pela arrogância ocidental"

Escreve André Carapinha:

Não-seguidores de Maomé destroem duas cidades no Japão e um país no sudoeste asiático matando mais de um milhão de pessoas, enquanto nas ruas de Nova Iorque se celebra dançando; sustentam regimes genocidas em Angola, Nigéria, Birmânia, Sudão, noutros tempos no Chile, Brasil, Nicarágua, Honduras, Zaire, Ruanda, e outros, sendo responsáveis por milhões de mortos; colonizam o médio oriente desde os anos 20 e manipulam regimes-fantoche opressivos, aliam-se aos sheiks contra os laicos socialistas; invadem duas vezes o mesmo país em 15 anos e matam mais de cem mil pessoas incluindo massacres com gás de nervos, chacina de tropas já rendidas, sepultar homens vivos, no seguimento legalizam novamente a tortura e inauguram prisões secretas à escala global; o presidente desse país promete riscar do mapa os países que não estão de acordo, e afirma que os que discordam não passam de perigosas fantasias islâmicas. Tudo isto acontece e repetem-se as vozes dizendo-nos que é preciso “apoiá-los”, e às suas “razões” objectivas e geopolíticas.

sexta-feira, 10 de fevereiro de 2006

Posteridade


Ilustração de Ivone Ralha


Um dia eu, que passei metade
da vida como passageiro,
tomarei lugar na carlinga
de um monomotor ligeiro
e subirei alto, bem alto,
até desaparecer para além
da última nuvem. Os jornais dirão:
Cansado da terra poeta
fugiu para o céu.
E não
voltarei de facto. Serei lembrado
instantes por minha família,
meus amigos, alguma mulher
que amei verdadeiramente
e meus trinta leitores. Então
meu nome começará aparecendo
nas selectas e, para tédio
de mestres e meninos, far-se-ão
edições escolares de meus livros.
Nessa altura estarei esquecido.

Rui Knopfli

quinta-feira, 9 de fevereiro de 2006

Geopolítica da indignação

Point de vue

Caricatures : géopolitique de l'indignation, par Olivier Roy


LE MONDE | 08.02.06

Le conflit sur les caricatures danoises est souvent présenté comme l'expression d'un "clash" des civilisations entre un Occident libéral et un islam qui refuserait la liberté d'expression. Il faut beaucoup d'ignorance et encore plus d'hypocrisie pour s'en tenir à cette thèse. La liberté d'expression est dans tous les pays occidentaux d'ores et déjà limitée, et par deux choses : la loi et un certain consensus social. L'antisémitisme est réprimé légalement. Mais l'atteinte à d'autres communautés aussi : en 2005, l'Eglise catholique de France a obtenu le retrait d'une publicité utilisant la Cène, mais remplaçant les apôtres par des femmes court vêtues. Cela relève exactement de la même démarche qu'entreprennent les associations musulmanes aujourd'hui. Quels journaux ont alors publié la publicité incriminée en défense de la liberté d'expression ?

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quarta-feira, 8 de fevereiro de 2006

Maomé e a liberdade de expressão

En dehors du wahhabisme, la représentation du prophète n'a pas toujours été interdite.
Mahomet au beau visage


par Nedim GÜRSEL

QUOTIDIEN : lundi 06 février 2006
Nedim GÜRSEL écrivain turc, directeur de recherche au CNRS (1).

La transcendance de Dieu est absolue selon la croyance islamique. Son essence demeure imperceptible. Elle est au-delà de toute imagination, de toute comparaison. On ne peut la représenter, ni la définir. En revanche, Dieu se manifeste par ses attributs. Ainsi pourrait-on se faire une idée de son émanation et se rassurer de son existence. Je crois qu'il en est de même dans le judaïsme. Ce n'est pas seulement la Bible, le Coran aussi parle de Moïse qui désirait voir Dieu et qui fut frappé par la foudre sur le mont Sinaï. Pourtant, la tradition veut que le prophète Mahomet ait une rencontre avec Dieu lors du Mirac, son ascension vers le septième ciel. Dieu se serait manifesté à lui par l'un de ses nombreux attributs, cemal, qui signifie «beauté du visage». Depuis, dans la tradition populaire turque et peut-être ailleurs, on attribue à Mahomet le qualificatif, cemal, prénom très répandu dans le monde musulman.
L'islam interdit l'image, c'est un fait. Mais elle ne fut pas pour autant complètement évacuée du champ religieux dans le monde islamique ; en dehors du wahhabisme, la représentation du prophète est un constat, notamment dans la tradition ottomane. Siyer'î Nebî, qui décrit la vie de Mahomet d'après les sources arabes, est un livre illustré dont le manuscrit date du XIVe siècle. On peut y voir Mahomet avec le visage recouvert d'un voile blanc ou vert. Mais dans un autre livre dont la rédaction date également du XIVe siècle, Miraçnâme, que l'on peut consulter au musée de Topkapi à Istanbul, le prophète est dessiné à visage découvert. C'est un bel homme barbu coiffé d'un turban blanc et habillé d'un magnifique cafetan bleu qui rappelle le manteau de la Vierge, cher aux artistes de la Renaissance. Il est monté sur les épaules de l'archange Cebrail qui le conduit vers le ciel.
Lors de mes fréquents voyages en Anatolie, il m'est arrivé souvent de voir les portraits d'Ali gendre du prophète et quatrième calife accrochés au mur chez les Alevis. Cette communauté fort nombreuse (une dizaine de millions de membres), proche d'une forme de chiisme qui vénère Ali beaucoup plus que Mahomet, pratique un islam tolérant et constitue, par son esprit d'ouverture, une base solide de la laïcité en Turquie.
Dans cette affaire des caricatures de Mahomet, ce n'est donc pas sa représentation qui est en cause, mais la manière dont elle est réalisée. Pour les croyants et les autorités religieuses, il s'agit d'un blasphème. Et le blasphème a coûté la vie à plus d'un artiste ou d'un penseur dans l'histoire de l'islam, à commencer par Hallac-i Mansour exécuté pour avoir dit : «Enel Hak» («Je suis la Vérité»), qui est un des attributs d'Allah en passant par Nesimi, le grand poète soufi du XIVe siècle, écorché vif pour avoir fustigé les mollahs d'Alep. Il faut admettre qu'en démocratie, le blasphème ne peut être considéré comme un délit. Nous ne vivons pas sous un régime théocratique et la liberté d'expression est la condition sine qua non de la création artistique.
Lors de la condamnation à mort de Salman Rushdie par une fatwa de l'ayatollah Khomeiny, j'étais l'un des premiers écrivains d'origine musulmane à le soutenir. D'autant que les Versets sataniques étaient un roman et que nous devions non seulement défendre à travers cette oeuvre de fiction la liberté d'expression, mais aussi revendiquer le droit à l'imagination. Nous devons faire de même aujourd'hui pour les caricaturistes menacés, même si leur talent laisse à désirer.

(1) Dans les Turbans de Venise (Seuil, 2001), l'auteur évoque à travers le portrait de Mehmet II par le peintre vénitien Gentile Bellini, l'interdiction de l'image dans l'islam

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Maureen Dowd tomou café com o príncipe
Turki al-Faisal, novo embaixador saudita nos EUA



A convite do novo embaixador saudita nos EUA, Maureen Dowd, a flamejante cronista do naipe de ouro do NY Times, tomou café com a mais emblemática e poderosa personalidade da coroa do aliado n° 1 dos States no Médio Oriente. O facto ocorreu na passada Quinta-feira, em Washington. Maureen desvenda passos importantes do encontro na sua crónica dominical. O futuro do petróleo, as alternativas energéticas e o jogo de espelhos no topo do governo americano são tópicos nucleares reproduzidos, e de que damos uma rápida visão.
O príncipe- que está na linha sucessória do Rei Abdhulla- mostrou-se chocado, " triste " com o zizaguear da política energética de Bush. Condi Rice lançou as bases de um " diálogo estratégico " USA/A.Saudita, há poucos meses, que estipulava o acréscimo da produção e do aumento da quota de exportação; mas G.W. Bush derivou na Mensagem sobre o Estado da União, lida no Capitólio a 31/1,para a substituição das exportações pela cana-de-açúcar e o etanol. Maureen diz que são tudo "tretas e atoardas eleitoralistas", por um lado: Por outro, de forma acerada, a nossa bem amada cronista, diz que Bush tentou com aquele palavreado das energias renováveis" apagar o desgosto sentido pelos americanos, em relação com os lucros miríficos obtidos pela Exxon Mobil e Halliburton , o preço alto da gasolina e o conflito do Iraque- que Rummsfeld apelida com desesperante mal estar de guerra errada ". Clash! Depois de abordarem diversos aspectos da política interna saudita ,em especial os vestígios da polícia religiosa- que " sobressaltaram" a jornalista -trocaram impressões sobre o Iraque, chegando a acordo na formulação de que" existem duas possibilidades de saída, uma boa e a outra-terrível ". Com perfídia, a cronista do NY Times acusa o vice-presidente, o " poluidor " Dick Cheneney, de ter boicotado o plano de energias renováveis de Nelson Rockfeller na Administração Gerald Ford, há mais de 30 anos, o que evitava de ter que repeti-lo agora para reduzir as importações petrolíferas do Médio Oriente", apesar de tentar de novo boicotar tal iniciativa.

FAR

Para que se entenda

Anda por aí uma grande confusão sobre os argumentos que eu, e outros, defendemos quanto à questão dos cartoons. Ninguém, com a excepção do mui católico Freitas do Amaral, advogou sequer de longe a limitação do direito de publicação. Este é um direito inalienável, basilar, fundador de uma sociedade livre e democrática. O que criticamos são duas coisas: primeiro, e principalmente, o aproveitamento que alguns fazem da questão para dar largas ao seu racismo e desprezo pelo que é diferente da "superioridade" ocidental (veja-se Vasco Pulido Valente, que não encontra futuro na civilização islâmica- «uma civilização fanática, despótica e analfabeta»). Segundo, e acessoriamente, a presunção de que publicar cartoons de mau gosto sobre Maomé e escrever um editorial em que se afirma o direito a "humilhar, blasfemar e insultar" o islão, numa altura em que os americanos estão no Iraque e crescem as tensões com o Irão, e em que graças a estas atitudes Bin Laden ganha prestígio crescente entre os muçulmanos, não tem problema nenhum, que se tratou de um acto ingénuo de um jornalzeco dinamarquês sem noção das consequências. Eu, pessoalmente, não gosto que me tomem por parvo.

terça-feira, 7 de fevereiro de 2006

Velho Colono


Foto de Ivone Ralha


Sentado no banco cinzento
entre as alamedas sombreadas do parque.
Ali sentado só,àquela hora da tardinha,
ele e o tempo. O passado certamente,
que o futuro causa arrepios de inquietação.
Pois se tem o ar de ser já tão curto,
o futuro. Sós, ele e o passado,
os dois ali sentados no banco de cimento.

Há pássaros chilreando no arvoredo,
certamente. E, nas sombras mais densas
e frescas, namorados que se beijam
e se acariciam febrilmente. E crianças
rolando na relva e rindo tontamente.

Em redor há todo o mundo e a vida.
Ali está ele, ele e o passado,
sentados os dois no banco de frio cimento.
Ele a sombra e a névoa do olhar.
Ele, a bronquite e o latejar cansado
das artérias. Em volta os beijos húmidos,
as frescas gargalhadas, tintas de outono
próximo na folhagem e o tempo.

O tempo que cada qual, a seu modo,
vai aproveitando.

Rui Knopfli

segunda-feira, 6 de fevereiro de 2006

Contos do Ano Novo .7

Andam eles nas Escolas, agora, a falar de monotorização e de avaliação. Mudança de paradigma? Modas europeias? Desejo socrático? Num país em que se diz no meu tempo é que era? Daqui a pouco estamos a falar dos velhos do Restelo, como contraponto à deriva da educação. Nisso, eu e o meu pai, não renegamos a herança de Marx. A Escola reproduz. A de antigamente era odiosa. A de hoje, de massas e para gente com massa. A horrível classe média. É de toda a gente, embora formatada para betinhos brancos. A nossa democracia representativa pressupõe a participação. Está quieto que aqui a malta é de exigências. Um médico, uma enfermeira, um prof, uma habitação por cidadão. Está na Constituição. E claro, Viagra para a velhada, com comparticipação, doutra forma erecção só para os ricos. E aqueles, os profs, que deveriam ser o farol da modernidade, que pelintrice! Fazem chás tupperware, vendem livros na sala de convívio, lêem Bolas e Marias, publicitam explicações, inauguram campanhas Yves Rocher e Herbalife, vão a concursos na televisão. Tudo rendido à globalização selvagem, ao mercado. A democracia tem costas largas. Este estado de coisas tem que ver com Inquisição, com salazarismo, com marcelocaetanismo, com cavaquismo, com tratar das vidinhas. Mas porra! Profs! Please! Tomem banho, lavem a trunfa. Sejam exemplares! Não precisam de perfumar os genitais. Ciao.

Josina MacAdam

Foto de José Carlos Mexia

A pergunta a fazer é:

A quem serve, de ambos os lados, toda esta polémica das caricaturas, senão aos apologistas do ódio, da intolerância e do racismo?
Não é por acaso que o Jyllands-Posten é um jornal de direita populista e trauliteira, um tablóide ao melhor estilo. As caricaturas foram a lebre para o confronto civilizacional, tão do agrado de certas alminhas. É evidente que o jornal tem todo o direito de as publicar. Não se armem é em ingénuos e finjam que não antecipavam já as consequências.

Os suspeitos do costume

Tem sido interessante ver os cultores do ódio, os que nos querem arrastar para o próximo Holocausto, terem de repente se tornado os maiores humanistas. Como se trata de defender a superioridade ocidental, estes cândidos senhores descobriram-se campeões da defesa da liberdade de expressão. O bom-senso, a diplomacia, a inteligência, não lhes dizem nada. Não! É pela liberdade de expressão e em nome de valores puros e humanistas que faremos a guerra.

domingo, 5 de fevereiro de 2006

Lúdicas

2 Aforismos lúdicos para um domingo de manhã
meio frouxo
ou das virtudes políticas do boato



Um cavaco que apanhei
Na fogueira o deitei
Não era azinho nem cerejeira
Um raio de pau de figueira?
O certo é que não fazia
Nem chama nem fogo
E teimoso não ardia
A tudo resistia pedra fosse
Mesmo a umas porradonas
De mais que ferro de um tal chuço
É o vírus da impresteza
Pois cavaco é
Lume deve ao povoguês
Desaquecido e desabrigado
Há corrente de ar habituado
O caso é para psiquiatrês
Loja terapêutica triangular
Melhor assim pois assim desempata
A foda e o resto
Se calhar era um cavaco inifogado
Pós moderno e de todo aceite
No SETE JETE dos recicláveis
Bom para lareira de chama simulada
Daquelas que há nas vivendas
MariCanibais ou outras de tipos tais
Telhado suíço em Estrada Nacional Número Um
Para um verdadeiro fondue de visões
O certo é que neva quando menos se espera
E neva nos TRÓPICOS
Tão desaparafusado anda o cosmos
Mesmo apanhado do clima
Eis o non sense paradigmático : cavaco é e não arde



Se pusessem o Cavaco a dar aos braços no topo de um monte ele produziria energia eólica além de acrescentar uma mais valia totémica ao ponto de implantação da sua extensa perna. Aí, fé e produtividade, de mão dada, olhariam então o céu santo e o bolso sujo num mesmo compasso. Resultado provável deste magistério de influência a propor para uma presidência aberta : os portugueses esbracejando em topos de monte produzindo energia eólica. A Europa boquiaberta seguiria, mas muito mais tarde, pelas mesmas janelas de oportunidade. Então a VIA VERDE perderia a sua solitária condição de especiaria rara.

f.arom

Foto de Gabriela Ludovice

Sartre: O que é a seriedade

" Há seriedade quando se parte do mundo e se atribui mais realidade ao mundo do que a si próprio, pelo menos quando se atribui uma realidade onde se pertence . Não é por acaso que o materialismo é sério, não é também por acaso que se constitui onde quer que seja como a doutrina de eleição do revolucionário. É que os revolucionários são gente séria. Eles reconhecem-se a partir do mundo que os esmaga e querem transformá-lo. Nisso têm pontos de semelhança com os seus velhos adversários, os possidentes, que se relacionam também entre si. Deste modo todo o pensamento sério é trabalhado pelo mundo, coagula, é uma demissão da realidade humana em prol do mundo.O homem sério é " do mundo" e não tem mais nenhum recurso em si próprio; porque se atribuiu a si próprio o tipo de existência do rochedo, a consistência, a inércia, a opacidade de estar-no-meio-do-mundo.(...) tudo é consequência para ele e nunca existem princípios: por isso está sempre tão atento à consequência dos seus actos ".

Jean-Paul Sartre, L´ Être et Le Néant.

Copyright FAR

Ilustração de Ivone Ralha


Hei-de mandar arrastar com muito orgulho,
Pelo pequeno avião da propaganda
E no céu inocente de Lisboa,
Um dos meus versos, um dos meus
Mais sonoros e compridos versos:

E será um verso de amor...

Alexandre O'Neill

As caricaturas, o ocidente, os polemistas e os amigos deles

Era uma oportunidade que a extrema-direita não queria perder, como era previsível. Os confrontos de ontem na Dinamarca, originados devido à polémica das caricaturas, foram a prova disso. E a grande preocupação do Governo e da polícia foi para que não fossem queimados exemplares do Corão, o livro sagrado muçulmano, como relata The Copenhagen Post. O Islam on-line também dá conta da preocupação dos muçulmanos dinamarqueses e dos vários avisos que fizeram. O francês Le Monde revela a apreensão de Bruxelas e dos principais governos europeus pelo desenrolar desta situação. Os líderes da europa dos 25 condenam todos os activistas que queiram denegrir qualquer religião, de maneira ofensiva.
Hoje os protestos vão continuar no mundo árabe
. No Líbano, já se verificaram confrontos entre manifestantes e policia, revela a Reuters. Ontem, também foi dia de sair à rua. As embaixadas da Dinamarca, Noruega, Suécia e Chile, em Damasco, foram o alvo da ira dos manifestantes enfurecidos, qua acabaram por as incendiar, relata o DN. A Conferência Islâmica também já tomou posição e quer que a Assembleia Geral nas Nações Unidas organize um debate urgente sobre a questão, e exige uma resolução a condenar as caricaturas, revela a Saudi Press Agency. As ameaças mais radicais também não podiam faltar. Numa entrevista ao jornal italiano Il Giornale Mahmoud Zahar, dirigente do Hamas, considerou que "devíamos matar todos aqueles que ofendem o Profeta mas, em vez disso, estamos a protestar pacificamente".
Desde a polémica que envolveu Salman Rushdie e os seus Versículos Satânicos, nunca o ocidente e o mundo árabe se tinham insultado desta forma. Isto pode ser uma antevisão de situações mais graves, caso não se consiga conter esta escalada de violência e de ódio mútuo, considera o
The Times

sábado, 4 de fevereiro de 2006

Caricaturas e indignação

Gauchet : «Une disproportion entre les caricatures et l'indignation»
Propos recueillis par Alexis Lacroix

[03 février 2006]

L'historien et philosophe Marcel Gauchet, rédacteur en chef de la revue Le Débat, a publié récemment La Condition politique (Gallimard). Il réagit à la polémique internationale suscitée par les caricatures du prophète Mahomet parues en septembre dernier dans le quotidien danois Jyllands Posten et rééditées le 10 janvier par un périodique norvégien, Magazinet.

LE FIGARO. – La publication de dessins satiriques dans la presse scandinave suscite une polémique et des protestations dans le monde arabe. Quelles réflexions vous inspire cette situation ?

Marcel GAUCHET – Je m'interroge sur l'origine véritable d'une telle émotion au sujet de caricatures plutôt innocentes. Des pays arabes s'indignent, mais leurs anathèmes reflètent-ils vraiment le sentiment de leurs populations ? Quant à l'Europe, que représentent au juste les protestataires qui s'agitent ? On est en droit de nourrir les plus grands doutes sur la portée de ces indignations. Dans cette affaire – que la presse danoise qualifie d'«affaire Mahomet» –, on rêverait vraiment d'un travail d'enquête, capable d'établir qui sont ces insurgés de la vraie foi... La naïveté de la presse, c'est parfois de prendre pour argent comptant un semblant d'unanimité dans l'indignation des consciences musulmanes. N'est-ce pas le premier piège de cette affaire ?

Certes, mais les menaces proférées ne sont pas nées de l'imagination des médias !

Absolument, et il convient sans doute de les recevoir avec le plus grand sérieux. Il convient aussi de s'interroger sur leur signification véritable : un accès de colère si aigu ne trahit-il pas avant tout la profondeur d'un désarroi ? La disproportion entre les dessins et l'indignation est ce qui doit faire réfléchir. Comme Sayyid Qotb ou Hassan el-Banna – les premiers théoriciens de l'islamisme dans les années 20 –, ceux qui lancent des fatwas contre un simple dessin humoristique révèlent d'abord par cette susceptibilité exacerbée un profond sentiment de vulnérabilité. Une religion sûre d'elle-même pourrait-elle donner lieu à une colère si disproportionnée ? Qui, parmi les catholiques, aurait l'idée de mettre en scène un tel esclandre planétaire ? A-t-on vu se déchaîner les ligues de vertu quand telle chaîne de télévision a présenté un sketch suggérant que Benoît XVI, du fait de ses origines allemandes, était un pape nazi ? Il faut dire que les fondamentalistes ne sont pas encouragés à cet auto-examen par l'attitude des Occidentaux. En proie au «sanglot de l'homme blanc», de nombreux Occidentaux n'osent toujours pas porter un regard critique sur certains aspects – ou certaines dérives, notamment islamistes – de l'islam. Le tiers-mondisme expiatoire a la vie dure.

L'«interdit de la représentation» dans l'islam n'explique-t-il pas, en partie, la vigueur de ces protestations ?

Franchement, je ne suis pas sûr qu'alléguer ces raisons anthropologiques soit bien pertinent. Les Occidentaux baignent désormais, comme chacun sait, dans une culture de l'image. Et cela, n'importe quel musulman le sait. Aussi l'interdit de la représentation qu'il se doit de respecter lui-même ne s'applique pas aux non-musulmans. Exerçons-nous donc à la finesse ! Essayons de traverser les apparences ! Ne nous en tenons pas, autrement dit, pour comprendre le cogito fondamentaliste, à l'effroi qu'inspire la rhétorique du djihad. Ces rodomontades dissimulent bien souvent un doute taraudant sur la solidité de l'identité qu'on défend avec cette ardeur guerrière.
In Le Figaro

aqui

Pinturas nocturnas de gente viva na grande urbe





As frases mais mundanas de uma sexta-feira à noite
(Deleuze, Wittenstein e a vendedora do mercado da Ribeira ficam para depois):
-"Aquela gaja do teatro está-me a dar uma moca."
-"Se as gajas se querem casar, que casem, mas essas fufas do ILGA não venham cá com merdas."
-"Porra, essa boca é um bocado mau estilo"
- "Estou-me a cagar que o gajo seja o mais rico do mundo. Tudo isto é uma pateguice pegada"
- "Ó sr Fernando, que pratos de bacalhau é que tem?"
- "Ó filho não podemos ir de taxi porque o papá vai casar em Março."
-"O jogo ainda agora começou e os gajos já estão a ganhar dois zero?"
-"Porra! Conheces! Ela vivia ali ao pé do Polana, e estudava no Liceu Salazar".
- "Grandes bubas no bar do Pinto. Agora já não existe."
-"Olha quem apareceu! Aquele gajo está insuportável."
-"Como é menina, vamos acasalar?"
-"Pá, agora paro no Paródia, a cena por lá é porreira."
-"Porra, o Tokyo está cheio e a música hoje é uma merda"
-"Então boa noite, até amanhã."
(porteiro do Tokyo)

sexta-feira, 3 de fevereiro de 2006

Que queres tu de mim?

Confesso, Susana, que só vou aceitar este repto porque sou incapaz de resisitir a um convite vindo do sexo feminino.

1- Tenho a mania das mulheres.
2- Tenho a mania de que é com a tristeza, a melancolia e o sofrimento que se aprende a viver. Que a grande arte é sobre estes assuntos e não outros. E que hoje em dia, infelizmente, não se dá importância a estas coisas.
3- Tenho a mania que a lógica nada nos ensina, porque não contempla aquele ponto invisível onde o olhar passa e pára.
4- No entanto, também tenho a mania da lógica, da filosofia e da ciência, e a mania que nem todas as formas de pensar são iguais.
5- Derivada da mania acima, tenho a mania que isto não tem de ser sempre assim, que o real não é um facto dado mas um conjunto de aproximações sem valor de verdade per si. Esta é a pior de todas as minhas manias, e a que mais dissabores me tem dado.

O meu repto vai para o João Galamba do Metablog, Ale do Moro Aqui, Carlos Gil do Xicuembo, e dois muito especiais: para o Camarada Jesus e para todos os Ventoinhas (estes dois últimos podem, sem dificuldades, elevar este debate a outros niveis).

Regulamento do passatempo disponível aqui.

A arte e a polémica: um outro olhar

“Os fundamentalismos religiosos levam a estas situações dogmáticas, que não são aceitáveis”

“O ascendente do islamismo sobre a sociedade é maior do que o do catolicismo, pois não há naquelas sociedades uma separação entre a Igreja e o Estado como no Ocidente”

“Apesar das eventuais consequências as nossas sociedades não podem ceder a estas formas de chantagem”

“Todas as religiões são essencialmente antidemocráticas, porque são a voz de Deus. Se tiverem condições, o seu cariz teocrático vem ao de cima”


António
Cartoonista
“Publico”, 03.02.2006

Filmes a não perder

“Munich”, de Steven Spielberg
Inspirado no ataque do movimento «Setembro Negro» aos atletas da delegação israelita durante os Jogos Olímpicos de Munique, em 1972. O resultado foi trágico, como é do conhecimento público: onze mortos. A história desenvolve-se na perseguição dos envolvidos nos atentados por um agente da polícia secreta de Israel, a Mossad.
“Walk the Line”, de James Mangold
Conta a história de uma das lendas da música popular norte-americana: Johnny Cash. Com um som inconfundível e um dark look que se colou à pele, daí o cognome “Man in Black”, o filme conta a sua história, os seus amores e o seu envolvimento com as drogas duras. Entre a paixão por June Carter e a atracção pelo abismo, Cash percorreu grande parte da sua vida no fio da navalha, oscilando entre a destruição e a redenção. Morreu em 2003.

quinta-feira, 2 de fevereiro de 2006


Foto de José Carlos Mexia

As identidades defendem-se à bomba?

Por duas vezes o jornal dinamarquês Jyllands-Posten foi ameaçado à bomba por um grupo muçulmano, revoltado com as caricaturas do profeta Maomé publicadas no diário. Os muçulmanos não gostaram não só do conteúdo crítico mas também se indignaram por considerarem que o Islão proibe representações de Maomé. Face a esta atitude radical, vários jornais alemães e franceses decidiram publicar as caricaturas, considerando que está em causa a liberdade de expressão. O jornal alemão Welt publicou uma das caricaturas com o argumento que “o direito à blasfémia” assenta nas liberdades democráticas. E considera que as caricaturas são inofensivas. Uma das caricaturas do Jyllands-Posten foi também ontem manchete do francês France Soir: “sim, nós temos o direito de caricaturar Deus”, e publica as restantes caricaturas nas páginas interiores. Face a esta atitude, o proprietário do France-Soir, Raymond Lakah, um francês de origem egípcia, despediu hoje o director Jacques Lefranc por ter decidido a sua publicação. As primeiras reacções de indignação já se fizeram ouvir e a controvérsia promete continuar. Há pouco, dois grupos armados palestinianos já consideraram qualquer cidadão da Dinamarca, França e Noruega que esteja na Faixa de Gaza ou na Cisjordânia como um "alvo". E a coisa promete não ficar por aqui.
Mais uma vez, o choque de culturas na Europa dá-se com bombas e polémica. É de novo o confronto entre a tradicional identidade europeia, que se baseia em valores democráticos, e o melting pot cultural dos novos valores incorporados, em que a Europa se transformou. Qualquer opção é difícil. Este é mais um caso a acrescentar ao que se passou com o véu islâmico em França, e à tragédia que envolveu o filme Submissão, de Theo van Gogh, morto por um holandês de origem marroquina. O assassino considerou o filme, que relatava a vida submissa e menosprezada das mulheres árabes, insultuoso para o Corão.

CORPO-A-CORPO


Foto de Sérgio Santimano


Surpreender-te no ar desprevenido
que por vezes assumes
- o busto inclinado para trás,
semicerradas as pálpebras
num olhar de penumbra difusa
- e fazer-to.
Munir-me com toda a manha
e arteirice de um velho legionário
experimentado,
usar o bote, a finta, o ataque
envolvente e de surpresa
de modo a garantir sem probabilidade
de erro ou falha
que não possas entrincheirar-te
na retractibilidade dos rins
ou na chave de pernas.

Mas não se diz de certas coisas
que as fazemos:
aparecem feitas.

Rui Knopfli

quarta-feira, 1 de fevereiro de 2006

" American Vertigo: Traveling America in the Footsteps of Tocqueville ", by Bernard-Henri Lévy


Na estrada com Mister Lévy

O polémico e inveterado polemista pariseense foi passar um ano aos EUA, a convite de diversas instituições e da revista The Atlantic Monthly. Disso resultou um livro que exprime a sua impressão sobre a América do início do séc. XXI. Falou com o casal Clinton , numa visita à Biblioteca de Little Rock, encontrou-se com Woody Allen, que adora, e trocou confidências com Sharon Stone e Warren Beatty, por exemplo. Tudo para apurar o pulsar do coração dos USA. " E bom senhor, o inocente amor pelo paradoxo- América é magnificente
mas louca, glutona e modesta, embriagada com o materialismo e a religiosidade, puritana e viciosa, encarando de frente o futuro mas também obscecada com o passado. O querer do sentimento americano " é muito forte e maneável, extremamente tenaz e, finalmente, quase vazio "., refere o crítico Garrison Keillor, na sua recensão irónica e blasé estampilhada na edição dominical do The New York Times., 29 Janeiro pp.

Copyright FAR

"Assobiando contra o vento, sem lenço nem documento" - Propostas de Inverno

Belle And Sebastian - The Life Pursuit (2006)
Depois do fundamental "Dear Catastrophe Waitress", os Belle & Sebastian lançam agora o seu novo álbum "The Life Pursuit". A banda indie das terras altas e ventosas da Escócia, de som doce e sussurrante, apresenta-se agora com um sonoridade mais afirmativa, mantendo no entanto o perfil que a caracterizou desde que a sua estreia, em 1996.
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Ursula Rucker - Ma' at Mama (2006)
É o seu terceiro trabalho e acabou de chegar às prateleiras das lojas de discos. A palavra é a sua arma mortífera. O seu som é único. Não é pop, não é hip-hop, não é soul, não é jazz. É tudo misturado, cantado com uma voz divinal onde o amor, a raiva e a poesia urbana se fundem até à excelência. Herdeira groove do jazz, R’n’B, e soul, Ursula Rucker canta uma América contraditória, violenta e dividida. Um disco fundamental.
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Os Mutantes – Os Mutantes (1968)
Continuam a ser uns célebres desconhecidos fora do Brasil. No entanto foram uns dos pilares do movimento tropicalista, que nos anos 60 os juntou a Caetano Veloso, Gilberto Gil, Gal Costa, Nara Leão e Tom Zé, entre outros. Caetano dizia na altura que “a tropicália foi o avesso da bossa nova". Os Mutantes eram os irmãos Arnaldo e Sérgio Baptista e Rita Lee. O trio lançou este seu primeiro trabalho em 1968 e surpreendeu os criticos. Ainda hoje é um documento importante do movimento tropicalista. Psicadelismo, distorções q.b., sonoridades urbanas, pop, experimentalismo, música concreta e poesia simbólica. O disco tem tudo para ser um must. Difícil de encontrar, mas a Internet faz milagres.

Wolfgang Amadeus Mozart - Cosi fan tutte (1789-90)

Mozart nasceu em 1756 e comemoram-se agora os seus 250 anos. O programa de festas é grande e há que aproveitar o máximo. É um dos músicos mais geniais de sempre. Quem gosta deste género de música, sabe que tudo é bom em Mozart. A harmonia, a beleza e o romantismo das suas composições são inconfundíveis. A minha proposta vai para uma ópera. "Cosi fan tutte" foi composta entre 1789 e 1790 e, juntamente com "As Bodas de Fígaro" e "Don Giovanni", faz parte da trilogia feita com o libretista, ex-padre e libertino Lorenzo da Ponte. O tema da ópera são as mulheres e a sua inconstância quanto à fidelidade conjugal. A sua apresentação gerou um forte escândalo naquele tempo e só regressou aos palcos já em pleno século XX. A sua audição combina bem com um cognac ou aguardente velha, numa noite fria.

Elis (2)

Como nossos pais

Não quero lhe falar, meu grande amor
Das coisas que aprendi nos discos
Quero lhe contar como eu vivi e tudo o que aconteceu comigo
Viver é melhor que sonhar
E eu sei que o amor é uma coisa boa
Mas também sei que qualquer canto é menor do que a vida de qualquer pessoa
Por isso cuidado, meu bem, há perigo na esquina
Eles venceram e o sinal está fechado pra nós que somos jovens
Para abraçar seu irmão e beijar sua menina na rua
É que se fez o seu braço, o seu lábio e a sua voz

Você me pergunta pela minha paixão
Digo que estou encantado como uma nova invenção
Eu vou ficar nesta cidade, não vou voltar pro sertão
Pois vejo vir vindo no vento o cheiro da nova nova estação
Eu sei de tudo na ferida viva do meu coração
Já faz tempo eu vi você na rua cabelo ao vento gente jovem reunida
Na parede da memória essa lembrança é o quadro que dói mais
Minha dor é perceber que apesar de termos feito tudo que fizemos
Ainda somos os mesmos e vivemos
Como nossos pais

Nossos ídolos ainda são os mesmos e as aparências não se enganam, não
Você diz que depois deles não apareceu mais ninguém
Você pode até dizer que tou por fora ou então que tou inventando
Mas é você que ama o passado é que não vê
É você que ama o passado é que não vê
Que o novo sempre vem
Hoje eu sei que quem deu me deu a idéia de uma nova consciência e juventude
Está em casa guardado por Deus contando vil metal
Minha dor é perceber que apesar de termos feito tudo tudo o que fizemos
Nós ainda somos os mesmos e vivemos
Ainda somos os mesmos e vivemos
Como os nossos pais