1. "A obra de arte está ligada a um risco, é afirmação de uma experiência extrema. Se o artista corre um risco, é porque a obra é essencialmente risco e, a isso estando ligado é, também, o artista que pertence ao risco".
2. "Na obra o homem fala, mas a obra dá voz, no homem, ao que se não diz, ao inominável, ao desumano, ao que não tem ( é) verdade, ao que não tem justiça; sem usufruir de direito, lá onde o homem não se reconhece, onde não se sente justificado; onde não está de modo algum presente; onde o homem se ausenta de si próprio, de deus".
3. "O poema é a película que torna visível o fogo, que o torna visível porque o esconde e o dissimula. O mostra, portanto. Descobre mas dissimulando e retendo na obscuridade, o que só se pode esclarecer pelo obscuro, e guardando-o no obscuro até à claridade revelada pelas trevas".
4."O poeta vive na intimidade do perigo. Só. Suporta profundamente o tempo vazio da ausência e, nele, o erro torna-se a profundidade da perdição, a noite torna-se noutra noite. Mas o que é que isto significa? Quando René Char escreve: "Que o risco seja a tua clareza", quando Georges Bataille, colocando face a face a chance e a poesia, diz : " A ausência de poesia é ausência de chance", quando Hölderlin classifica o presente vazio do perigo " plenitude de sofrimento, plenitude de alegria, o que é que se procura dizer? Por que é que o risco se assumiria como clarificação? Por que é que o tempo do perigo seria o tempo da chance? Quando Hölderlin fala dos poetas que, como os apóstolos de Bacchus, vão errando de país em país na noite sagrada, em deslocação interminável, infelicidade que atormenta quer os que falham o lugar ou a migração fecunda, o movimento que mediatiza, o que faz das correntes uma linguagem e da linguagem, a casa do ser, o poder pelo qual o dia permanece- e será a nossa habitação?".
5. "O poema é a ausência de resposta. O poeta é o que, pelo seu sacrifício, conserva no seu trabalho esta questão em aberto. Nunca deixa de viver no perigo. Sempre".
6. "No poema não é só o homem que se arrisca, pelo facto que se expõe à expectativa e ao fogo tenebrosos. O risco é mais essencial; é o perigo dos perigos, pelo qual, de cada vez, é radicalmente contestada a essência da linguagem".
In Maurice Blanchot, L´Espace Littéraire, Gallimard. Idées.
FAR
4 comentários:
Razão tinha Platão em correr os poetas da cidade. A vaidade das palavras tornam-nos patetas.
Mister Táxi Pluvioso: V. Excia leu estes extractos de um livro antigo? Eu que navego nestas águas, que tento ler tudo em profundidade, só encontro tal densidade e fulgor, violência revolucionária e ambição( do perigo), em paralelo, nos ensaios de Heidegger, do qual este livro inaugural se aproxima muito. René Char está lá, já, e o livro é dos anos 50.Como estão o Rilke- ensaista, o Barthes e Yves Bonnfoy. Por agora não quero dizer mais nada. Salut! FAR
Tentei fazer uma rima “hiperbática”. Se isso existisse. Ou se os portugas fossem capazes de criar alguma coisa. Algo que não acredito, excepto a achação do mundo (não foi só o achamento do Brasil, que diabo! nós achamos o mundo. A achar somos grandes! conhece a expressão “estás aqui estás a achar”? pois parece que sucedeu ao autor do blogue Portugal Profundo processado por Sócrates. Mas também achamos que amanhã fará sol e vamos à praia).
Li essa saponária da filosofia passada (e suja), essa tentativa de regresso a um hipotético sentido original das palavras, (enroupadas pelos filósofos posteriores que lhes alteraram o significado), chamada “O Ser e o Tempo”. E a única coisa que apreendi foi a importância das aspas, para designar que as coisas não são bem assim. (Que há um sentido original da palavra e o seu movimento ao logo do tempo que lhe modificou precisamente o sentido). Conhecimento inútil pois os portugueses inventaram uma coisa muito melhor (caramba somos grandes! isto não é só fado, futebol, Fátima e fumeiro. É também actividade intelectual repenicada – atenção! repenicado não quer dizer duas vezes penico). Inventamos a locução “mesmo”. Em vez de escrever governo “socialista” para referir o actual poder, posso escrever sem medo de quiproquós governo socialista, pois tenho a expressão socialista mesmo socialista para referir a outra situação.
E não ficamos por aqui. No horizonte surge a expressão +1. Sente-se a sua simplicidade. São apenas duas teclas. Mas para explicar a sua importância terei que escrever um post.
Mister T.Pluvioso:Vamos direitos ao essencial: é preciso ler Maurice Blanchot. Talvez o único pensamento " crítico"- no sentido da definição empregue por Bataille na " Experiência Interior ", que sobreviveu à morte de Barthes, ao neo-espiritualismo de René Girard e ao tecno-cientismo de Michel Rifaterre . Como escreve Blanchot, o escritor que não pensa em fazer a Revolução, não o pode ser..É isso é um apelo para a acção, a ultrapassagem, a crítica da crítica... FAR
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