
Modelos de Rubbish Fairy/Matilde Lea
José Pinto Sá

Exposição de ilustrações de Ivone Ralha

Senhoras e senhores, fraternos companheiros, camaradas e amigos: é com todo o prazer que anunciamos que os míticos Los Santeros já regressaram da sua tournée do sul do Pacífico e que se preparam para uma inesquecível apresentação no Barreiro, a 17 de Setembro, no Largo dos Penicheiros. Será um evento imperdível onde, entre outras atracções, os mexicanos loucos irão estrear a sua primeira música nova em 15 anos (!). Nós, que os conhecemos de outros carnavais, estamos em condições de garantir que um espectáculo dos Santeros é uma experiência inesquecível de gozo, luxuria e decadência, que vale bem a pena a passagem do rio para a terra cinzenta. Fontes bem informadas garantiram-nos também que após este show irão actuar em Outubro no festival Barreiro Rocks, após o que se lançarão novamente à estrada, desta vez em terras espanholas. Nessa altura avisaremos.
Há quem diga que quem gosta de reggae prefere cannabis e a malta do ska vai mais para as anfetaminas. Este grupo é anterior a todas essas ondas. Gostavam era de cognac, que bebiam nos intervalos das suas actuações. Eram as famosas soirées nos hotéis, até altas horas da noite. Era o que estava a dar na época. São The Skatalites. É música jamaicana do início dos anos 60, que vai desde o ska-jazz instrumental ao rocksteady. Quem não os conhece ficará por certo surpreendido. Já passaram por cá. Completamente intemporal. Para dançar ou abanar o dedo, do pé ou da mão. Se gostar, seja rebelde. Mexa os dois.
In the Heart of the Moon é um disco novo da dupla Ali Farka Touré & Toumani Diabaté, lançado este verão. É um disco instrumental, de dois músicos do Mali. O primeiro é um veterano e também é conhecido como o John Lee Hooker africano. Toumani Diabaté é mais novo. É um exímio tocador de kora, uma espécie de harpa, muito comum na costa ocidental de África. Um bom disco de música africana, dançável apenas mentalmente. Um chillout muito especial.
Este é um oldie, but goldie. É um dos melhores discos dos Hawkwind, ainda com a formação inicial.Um dos álbuns mais tripados da época. Space Ritual é o paradigma do idealismo da contracultura que marcou os finais dos anos 60 e início dos anos 70. É um ábum ao vivo, gravado em Dezembro de 1972, que mostra toda a força da banda quando se apresentava em palco. E como estava tudo em altas vibes, por vezes até se esqueciam de parar de tocar. Coisas de freaks. Era um dos grupos preferidos das gangs dos ácidos da época. Também em Moçambique tinha o seu clube de fãns. O disco revela o seu som único, muito espacial, psicadélico e com garra. É raro nas lojas de discos mas encontra-se disponível nos melhores sites de música da net. For free!
Por último, algo de novo, também lançado este verão. Stephen Malkmus, o antigo líder dos Pavement, aparece desta vez com Face the Truth, o seu terceiro disco a solo, desde a interrupção/separação do grupo. Malkmus cria definitivamente um espaço próprio na selva dos newcomers da cena indie. O seu background como cantor/compositor/guitarrista dos Pavement, deu-lhe créditos importantes na sua actual carreira. Para quem não sabe, os Pavement eram uma banda muito mimada pela imprensa inglesa e norte-americana da especialidade. Tenho a impressão que os mimos continuam. Mas o disco Face the Truth é bom. É um disco adulto, de um músico conhece o seu métier. Enfim, alguém que nos sabe dar música.
Faz hoje 31 anos que foi assinado o acordo de Lusaka entre Portugal e a FRELIMO. As conversações que decorreram entre 5 e 7 de Setembro de 1974, prepararam o processo de descolonização, e fixaram a independência para 25 de Junho de 1975.Desde o dia 5 de Setembro que Lourenço Marques era palco de diversas manifestações de apoio à FRELIMO. No estádio da Machava, as negociações eram acompanhadas por milhares de pessoas em clima de festa. Era um comício contínuo. Foi organizado por sectores ligados à Frelimo, e apoiado por grupos de esquerda da capital, tais como os Democratas de Moçambique, o LEMA e a Associação Académica de Moçambique. Mas, à direita, as posições extremavam-se e tentavam travar o processo que conduziria Moçambique à independência. Muitos que não concordavam com o rumo que estava a levar a história, tentavam uma solução tipo Rodésia. A 7 de Setembro de 1974, adeptos do FICO, militares portugueses, muitos brancos e alguns negros ocuparam no Rádio Clube de Moçambique. Auto-denominavam-se Movimento Moçambique Livre, e atribuíam a sua revolta directa ao arrastar pelo chão de um bandeira portuguesa na baixa da cidade por simpatizantes da Frelimo. Mas, em causa, estava mesmo o acordo de Lusaka e a inevitabilidade da independência a 25 de Junho. Uma enorme multidão concentrou-se em frente à RCM. Foi o começo de 4 dias de conflitos. Um grupo de revoltosos assaltou a Penitenciária, e libertou todos os presos. Entre eles estavam vários agentes da PIDE/DGS. Alguns grupos chegaram mesmo a controlar os CTT e o Aeroporto. Em Lourenço Marques, a única cidade onde se registaram incidentes, o saldo foi trágico. Os confrontos e ataques entre os revoltosos e os apoiantes da Frelimo causaram um número indeterminado de mortos. Não há números certos, mas poderão ter morrido entre 300 a 1.500 pessoas.
Em Lusaka, as delegações de Portugal e da FRELIMO mantiveram o acordo. A 12 de Setembro chegou a Lourenço Marques o Alto-Comissário português, Vítor Crespo, e no dia seguinte, pisaram o solo da capital os dirigentes da Frelimo que iriam integrar o Governo de Transição. A tomada de posse ocorreu a 21 Outubro. Tinha como Primeiro-ministro Joaquim Chissano.
Estes são os factos. Se os viveu nesta altura em Moçambique, conte-nos a sua experiência na primeira pessoa. Se não, diga o que pensa sobre tudo isto.






Francisco Louçã, o único político português que admiro (muito devido a poses como esta) é o candidato do Bloco de Esquerda às presidenciais, vindo baralhar o sentido de voto do escriba. O que nos parece é que esta candidatura vêm confirmar que teremos duas eleições presidênciais numa só: aquela que vai escolher o Presidente da República entre Soares e Cavaco, e a continuação do duelo fratricida entre os irmãos desavindos da Esquerda. Neste aspecto, de admirar a coragem do PCP em lançar o seu secretário-geral numa campanha que se prevê tão bipolarizada, logo tão propícia ao voto útil, a obrigar o BE a responder na mesma moeda. Ganha a Democracia por ter várias figuras de primeiro plano e de peso político inegável na campanha, esperemos que se aproveite para debater o que interessa em vez dos habituais ataques e fugas para a frente. Infelizmente o professor de Boliqueime nunca se distinguiu pelo sentido democrático e de debate. Veremos. A candidatura de Louçã despertou comentários sui generis por essa blogosfera. Então não é que os mesmos que ontem acusavam o BE de ser proto-estalinista, de ser uma clique de amigos onde mandam sempre os mesmos, de não se renovar, são os que hoje dizem que o facto de ter havido oposição interna à nomeação de Louçã prova que o Bloco é um partido igual aos outros, e falam mesmo do início do seu fim? A coerencia e o ódio ressabiado de facto nunca rimaram. É que há mesmo quem diga que o objectivo de Louçã é a derrota de Soares, o único lider da Esquerda capaz de levar o BE para o governo. Mas eles lá sabem!
There’s a moon over bourbon street tonight


Um excelente artigo do José Pestana, da Agência Lusa, sobre o caos em Nova Orleães e as questões de raça e classe.
A calamidade causada pelo furacão Katrina trouxe à superfície as divisões raciais e de classe que continuam a ser uma característica da sociedade norte-americana.
Se é verdade que as câmaras de televisão podem distorcer a verdade ao concentrarem-se num aspecto de uma realidade mais vasta, em Nova Orleães não se pode contornar o facto de serem negros e pobres a esmagadora maioria dos deslocados que não têm para onde ir. Centenas, senão milhares, de norte-americanos de todas as raças perderam os seus haveres e familiares em várias zonas do Alabama e Mississipi, mas são as imagens da cidade de Nova Orleães com milhares de negros isolados, desesperados e em alguns casos a pilharem lojas, farmácias e lojas de armas de fogo que têm enchido os noticiários das cadeias de televisão, fazendo lembrar cenas até agora vistas em locais distantes como a Libéria.
Isto reflecte claramente a pobreza da população negra nas grandes zonas urbanas dos Estados Unidos, tornada mais visível em Nova Orleães por ser uma das cidades norte-americanas onde a maioria da população é negra e onde 33 por cento
da população total vive na pobreza. "Nova Orleães é uma cidade dividida em duas: uma relativamente rica, pequena, e bonita, que é predominantemente branca, e outra que é pobre, grande e feia e é quase totalmente negra", escreveu o comentarista Eugene Robinson.
Dados estatísticos indicam, com efeito, que 67 por cento por cento da população de Nova Orleães é de raça negra. Das sete zonas mais afectadas pelas inundações, cinco são de maioria negra e a pobreza, aí, abrange 34,6% da população, segundo as estatísticas oficiais. Estes números, no entanto, não reflectem os altos níveis de pobreza em certos "bairros negros" da cidade afectados pelas cheias. Na zona central da cidade (Central City) que está debaixo de água, 87 por cento da população é de raça negra e 50 por cento vive na pobreza. Na zona de "Lower Ninth Ward" 98 por cento da população é negra e 36 por cento vive na pobreza. Em "Bywater" 61 por cento da população é negra e 39 por cento é pobre.
A única excepção nesta tendência é o bairro de Gentilly Terrace onde 70 por cento da população é negra e o nível de pobreza é de 16%, um nível muito abaixo do dos outros bairros de maioria negra mas mesmo assim acima da média nacional de pobreza de 12,4 por cento.
Quando se compara este quadro com o dos "bairros brancos" afectados pelas cheias, as diferenças são notórias. Assim, por exemplo, no bairro de Lakeview, submerso pelas águas, 94 por cento da população é branca mas apenas 5 por cento é considerada pobre. Houve destruição nessa zona mas os habitantes há muito que estavam em segurança noutras partes do estado ou do país, beneficiando de uma maior mobilidade dada pela sua maior riqueza e demonstrando que, ao contrário do mito, as tragédias naturais não tratam todos por igual. "Esta catástrofe serviu para deitar luz sobre a miséria e constitui um comentário infeliz sobre raça e classe," escreveu o comentarista Bob Faw
Devemos também reflectir mais uma vez sobre as consequências da nossa atitude perante o Ambiente sobre nós próprios, mais uma vez trágicamente expostas em toda a dimensão da catástrofe. Num excelente editorial no PÚBLICO de hoje, Nuno Pacheco diz tudo: "A destruição de Nova Orleães começou antes de o Katrina chegar (...) A falta de investimento no reforço dos diques (...), as políticas urbanísticas expansionistas à custa da destruição de zonas húmidas e do litoral, a extracção sistemática de gás e de petróleo, a contrução, em parte desordenada, de sucessivos nós de transportes ferroviários, rodoviários, marítimos, fluviais e aéreos muito fizeram para que se viva o drama presente (...) O Mississipi (...) viu o seu delta afundar-se cerca de 90 centimetros em 100 anos". Eis algo que intuitivamente reconhecemos: falta de investimento; destruição da zona costeira; extracção de matérias-primas; construção desenfreada- não vos lembra algo muito próximo? Não admira, o projecto é o mesmo em todo o lado, só mudando a graduação, que obviamente tem o seu auge nos Estados Unidos. Eis a realização do sonho capitalista, eis o projecto ultraliberal, eis o mito de que o mercado se auto-regula destruidos de um ápice por um vendaval de verdade.
No meio do caos e da devastação da maior tragédia urbana de que há memória não podemos vestir a máscara da solidariedade hipócrita quando ela só nos serve para não pensar, para tratar tudo como uma inevitabilidade. Temos de questionar. Temos de afirmar que está tragédia é um retrato da falência da América. Temos de dizer que esta tragédia põe a nú as brutais assimetrias sociais de uma sociedade: os ricos fugiram, os pobres, os milhares de pobres, não puderam fugir, e são eles que sobrevivem no meio do lixo, dos escombros, da urina e das fezes do Dome, são eles que fogem dos tiros, são eles que atiram, são eles que tentam salvar os filhos, os pais, os avós, que passam fome e sede. E são milhares, milhões, como sabe toda a gente que se informa sobre o que são realmente os Estados Unidos da América para além da propaganda e do irrealismo das luzes cinemáticas e televisivas. Este país tem uma taxa de pobreza na ordem dos 25% (superior, imagine-se, a Portugal); este país tem uma educação e serviço de saúde públicos miseráveis, enquanto quem pode pagar tem acesso ao que de melhor existe no mundo; este país não tem qualquer tradição de assistencialismo social, o que se reflecte em todo o processo pré e pós passagem do Katrina. E este é o país que uns querem tomar como modelo, inebriados pela força, pelo poder, pela opulência, pela aparência, esquecendo-se que não há sociedade sem pessoas e que estas deveriam ser a razão de ser daquela, e não o contrário.
CANTO DE OSSANHA
Só mesmo os de fora é que têm uma visão optimista da Europa. Pelo menos há um. É coreano, economista, e gostaria de reencarnar europeu. Chegou a esta conclusão depois de conhecer os quatro cantos do mundo. Mesmo o facto de o pessimismo aumentar na Alemanha, França e Itália, não o demove. Para ele Europe is the greatest. A estória do coreano vem no Financial Times, que se esqueceu do pessimismo português. Pelo menos neste artigo.