domingo, 15 de junho de 2008

França: Rolar de cabeças na TF-1 lança Sarkozy nos braços do rei do Betão!

" Nunca janto melhor nem durmo em paz celestial senão
quando me encharco durante o dia naquilo que os
idiotas chamam crimes".
Marquês de Sade, A filosofia na alcova. O.C. Sade. XXV. J.J.Pauvert Éditions. FR

Sarko, o obsecado border-line, Presidente da República francesa, empertigou-se e faz " misérias " no Panorama do Audio-visual Francês, o PAF. Queda abissal nas sondagens, governo de bric-à-brac, contradições superlativas e vontade de fazer a vontade aos multimilionários e a Bush: eis as efectivas razões para uma intervenção em profundidade- a maioria dos grandes Médias franceses estão privatizados…-nos organigramas e nas equipes dos líderes de Informação, a poderosa TF1, considerada a maior TV da Europa, no Le Figaro, o diário da Direita moderna e nas cadeias de Rádio mais ouvidas, a RTL e Europe-1.

Para tal operação, Sarko tinha que prometer o desmantelamento da TV estatal, a France 2 e suas derivadas, e conceder aos privados mais partes do Mercado de Publicidade e facilidades na introdução da mesma nos intervalos dos filmes da noite….Todo um programa maquiavélico e a ser posto em prática com a demissão de Patrick PoivreArvor (PPDA) de responsável máximo do Jornal das 20 horas da TF-1, cargo onde brilhou durante 21 anos de sucesso de audiências, de iconoclastia, independência e histórias maravilhosas e picantes de alcova…PPDA, como é conhecido, foi um génio do Jornalismo francês e mundial, a que se juntam grandes qualidades de escritor e animador de dois grandes programas culturais.

A sua demissão " forçada " de TF1, a cadeia do multimilionário rei do Betão, Martim Bouygues, pode ser a moeda de troca de uma operação que, o Libération taxa como um " dilúvio de compromissos e de colisões " entre os dois amigos cúmplices. Boyugues tem que " afagar " Sarko para este lhe dar de mão-beijada a Areva, a grande companhia construtora do Nuclear Civil. Um Dallas à francesa…O lugar de PPDA vai ser ocupado por Laurence Ferrari, que as má-línguas, apresentavam como a namorada preferida de Sarko antes deste encontrar Carla BruniSerge Raffi, o redactor-em-chefe do Nouvel Observateur, diz que o gesto de evicção de D´Arvor pode significar " um frete " da direcção da TF-1/ M. Bouygues para com Sarko, as suas ambições e interesses políticos fundamentais.
FAR

Flor negra

"(...) um encontro fortuito com um transeunte que, após um choque forte, deixa nas nossas mãos, distraído, uma flor negra. E quando finalmente nos levantamos para a devolver já o transeunte, apressado, desapareceu. Começamos a correr com a flor negra na mão - não nos pertence, poderá fazer falta a quem a perdeu -, mas nada, nenhum rasto:o estranho transeunte desapareceu, evaporou-se. E nas nossas mãos está a flor negra. O movimento seguinte poderá até parecer um não movimento -a indecisão-, mas rapidamente o desconforto deixará de ser um pormenor e passará a ser o essencial: torna-se urgente desfazermo-nos daquela flor repelente. Pois bem, estamos a uns centímetros de um caixote de lixo público, levantamos a tampa e com a mão direita largamos a flor. Mas algo acontece: a flor preta não sai da mão, está colada, já não pode ser expulsa, só se deixares também cair o braço. Os dias seguintes deixarão entrar inúmeras tentativas de, primeiro, expulsar a flor preta, depois, de a esquecer. Porém, a certa altura, existirá, de uma ponta à outra, uma mudança no organismo, semelhante à mudança de moeda num país, que surge com outros valores, outras referências; e o homem resigna-se. Já não há flor preta; e os médicos chamam a esse conjunto de factos inverosímeis um nome lógico e antigo: doença. "
In: Aprender a rezar na Era da Técnica, Gonçalo M. Tavares

sexta-feira, 13 de junho de 2008

Tóni Negri: " Foucault foi um marxista revisionista inteligente "


" Estava em Paris quando Foucault morreu. E recordo-me da enorme pressão para o fazerem anti-marxista. E para tentarem apresentar o seu pensamento como uma premissa de uma concepção neo-liberal da história. Vinte anos depois começamos a apurar que ele era na realidade um marxista revisionista inteligente.

"A classe operária é hoje um conceito muito estreito para poder fundar uma nova subjectividade revolucionária. Urge tentar acrescentar a essa nascente nova subjectividade revolucionária, não só a classe operária mas também o trabalhador intelectual, o funcionário dos serviços e largas franjas do campesinato. Foucault tinha antecipado esta realidade, de certa forma.

"Com efeito, Foucault tinha compreendido que o poder do Capital controla a vida dos operários na fábrica, mas age também sobre toda a sociedade. Estas dinâmicas ideias surgiram também na Itália nos anos 70, tendo contribuído para a realização do revisionismo de esquerda do marxismo. Foucault, do meu ponto de vista, foi alguém que viu no plano teórico, o que outras correntes conseguiram reinterpretar de uma forma política; entra no post-modernismo comunista dessa forma "
In " Multitudes ", revue théorique franco-italienne
FAR

Sinais


Desenho Maturino Galvão

Estocolmo, Maio, 5 da manhã (3)


Foto Sérgio Santimano

Fernando Pessoa


Álvaro de Campos
Cruzou por mim, veio ter comigo, numa rua da Baixa

Cruzou por mim, veio ter comigo, numa rua da Baixa Aquele homem mal vestido, pedinte por profissão que se lhe vê na cara, Que simpatiza comigo e eu simpatizo com ele; E reciprocamente, num gesto largo, transbordante, dei-lhe tudo quanto tinha (Excepto, naturalmente, o que estava na algibeira onde trago mais dinheiro: Não sou parvo nem romancista russo, aplicado, E romantismo, sim, mas devagar...).

Sinto uma simpatia por essa gente toda, Sobretudo quando não merece simpatia. Sim, eu sou também vadio e pedinte, E sou-o também por minha culpa.
Ser vadio e pedinte não é ser vadio e pedinte: E' estar ao lado da escala social, E' não ser adaptável às normas da vida, 'As normas reais ou sentimentais da vida - Não ser Juiz do Supremo, empregado certo, prostituta, Não ser pobre a valer, operário explorado, Não ser doente de uma doença incurável, Não ser sedento da justiça, ou capitão de cavalaria, Não ser, enfim, aquelas pessoas sociais dos novelistas Que se fartam de letras porque tem razão para chorar lágrimas, E se revoltam contra a vida social porque tem razão para isso supor.

Não: tudo menos ter razão! Tudo menos importar-se com a humanidade! Tudo menos ceder ao humanitarismo! De que serve uma sensação se uma razão exterior a ela?
Sim, ser vadio e pedinte, como eu sou, Não é ser vadio e pedinte, o que é corrente: E' ser isolado na alma, e isso é que é ser vadio, E' ter que pedir aos dias que passem, e nos deixem, e isso é que é ser pedinte.

Tudo o mais é estúpido como um Dostoiewski ou um Gorki. Tudo o mais é ter fome ou não ter o que vestir. E, mesmo que isso aconteça, isso acontece a tanta gente Que nem vale a pena ter pena da gente a quem isso acontece.

Sou vadio e pedinte a valer, isto é, no sentido translato, E estou-me rebolando numa grande caridade por mim.

Coitado do Álvaro de Campos! Tão isolado na vida! Tão deprimido nas sensações! Coitado dele, enfiado na poltrona da sua melancolia! Coitado dele, que com lágrimas (autenticas) nos olhos, Deu hoje, num gesto largo, liberal e moscovita, Tudo quanto tinha, na algibeira em que tinha olhos tristes por profissão
Coitado do Álvaro de Campos, com quem ninguém se importa! Coitado dele que tem tanta pena de si mesmo!

E, sim, coitado dele! Mais coitado dele que de muitos que são vadios e vadiam, Que são pedintes e pedem, Porque a alma humana é um abismo.

Eu é que sei. Coitado dele! Que bom poder-me revoltar num comício dentro de minha alma!
Mas até nem parvo sou! Nem tenho a defesa de poder ter opiniões sociais. Não tenho, mesmo, defesa nenhuma: sou lúcido.

Não me queiram converter a convicção: sou lúcido!
Já disse: sou lúcido. Nada de estéticas com coração: sou lúcido. Merda! Sou lúcido.

quinta-feira, 12 de junho de 2008

Do tempo..

ENQUANTO NOS PERDEMOS NA RECORDAÇÃO

Este é o momento
Em que já não se confunde o coração
Com axónios e sinapses
Este é o momento que ri
De todas as falsas interpretações
Sobre o tempo em modo biológico
Em que a intuição diz basta!
De teorias incompletas
De falsas explicações
Este é o vento que sopra
O maior de todos, e o menor
Que encontra na recordação a grandeza
Se o não compreendes
Tu não o compreendes
Se não plantas, enfim
Serás o ser que és, simplesmente
Uma recordação de futuro nesta farsa
A miséria incrustada num ponto de nós
Serás carne e nada, porque nada
É o zero de sentimento, o menos que um
Será esse pequeno instante
E serás sempre assim por diante
Enquanto nós, minúsculos e irrelevantes
Tentaremos a quimera, tentaremos ser grandes
Haverá sempre aquele ponto mísero de luz
Haverá sempre a esperança, ou uma só esperança
Existirão as teorias dos psicólogos rebatidas por uma só experiência
E um campo de prazer, e um amor, um só amor
Sempre, sempre um só amor
Haverá, um microssegundo de esperança
Um momento sistémico que transformará
Todos os momentos em réplicas do momento da esperança
Mesmo que saibamos que não existe verdadeira partilha
Este é o momento em que dizemos não!
Ao que as hormonas ordenam
Esse sempre procurado momento de paz
O tesouro guardado na nossa faringe
Em gemidos de amor se transforma no real
Esse sentimento ancestral, Essa esperança
Em modo incompleto, inútil, de ser homem
A pretensão infantil de ser, este símbolo
Esta maldição eterna, perene e imbecil
Uma comédia negra mascarada de tragédia
Imperfeita, irreal, impossível
Se do poema se fez nada, do suspiro fez-se tudo
Todo o amor é superação, pois
É aquilo de que necessito
Um hino à completude, uma brincadeira
O sentido, uma ilusão boa, brincadeira
Assim continuamos, sentindo o que o corpo
Nos obriga a sentir, aquilo que a alma
Nos obriga a enganar, aquilo a que chamamos
O sentido, uma anedota de lindas cores
Um beco sem saída, uma coisa linda
Um certo brilho no olhar, um andar
Um bambolear inesquecível, uma forma
Entre o sim e o não está o Todo, eu vejo-o
Naquela forma bamboleante de Homem, não
De Mulher, de anjo, de deusa de tudo
Eu vejo-a, e será o momento, o coração
Obrigado por impulsos sinápticos, eu dizia
Que o coração me transporta em frente, ao instante
Do Todo, tudo o que significa, o magnífico
A compreensão do instante como instantâneo
Meu irmão! Meu amor, meu doce e terno amor
Instantâneo, minha querida e doce forma de vida
Agora sim, os amantes poderão ser tristes
Não existe qualquer contradição, meu amor
Afinal preencher os bocados que nos faltam não é
A mesma coisa que nos completarmos, sabes bem
Que não é; e que a recordação do momento
É tão forte que toma o lugar do momento
Propriamente dito. Enquanto nos perdemos
Na recordação somos como deuses, somo como
Tudo, em nós tudo prepassa, tudo se faz
Verdadeiro, em nós toda a beleza aparece
Consumindo-se em autofagia, e meu amor
É isso que significa a recordação do momento

Nada de preocupante se passa

Como é evidente, nada se passa de preocupante neste país, se exceptuarmos a equipa... Ah, a equipa joga e ganha...!

Léo Ferré

Les Anarchistes

TV Zizek (2)

Rui Knopfli

II. PÁTRIA

Um caminho de areia solta conduzindo a parte
nenhuma. As árvores chamavam-se casuarina,
eucalipto, chanfuta. Plácidos os rios também
tinham nome por que era costume designá-los.
Tal como as aves que sobrevoavam rente o matagal

e a floresta rumo ao azul ou ao verde mais denso
e misterioso, habitado por deuses e duendes
de uma mitologia que não vem nos tomos e tratados
que a tais coisas é costume consagrar-se. Depois,
com valados, elevações e planuras, e mais rios

entrecortando a savana, e árvores e caminhos,
aldeias, vilas e cidades com homens dentro,
a paisagem estendia-se a perder de vista
até ao capricho de uma linha imaginária. A isso
chamávamos pátria. Por vezes, de algum recesso

obscuro, erguia-se um canto bárbaro e dolente,
o cristal súbito de uma gargalhada, um soluço
indizível, a lasciva surdina de corpos enlaçados.
Ou tambores de paz simulando guerra. Esta
não se terá feito anunciar por tal forma

remota e convencional. Mas o sangue adubou
a terra, estremeceu o coração das árvores
e, meus irmãos, meus inimigos morriam. Uma
só e várias línguas eram faladas e a isso,
por estranho que pareça, também chamávamos pátria.

De quatro paredes restaram as paredes. Com as folhas
de zinco e a madeira ferida dos travejamentos
perfaziam uma casa. Partes de um corpo
desmembrado, dispersas ao acaso, vento e silêncio
as atravessam e nelas não dura a memória

que em mim, residual, subsiste. Sobre escombros deveria,
talvez, chorar pátria e infância, os mortos que
lhe precederam a morte, o primeiro e o derradeiro
amor. Quatro paredes tombadas ao acaso e isso bastou
para que, no que era só mundo, todo o mundo entrasse

e o polígono demarcado, conservando embora
a original configuração, fosse percorrido por
um arrepio estrangeiro, uma premonição de gelos
e inverno. Algo lhe alterara imperceptivelmente
o perfil, minado por secreta, pertinaz enfermidade.

Semelhante a qualquer outro, o lugar volvia meta
e ponto de partida, conceitos que, como a linha imaginária,
circunscrevem, mas de todo eludem, o essencial,
Ladeado de sombras e árvores, o caminho de areia,
que se dizia conduzir a parte alguma, abria

para o mundo. A experiência reduz, porém,
a segunda à primeira das asserções: pelo mundo
se alcança parte nenhuma; se restringe ficção
e paisagem ao exíguo mas essencial: legado
de palavras, pátria é só a língua em que me digo.


José Pinto de Sá

Ainda Dili (27)


Pintura João de Azevedo

quarta-feira, 11 de junho de 2008

Pode-se trazer o som de um filho a crescer
Num saco de mão
Pensa aquele que vê o mundo a tornar-se outro.
Mas mesmo com muitos invernos de treino
E com o corpo calejado de imobilidade
Pensar não é necessariamente acertar no alvo.
É isso a tontura da existência.

In: Caixinha com rodas, ed.GEIC

Rússia: Os " ladrões tornaram-se conservadores …"


O futuro do terceiro período do post-sovietismo é hoje escalpelizado pelo grande jornalista sénior do Libération, Bernard Guetta. O famoso editorialista lança suspeitas sobre a força da aliança entre Poutin e Medvedev. Sublinha que o novo Presidente russo quer implantar, de facto, um Estado de Direito, conforme os canônes do Ocidente.Lembra as palavras do recém-eleito PR russo em Berim: " :Defendemos, acima de tudo, o modelo do estado de Direito e o respeito das leis internacionais ".
A formação de uma OPEP-bis de parceria com o Irão, a Líbia e a Venezuela pode estar comprometida, portanto. A não ser que o tonitruante PR iraniano consiga realizar um golpe de Estado deslizante. E a China, a Rússia e os banqueiros árabes decidam investir massivamente na modernização do aparelho de extracção petrolífero da antiga Pérsia.
Por isso, a eleição de um democrata para a Casa Branca se torna muito importante para a geopolítica mundial.A mundialização agiganta-se e os novos dirigentes russos parecem estarem cientes da responsabilidade política que lhes pesa nos ombros. A NATO deixou de ser uma ameaça para a Rússia, outra das viragens estratégicas que Medvedev sustenta e quase que apadrinha.

Cet horizon paraît tellement improbable que le scepticisme n’est pas interdit, mais écoutons ce quadragénaire souriant, poupin, s’adresser, jeudi, à la crème des élites allemandes. «La Russie et l’Allemagne, lance-t-il d’emblée, sont deux pays européens» et, pour bien faire comprendre qu’il ne s’agit pas là d’un constat géographique mais d’un choix politique, il enchaîne : «Nous sommes, au-dessus de tout, attachés à l’Etat de droit et au respect de la loi internationale, par les grandes puissances avant tout». «La fin de la Guerre froide, poursuit-il, permet de bâtir une véritable coopération d’égaux entre la Russie, l’Union européenne et l’Amérique du Nord, les trois branches de la civilisation européenne». «Nous avons besoin, martèle-t-il, de débattre, aujourd’hui, d’une unité de toute l’aire euratlantique, de Vancouver à Vladivostok.» Non seulement Dmitri Medvedev plaide l’organisation du continent Europe mais, loin d’en revenir à l’ambition soviétique d’un «découplage» entre l’Europe et l’Amérique, il veut associer l’Otan, donc les Etats-Unis, à la négociation de ce «pacte régional» de sécurité européenne qu’il est venu proposer à Berlin. La Russie, dit-il en clair, est part d’un monde occidental à l’unité duquel elle veut contribuer dans un siècle où tout menace la prééminence de l’Occident.

Des mots ? Oui, mais outre que les mots comptent en politique et que la Russie a autant peur de la Chine que du monde arabo-musulman, écoutons la suite : «Comme le dit John Le Carré, la Russie est sortie du froid. Ayant abandonné le système soviétique et toute idée de le restaurer, elle place son avenir dans l’innovation […] Son haut niveau de stabilité financière, sociale et politique ouvre de nouveaux horizons à un investissement moderne et fiable [et] notre objectif n’est pas seulement d’atteindre une haute qualité de croissance économique. Il est, également, de transformer la structure entière de notre société en soutenant le développement de la classe moyenne, solide base sur laquelle construire la démocratie».

Là, l’oreille se tend. C’est là que Dmitri Medvedev retient vraiment l’attention car il passe, là, des souhaits aux faits. L’argent russe, cette force qui a tellement soutenu sa candidature, est devenu demandeur de lois et de règles afin de consolider ses droits de propriété, attirer des capitaux occidentaux et pouvoir, aussi, s’investir en Occident. Butin pris, les voleurs sont devenus conservateurs. Comme ces nouvelles classes moyennes que l’on voit prendre des vacances familiales aux quatre coins de l’Europe, ils se vivent comme Occidentaux et le successeur de Vladimir Poutine - un juriste, pas un homme du KGB - est à l’exacte image de ces yuppies russes, trop jeunes pour avoir été façonnés par le communisme et dont toutes les aspirations sont occidentales.
Dmitri Medvedev exprime une nouvelle Russie - celle qui est, effectivement, part de l’Occident.

Bernard Guetta est membre du conseil de surveillance de Libération.
FAR

Ontem foi Dia da Raça?


(com a devida vénia ao Jumento)

As comemorações do Dia de Portugal ficaram marcadas por uma expressão de Cavaco Silva a propósito da paralisação dos camionistas. O Presidente da República disse que não comentava a situação porque estava a comemorar o «Dia da Raça», uma expressão utilizada no tempo do Estado Novo para assinalar o 10 de Junho.

Estocolmo, Maio, 5 da manhã (2)


Foto Sérgio Santimano

Sinais


Desenho Maturino Galvão

Professor Karamba (ou "o mercado é sagrado e trata de tudo")

"Será possível liberalizar os combustíveis, impedindo qualquer cartel, de modo a que o efeito previsível seja, até, o da baixa dos preços"

Durão Barroso, 18 de Julho de 2002 ao Público. Como ministra das Finanças, a senhora que não se consegue distinguir de Sócrates.

TV Zizek (1)

terça-feira, 10 de junho de 2008

China: Missão eco-cultural francesa mostra-se confiante

Uma missão de historiadores e economistas de alto nível francesa visitou a China, sobretudo a do interior, há umas semanas. Fazem um balanço muito positivo, conforme se assinala neste artigo hoje publicado no Le Monde. Apesar de ter uma economia socialista de Mercado, a China ultrapassou o escalão do Sub-Desenvolvimento e detém 25 por cento das reservas mundiais de moeda estrangeira.
LE MONDE 10.06.08 14h01

L'actualité se chasse d'elle-même ; épinglée sur la question du Tibet, la Chine est saluée par la presse internationale pour la rapidité, l'efficacité et la transparence de l'intervention des autorités face à la catastrophe provoquée par le tremblement de terre du Sichuan.
Déjà, New York fait pâle figure comparée à l'incroyable Shanghaï, où les gratte-ciel poussent comme des champignons de toutes les couleurs en se lançant des défis de beauté architecturale. De la dictature communiste, il reste l'autorité centrale qui impose et organise l'économie socialiste (ou plutôt impériale) de marché. Elle permet en effet de raser d'un coup des quartiers insalubres, mais pour les remplacer par des immeubles en hauteur de bonne facture avec tout le confort moderne, à commencer par la climatisation.

Même dans la Chine profonde, les magasins regorgent de produits de base et de superflu, et les policiers rencontrés, comme partout ailleurs dans le monde, y sont plutôt rares et généralement équipés seulement d'un téléphone portable. C'est dire qu'il convient de réviser nombre de nos clichés sur la Chine.

Tout d'abord, ce n'est plus un pays sous-développé. Les standards internationaux montrent que la Chine avait, en 2006, un PIB par habitant de 7 500 dollars (soit dix fois plus en réel qu'en 1980), c'est-à-dire le niveau de la France à la fin des années 1950 ou du Portugal en 1970. Notre niveau de vie serait aujourd'hui quatre fois supérieur à celui de la Chine. Mais, si l'on fait des calculs comme les aimait Jean Fourastié, en ramenant le salaire moyen d'un employé à la valeur locale de certains produits communs à la France et à la Chine, l'écart de niveau de vie se situe plutôt entre deux et trois. C'est dire que le taux de change d'un à dix entre le yuan et l'euro est largement sous-évalué pour le yuan, mais c'est ce qui a notamment permis à la Chine de dégager d'énormes excédents extérieurs, au point qu'elle détient aujourd'hui le quart des réserves mondiales de change.

Au rythme actuel (7 % à 8 % par an de croissance du PIB par habitant, contre 1 % à 2 % chez nous), les Chinois nous auront rattrapés avant 2030. Ils nous devancent déjà en ce qui concerne les deux-roues : à Shanghaï et ailleurs, les vélos et les scooters sont silencieux car électriques.
La Chine s'enrichit, et le monde ne peut que s'en réjouir. Elle investit dans l'éducation de sa jeunesse et dans des infrastructures modernes ; mais cela ne suffira pas car, avec 1,75 enfant par femme, la relève des générations n'est pas assurée, et il lui faut donc avancer à pas de géant avant d'affronter les conséquences de son inéluctable vieillissement.

Ce formidable effort d'investissement dans les infrastructures et les équipements collectifs a été rendu possible grâce à une épargne équivalente à 40 % du PIB et entièrement canalisée par le système bancaire d'Etat. Une fois passés les Jeux olympiques de cet été et l'Exposition universelle de Shanghaï en 2010, la Chine trouvera un formidable relais de croissance dans la satisfaction d'une demande intérieure jusqu'ici volontairement bridée.

Son développement rapide profite surtout à la Chine du littoral (qui, avec 14 % de l'espace, concentre 43 % de la population, 62 % du PIB, 76 % des investissements étrangers et 93 % des exportations). Il est vrai que la Chine de l'intérieur est moins bien lotie, et que celle de l'ouest, où ne vivent que 11 % des Chinois, est en retard, avec 7 % du PIB. Mais, bonne nouvelle, les Chinois pourront se lancer bientôt à la conquête de leur Far West, qui représente 56 % de leur territoire.
Mais est-elle différente de celle que les instituteurs de la IIIe République ont imposée sans ménagement aux enfants qui s'avisaient de parler breton dans les cours de récréation ? Il y a sans doute des émeutes et des répressions choquantes pour un Occidental éclairé du XXIe siècle. Mais la remise au pas sanglante de la Vendée royaliste sous la Révolution devrait nous rendre plus modestes dans la critique d'un empire où les Hans comptent pour 92 % de la population, mais reconnaissent les coutumes et les droits des 55 minorités qui représentent seulement 100 millions d'habitants sur un total de 1,3 milliard.

Bref, nous sommes optimistes sur le genre humain quand nous voyons l'exemple de la Chine, qui réussit à se moderniser en s'appuyant sur son passé, sa culture et des valeurs ancestrales portées sur le travail. Parions que l'Empire du milieu saura continuer à se libéraliser (les Chinois peuvent voyager à leur guise et se mettre en ménage comme bon leur semble), tout en restant suffisamment autoritaire pour traiter de manière efficace les graves problèmes de pollution, de congestion urbaine, de corruption et de conditions sociales qui, là comme ailleurs, font la "une" des journaux.
FAR

segunda-feira, 9 de junho de 2008

Estocolmo, Maio, 5 da manhã (1)


Foto Sérgio Santimano

Da Capital do Império

Olá,

Agora que a Hilária foi à vida venho hoje dar dois conselhos àqueles que se interessam pelas eleições deste lado do lago:
1) Ignorem notícias/especulações sobre a possibilidade da Hilária se tornar candidata à vice-presidência com o Barack Obama; a Hilária tem tantas chances disso acontecer como eu tenho de ganhar a lotaria
2) Ignorem a tentação de olharem para as sondagens que dizem que um dos dois candidatos tem mais apoio do que o outro à escala nacional. Essas sondagens em termos práticos não têm importância nenhuma.
Passo a explicar:
As eleções presidenciais americanas são disputadas Estado por Estado. Cada Estado elege um número de delegados ao Colégio Eleitoral proporcional à sua população. Quem vence num Estado ganha todos os delegados desse Estado ao Colégio Eleitoral, que tem um total de 270 delegados.
Uma olhadela ao mapa dos Estados Unidos mostra que nas últimas eleições John Kerry venceu em Estados que dão um total de 252 delegados. Primeira tarefa de Obama: garantir a vitória nesses Estados. É possivel? Talvez, mas vai haver luta cerrada pelos Estados de Michigan, Pensilvânia e Wisconsin, que Kerry venceu e onde Obama tem fraquezas (o tal eleitorado branco proletário e rural).
Segunda tarefa de Obama, se garantir esses 252 delegados: procurar outros 18 delegados e, para isso, tomem atenção ao Obama a concentrar a sua campanha no Iowa, Virginia, Carolina do Norte, Novo Mexico, Nevada, Colorado e Ohio. Alguns deles, como a Virginia, são tradicionalmente Estados republicanos mas na Virginia Obama está convencido que tem chances de ganhar porque o perfil demográfico do Estado está a mudar favorecendo as tais “elites brancas “ que gostam do Obama e que em conjunto com o eleitorado negro lhe podem dar a vitória. Noto que Obama esteve na Virnigia no dia a seguir à sua vitoria eleitoral e que hoje segunda-feira vai também fazer um comício nesse Estado.
É por causa desses Estados que a Hilária tem tantas chances de ser nomeada candidata à vice-presidência como eu tenho de ganhar a lotaria. O Obama vai escolher alguém que o ajude a ganhar votos nesses Estados ou ainda na Geórgia, outro dos que ele poderá mudar a seu favor se conseguir registar cerca de 600 mil negros que não estão registados como votantes, ou então alguém que o ajude a minimizar os receios/apreensões com a inexperiência de Obama a nivel de segurança/política externa. Figuras a ter em conta: Governadores da Pensilvânia e Ohio, o antigo senador pelo Estado da Geórgia, Sam Nunn (um perito em questões de segurança exerna) . Ou talvez a governadora do Kansas, conservadora da “América profunda” capaz de acalmar não só os inseguros como também apaziguar as democratas ofendidas com a derrota da rainha Hilária.
Tomem outra coisa em atenção: nas últimas eleições 13 Estados foram decididos por um máximo de vantagem de sete por cento. A esmagadora maioria desses por menos do que isso. O que siginifica que podem mudar para um lado ou outro.
Esses Estados são: Colorado, Florida, Iowa, Michigan, Minesota, Nevada, New Hampshire, New Jersey, New Mexico, Ohio, Oregon, Pensilvânia e Wisconsin.
Com à vontade posso avisar-vos que as eleições vão ser ganhas ou perdidas nesse Estados. Talvez ainda se possa contar a Florida, Virginia e mesmo o Missouri, que também poderão estar em jogo. Um máximo de 16 Estados. O resto é paisagem eleitoral.
Abraços

Da capital do Império

Jota Esse Erre

Sinais


Desenho Maturino Galvão

domingo, 8 de junho de 2008

Ainda Dili (26)


Pintura João de Azevedo

Sinais


Desenho Maturino Galvão

A longa maratona da derrota de Hillary Clinton



O NY Times de hoje publica uma longa e sensacional reportagem sobre a derrota dos Clinton. É uma peça magistral.Os segredos do uso da Blogosfera- e-mails e outro tipo de mensagens-foram decisivos para a vitória surpreendente de Barack Obama, que os meteu a funcionar com um ano de avanço, segundo revelam os jornalistas Peter Baker e Jim Rutenberg. " O suporte, os incentivos de Bill não deram resultados positivos. Foram uma m…", dizia um apaniguado nos últimos dias a anteceder a declaração de insucesso.
" A campanha de Hillary Clinton foi construída na base da maior afirmação de força. Os estrategistas acreditavam que os quatro primeiros tempos da votação para a indigitação seriam decisivos e que ela iria concluir/vencer a nomeação a 5 de Fevereiro, quando mais de 20 Estados estavam a elaborar o escrutínio eleitoral ".

NY Times: www.nytimes.com/2008/06/08 us/politics/08recon.htlm?_r=1&hporef=slogin

FAR

Obrigado anónimo


Quero desde já agradecer ao anónimo que originou toda esta barracada. Trouxe-me a vontade que faltava para voltar ao activo.

Acima temos uma imagem do anónimo * . Esta é uma private joke que só o Manuel entenderá.

* - e assim finalmente o conceito de anónimo deixa de fazer sentido.

Khaled - Chebba

Este é um bom som para o anónimo destressar

sábado, 7 de junho de 2008

Ilha de Moçambique (15)


Bibinha e o seu modelo. 2002

Foto Sérgio Santimano

The NY. Review of Books: denuncia rampante corrupção na Rússia

The Truth About Putin and MedvedevBy Amy Knight As he prepares to step down from the Russian presidency in early May, Vladimir Putin has been boasting about his accomplishments.

In a speech to the State Council on February 8, he talked of the stability that his government had established, thanks to which 'people once more have confidence that life will continue to change for the better. ' A few days later, during the last of his long annual press conferences as president of the Russian Federation, Putin said: "I have worked like a galley slave throughout these eight years, morning till night, and I have given all I could to this work. I am happy with the results."

FAR

Sinais


Desenho Maturino Galvão

1º ANIVERSÁRIO NO DIA 10 DE JUNHO do PORTAL DA GUITARRA PORTUGUESA


Passado um ano do seu lançamento oficial, o Portal da Guitarra Portuguesa é hoje um espaço privilegiado de divulgação e partilha de informação acerca da Guitarra Portuguesa, dos guitarristas e seus projectos musicais.

O Portal da Guitarra Portuguesa surgiu da necessidade de colmatar lacunas de conhecimento acerca deste instrumento e da vontade de incentivar a publicação de conteúdos pedagógicos e de repertório para a guitarra portuguesa.

Este projecto pioneiro, foi desenvolvido com base numa filosofia de livre acesso, de forma a possibilitar a edição e publicação de conteúdos, em diversos formatos (pautas, texto, áudio e vídeo), pelos utilizadores registados nesta base de dados na Internet.

Com uma comunidade de mais de 400 utilizadores registados, o portal ultrapassou recentemente a barreira dos 50.000 visitantes.
Com uma média diária superior a 140 visitantes, o portal alcançou ainda uma visibilidade internacional considerável: Brasil, EUA, França, Canadá e Espanha estão no top das Visitas.

O Portal da Guitarra Portuguesa, além das iniciativas que vem desenvolvendo online junto da comunidade de guitarristas, participou ainda nos Encontros Internacionais de Guitarra Portuguesa, realizados em Coimbra em Outubro de 2007 e prepara-se actualmente para estabelecer e consolidar parcerias de diversos âmbitos no contexto nacional e internacional.

Para informação adicional contacte:

João Cuña - Administrador do Portal
email: guitarraportuguesa.com@gmail.com
Tel. 91 6434730

Before I speak, I have something important to say

sexta-feira, 6 de junho de 2008

Pássaro de rico é canário

Pássaro de rico é canário,
pássaro de pobre é urubu,
rabo de rico é ânus,
e rabo de pobre é cú.

Moça rica é bacana,
moça pobre é xereta,
a periquita da rica é vagina,
a da pobre é buceta.

Rico correndo é atleta,
pobre correndo é ladrão,
ovo do rico é testículo,
e do pobre é culhão.

A esperança do rico vem,
a do pobre já se foi,
a filha do rico menstrua,
a do pobre fica de boi.

O rico usa bengala,
o pobre usa muleta,
o rico se masturba,
o pobre bate punheta.

Mas a vida é assim mesmo,
seja no norte ou no sul,
o rico toma champanhe
e o pobre toma no cú.


Composta por um aluno do Colégio Bom Conselho no Recife

José Pinto de Sá

Ilha de Moçambique (14)


Bibinha e seu modelo junto a uma das portas mais antigas da Ilha. 2003

Foto Sérgio Santimano
As caixas de comentários deste blogue andam, infelizmente, sujas. Está visto que uma ou mais pessoas fizeram seu divertimento o insulto, especialmente a um dos colaboradores, mas também a todos os que por aqui escrevem.
O mínimo que posso dizer a essas almas, é que certamente não compreenderam o que é um blogue; o máximo, que a sua vida será suficientemente triste para se darem ao trabalho de destilarem tanto fel como por aqui fazem.
A partir deste momento apagarei todos os comentários notoriamente insultuosos que apareçam. Note-se que isto é a nossa casa, na qual temos todo o prazer em acolher quem nos visita por bem, e quem contribui. Não é a casa da Joana, nem palco para ressabiados.
Começo a partir deste post. Nos posts abaixo ficam os exemplos, para que se entenda de que espécie de gente falo.

Obama



Jota Esse Erre

quinta-feira, 5 de junho de 2008

Le Nouvel Observateur reforça-se para sustentar alto crescimento

C'est un moment historique que vit Le Nouvel Observateur. Denis Olivennes, ancien PDG de la Fnac, a pris lundi 2 juin les rênes de l'hebdomadaire, dirigé depuis sa création en 1964 par Claude Perdriel. Agé de 81 ans, M. Perdriel avait annoncé, le 25 mars, son souhait de "prendre du champ" et choisi M. Olivennes, 47 ans, présenté comme son "héritier intellectuel" (Le Monde du 26 mars). Cette annonce avait créé la surprise à l'Obs, même si le nom d'Olivennes, à la fois gestionnaire et homme de gauche, a été bien accueill.

http://www.lemonde.fr/actualite-medias/article/2008/06/05/le-nouvel-obs-negocie-un-virage-important_1054159_3236.html

FAR

Vamos todos a Sesimbra no dia 14


(clicar na imagem)

E nem um postalinho ao presidente Guebuza?

Carta aberta ao presidente José Eduardo dos Santos

Exmo. Senhor Presidente:
Ao sabermos do propósito de promover em Setembro próximo eleições legislativas, acontecimento há muito esperado, considerámos oportuno solicitar de novo, como achega a tão elevado sinal democrático, a sua atenção para a nossa pretensão que reclama pelo esclarecimento da verdade, desejo antigo e tão ansiado por larga fatia da sociedade angolana, que viu muitos dos seus desaparecerem na sequência dos acontecimentos de 27 de Maio de 1977.
Já vai longa a troca de acusações manifesta por sobreviventes, familiares dos desaparecidos e de outros participantes no processo ou por seus representantes. Reclamam-se todos de justiça e pela restauração da imagem e dignidades manchadas. Porém, se os primeiros apelam ao mais alto dignitário da nação para que promova a constituição de uma Entidade Independente dotada de poderes necessários para indagar o passado, dos outros há quem espere venha a ser o MPLA a dar explicações para o seu comprometimento, enquanto outros, integrantes do Partido e do Estado, estão dispostos a sugerir a investigação e recolha das evidências históricas como contributo para a busca da verdade sobre o que deveras ocorreu a 27 de Maio de 1977, privilegiando a acção daquele que foi, em última instância, o responsável por todos os gestos do Estado, o então presidente Agostinho Neto.
Senhor Presidente, volvidas três décadas de resignação e silêncios forçados, torna-se premente, que de forma decisiva nos conceda a sua indispensável cooperação para se desenvolver um trabalho sério e uma pesquisa rigorosa. E porque todos os processos têm um início, quem melhor posicionado que V.Exa., para proporcionar o acesso a toda a informação e documentação, abrir à investigação a consulta dos arquivos do MPLA e do Estado Angolano, permitindo válidas e esclarecedoras conclusões, como por exemplo trazer a público o resultado conseguido pela Comissão de Inquérito a que então presidiu por incumbência do B.P. do MPLA, conclusão essencial, pois dirá a forma e a medida da “implicação fraccionista”, que se dizia ter invadido o MPLA, os seus meandros e práticas, afinal para benefício de quem.
Senhor Presidente, se até aqui foi nosso propósito apelar do seu
compromisso na prossecução desta tarefa que propõe restabelecer a verdade na história de Angola e na do MPLA, de onde o 27 de Maio de 1973 não pode ser arredado, vamos arriscar de novo sensibilizá-lo para que atenda anteriores pedidos que, uma vez satisfeitos, engrandeceriam a Nação e dignificariam o seu Presidente. Já passaram mais de trinta anos e ainda não foram entregues as certidões de óbito que atestem a causa da morte de
inúmeros cidadãos. Conhecer os locais onde se encontram os seus restos mortais, proceder-se à sua exumação e sequente entrega às famílias para que estas procedam ao seu digno funeral, seria um gesto de enorme humanidade.
Tendo sido criada por iniciativa de V.Exa. uma “Comissão Multisectorial”, um projecto que visa valorizar e divulgar figuras históricas angolanas, no intuito de fortalecer a unidade nacional e que terá competência para conceber e edificar estátuas e monumentos históricos, permita-nos desde já que possamos candidatar como figura histórica digna de tal merecimento, todos aqueles que pereceram na sequência dos acontecimentos de 27 de Maio de 1977. Afinal, das mais faladas figuras aos demais anónimos que desapareceram, todos concorreram, cada qual à sua maneira, para pôr fim ao colonialismo, para vencer os invasores e para erigir Angola como Nação independente.
Aguardamos verdadeiramente pelo Vosso interesse na prossecução desta nobre tarefa, que visa repôr verdades, fazer justiça e devolver dignidade, jamais esquecendo o passado para que não se repita no futuro.

Associação 27 de Maio,
Lisboa, 27 de Maio de 2008



E nem um postalinho ao presidente Guebuza?
A carta acima reproduzida foi divulgada em Lisboa dias atrás, quando se completaram 31 anos sobre o início da sangrenta repressão da dita “intentona fraccionária” liderada por Nito Alves. A missiva é subscrita pela Associação 27 de Maio, que congrega sobreviventes e familiares de vítimas da chacina que ensombrou Angola. Volvidas mais de três décadas, a verdadeira história ainda está por contar, as vítimas não foram reabilitadas nem sequer os seus corpos devolvidos às famílias, e os algozes, entre os quais se contam conhecidas figuras angolanas como o romancista Pepetela, continuam impunes e impenitentes.
Se em vez de “romancista Pepetela” se escrevesse “poeta Sérgio Vieira”, a frase anterior poderia aplicar-se, sem tirar nem pôr, a Moçambique. Do outro lado do continente, o zelo dos burocratas também fez das suas, em tristes episódios que passaram à História com nomes como Operação Produção e “campos de reeducação”. Também lá milhares de pessoas sofreram na carne a violação sistemática e massiva dos direitos humanos, em desmandos como deportações, detenções sem culpa formada, execuções sumárias, chambocadas e outras formas de tortura. E também lá a história está por contar, as vítimas por reabilitar, os culpados por punir.
Também lá caberia instar o Presidente da República a responder aos múltiplos pedidos de esclarecimento e de reparação que esta triste situação justifica e impõe. Pedidos que, “uma vez satisfeitos, engrandeceriam a Nação e dignificariam o seu Presidente”, como dizem os subscritores da carta angolana. Tanto mais que, no caso moçambicano, o actual Presidente da República, Armando Guebuza, na altura ministro do Interior, foi o principal obreiro da referida operação e da dita reeducação. Ninguém mais que ele deveria estar interessado em virar de vez uma das páginas mais sombrias da história de Moçambique. E ninguém mais que ele tem capacidade e poder para tal. Só lhe ficava bem, e devia aproveitar a oportunidade. Porque, como escreveu Patrice Lumumba diante da morte, “l’Afrique écrira un jour sa propre histoire, et ce sera une histoire de verité et dignité”.

José Pinto de Sá

Sinais


Desenho Maturino Galvão

Da Arte.. como metáfora de uma vida imperfeita

Viena 2008
Foto:g.ludovice

"(..) Qualquer grande livro respira este espírito, que escolhe os destinos individuais porque eles não se adaptam às formas que o rebanho lhes quer impor. Isso leva a decisões impossíveis de pôr em prática; a única coisa que se pode fazer é reconstituir as suas vidas. Se extraíres de toda a literatura o seu sentido mais fundo encontrarás uma negação - não completa, mas assente em inúmeros exemplos individuais e derivada da experiência - de todas as regras, de todos os princípios e preceitos sobre os quais repousa a sociedade que venera essa literatura.
Um poema, com o seu mistério, corta ao meio o sentido do mundo suspenso de milhares de palavras comuns, transforma-o num balão que se eleva e se perde nos ares. Se, como é costume, chamarmos a isso beleza, então a beleza será uma rebelião indescritvelmente mais implacável e cruel do que qualquer revolução política. (...)"
Robert Musil, in: O homem sem qualidades V.I, Trad. J.Barrento

Num certo diálogo entre Clarisse e Ulrich, Musil põe ao de cima aquela já ideia aristotélica de que a Tragédia Grega é catártica e terá um pendor positivo na vida humana neste sentido, ao contrário de Platão que condena a poesia e a arte em geral como sendo a pálida cópia da já cópia do que entendia ser a verdadeira realidade, ou Freud da sua Viena, a trazer à arte legitimidade, enquanto sublimação daqueles actos que não seriam impunes socialmente.
Há a desconfiguração antecipada do ideal, a saudade de um outro estado que nunca houve, quando há arte?

XXIX Sonetos de Amor de Étienne de La Boétie

Soneto 12°

Quoi ! qu´est-ce ? Ô vents ! Ô nues ! Ô l´orage !

À point nommé, quand d´elle m´approchant,

Les bois, les monts, les baisses vois ( xxx) tranchant,

Sur moi d´aguet( avec constance) vous poussez votre rage.

Ores( maintenant) mon coeur s´embrase davantage.

Allez, allez faire peur au marchand,

Qui dans la mer les trésors va cherchant;

Ce n´est ainsi qu´on m´abat le courage.

Quand j´oy( entends) les vents, leur tempête, leurs cris,

De leur malice em mon coeur je me ris.

Me pensent-ils pour cela faire rendre ?

Fasse le ciel du pire, et l´air aussi:

Je veux, je veux, et le déclare ainsi,

S´il faut mourir, mourir comme Léandre.

FAR

quarta-feira, 4 de junho de 2008

Sinais


Desenho Maturino Galvão

Milan Kundera: A reflexão romanesca de Musil e Broch


" A reflexão romanesca, tal como Broch e Musil a introduziram na estética do romance moderno, não tem nada a ver com a de um cientista ou a de um filósofo; diria mesmo que é intencionalmente a-filosófica, mesmo anti-filosófica, isto é, deliberadamente independente de qualquer sistema de ideias preconcebido; não julga, não proclama verdades; interroga-se, intriga-se, sonda; a sua forma é das mais diversas: metafórica, irónica, hipotéctica, hiperbólica, aforística, mordaz, provocadora, fantasista; e sobretudo: não arreda pé nunca do circulo mágico da vida das personagens; é a vida das personagens que a abastece e a justifica ".
Milan Kundera, " Le Rideau, Essai en sept parties ". NRF-Gallimard, 2005
FAR

Ainda Dili (25)


Pintura João de Azevedo

terça-feira, 3 de junho de 2008

Audácia e fair-play(2):Maio 68 segundo Slavoj Zizek


Este texto do filósofo Slavoj Zizek, enquadrado num conjunto homólogo de perspectivas com Alain Badiou, Negri e Hardt, apela para a lucidez da tarefa de politização dos escravos do sistema subtil que nos asfixia, a pouco e pouco. Ler o artigo na totalidade no Le Monde, clicar aqui. E recorda qual o objectivo essencial posto em jogo por Maio 68: " O coração de Maio 68 foi a rejeição do sistema liberal-capitalista, um não endereçado ao sistema na sua totalidade ".

Zizek, que é o filósofo da actualidade mundial com os livros mais traduzidos em Portugal, advoga que " a tarefa essencial do séc.XXI será a de politizar- organizando-as e disciplinando-as- as massas desestruturadas dos bairros da lata ". Porque, reitera, " a verdadeira questão, hoje, consiste: devemos tomar em conta a aceitação generalizada do sistema ou o capitalismo global produz no seu seio contradições suficientemente potentes para impedir a sua reprodução perpétua ?".

" Estas contradições assinaladas são pelo menos em número de quatro: a ameaça de uma catástrofe ecológica; a inadaptação da noção de propriedade privada aplicada ao que se chama de " propriedade intelectual"; as implicações sócio-éticas dos novos desenvolvimentos técnico-científicos( nomeadamente em biogenética); enfim, e não é o de somenos importância, a aparição de novas formas de apartheid, de novos muros e bairros da lata ".

" A lógica crucial do capitalismo global: um habitante das favelas do Rio de Janeiro ou de um bairro da lata de Shangai não é diferente de um indivíduo que vive nos subúrbios de Paris ou num ghetto de Chicago . O que nos ameaça é vermo-nos confrontados a ser sujeitos cartesianos e vazios, privados de todo o conteúdo substancial, desapossados da nossa substância simbólica, constrangidos a suportar a manipulação da nossa base genética e de vegetarmos num ambiente insuportável ".

"Slavoj Zizek vai mais longe e define: " A verdadeira utopia consiste em acreditar que o sistema global actual se pode reproduzir ad aeternum; a única forma de ser verdadeiramente realista é de encarar o que, pelos critérios deste sistema, não pode surgir senão como impossível . Se ignorarmos o problema dos excluídos, todas as outras contradições perderão a pertinência subversiva. A ecologia reduzir-se-à a um problema de desenvolvimento durável, a propriedade intelectual a um complexo problema jurídico e a biogenética a uma questão ética ".


L'un des plus célèbres graffitis apparus sur les murs de Paris en Mai 68 disait : "Les structures ne défilent pas dans la rue !" - autrement dit : on ne saurait expliquer les grandes manifestations étudiantes et ouvrières de 1968, selon les termes du structuralisme, comme des phénomènes déterminés par les changements structurels de la société.
Accédez à l'intégralité de cet article sur Lemonde.fr

http://www.lemonde.fr/opinions/article/2008/06/02/la-veritable-lecon-a-tirer-de-mai-68-par-slavoj-zizek_1052652_3232.html

FAR

Sinais


Desenho Maturino Galvão

Ilha de Moçambique (13)


Pescadores. 2003

Foto Sérgio Santimano

segunda-feira, 2 de junho de 2008

Audácia e Fair-play(1)


Notas esparsas para tentar definir um tempo de reflexão para accionar a indispensável mutação estrutural de uma realidade dividida, equívoca e desigualitária onde os patrões " como não podem pagar mais, devem desaparecer " para que a verdadeira vida, o sublime da ética e da responsabilidade, não se deixem nunca jugular.

1. " A revolução social não exclui de forma alguma a revolução política. Pelo contrário, ela implica-a , necessariamente, imprimindo-lhe uma tonalidade diferente, o da emancipação real do jugo do Estado pelo povo. Uma vez que todas as instituições e todas as autoridades políticas não foram criadas, em definitivo, senão para proteger e garantir os privilégios económicos das classes possidentes e exploradoras contra as revoltas do proletariado, torna-se claro que a revolução social deverá destruir essas instituições e essas autoridades, não antes, nem depois, mas ao mesmo tempo que levará a sua acção pela libertação dos fundamentos económicos da escravatura do povo…

" A revolução política, contemporânea e realmente inseparável da revolução social, de que será a expressão ou a manifestação negativa, deixará de ser uma transformação, mas sim, será uma liquidação grandiosa do Estado "( M. Bakounine. Obras Completas. IV).

2. " O que é em suma o poder dos Conselhos Operários? A dissolução de todo o poder a ele exterior; a democracia directa e total; a unificação prática da decisão e da execução ; o delegado substituível a todo o instante pelos seus eleitores ; a abolição da hierarquia e das especializações independentes; a gestão e a transformação conscientes de todas as condições da vida libertada ; a participação criativa permanente das massas; a extensão e a coordenação internacionalistas ".
G-E-Debord.IS-Conjunto.

3. " Toda a sociedade capitalista moderna é dividida por uma contradição fundamental que deriva das suas duas classes opostas. A exploração dos trabalhadores por uma minoria desencadeia constantemente uma oposição irredutível de interesses entre as duas classes. A gestão da produção e da sociedade por essa mesma minoria suscita, qualquer que seja o tipo de regime, uma anarquia e uma irracionalidade permanentes.O fundamento do capitalismo é portanto posto em questão permanentemente, quer pela luta aberta ou disfarçada dos homens contra a estrutura social, quer pela reserva, apatia, indiferença face a todos os domínios que deveriam incarnar a vida social, como a empresa, o associativismo, os partidos políticos, o sistema de governo. O sistema capitalista vê-se enrolado numa crise sem fim porque, em vez de integrar os homens na sociedade, ele força-os constantemente, e concomitantemente, a lutar contra a organização social dominadora e dominante ou a ficarem isolados, " privatizados", que os burocratas ajudam a reforçar por seu lado ".
DC-Bendit, O Esquerdismo, remédio para a doença senil do comunismo . Le Seuil Éditions. 2008.Paris.
FAR

Brandos Costumes


Não consiste novidade a crise do livro, da leitura, ofuscando o prestígio do saber, ou da erudição, e da chamada cultura clássica no nosso país. Os jornais não se vendem, a televisão superou há muito o gosto pelo cinema e os grupos de teatro vivem no essencial de subsídios do Estado. Mas esta situação deprimente conduziu, todavia, no que se refere ao mercado editorial, à procura de soluções que possam minimizar as consequências económicas das casas comerciais mais atingidas por este momento crítico que teima em prolongar-se. Referimo-nos à profusão de espontâneas “feiras do livro” que surgiram nas estações do metro e nas proximidades dos apeadeiros das linhas ferroviárias.
Foi numa dessas improvisadas instalações que adquiri um pequeno livro de Eça de Queirós que não tivera ainda oportunidade para desfrutar. Trata-se de Alves & C.ª , edição póstuma do seu filho José Maria, que agora surge através das quase desconhecidas Edições Atena. Acontecera-me já com O Mandarim, obra que eu me habituara a considerar coisa menor, ou desinteressante, tendo em conta a excelência da produção do autor. Mas o nosso discreto cônsul não escreveu textos sofríveis ou entediantes, e a referida novela transforma-se em leitura aliciante, consequência da fantasiosa digressão por terras do Oriente empreendida por um modesto funcionário público que inesperadamente enriquece.
Mais consentâneo com o estilo de apurado realismo e com a singular observação sociológica do autor, cremos ser a história de Godofredo da Conceição Alves, sócio maioritário de uma lucrativa casa de comissões que se ocupava de artigos a exportar para as colónias, com escritório na Baixa, moradia na Rua de S. Bento, respeitado cidadão casado com a interessante Ludovina, a sua «Lulu». É um texto divertido interpelando a sociedade lisboeta dos finais de Novecentos. Em dia de aniversário do seu matrimónio, um sufocante dia do mês de Julho, Godofredo, porque pensou ser esta uma data feliz, regressara a casa mais cedo. E descobre a mulher, no sofá da sala de visitas, nos braços do seu mais directo colaborador na empresa.
Seguem-se várias cenas rocambolescas, a um ritmo avassalador, adaptadas à realidade portuguesa, como a elegante escrita de Eça de Queirós sempre foi capaz de nos transmitir ao longo de uma obra que se repartiu pelo romance, o conto e a intervenção cívica nas páginas dos jornais. E não perdemos, no entanto, o prazer da inigualável prosa do grande romancista: «Dava o meio-dia; o sol de Julho abrasava nas ruas; e as lojas fechadas, a gente nos seus fatos domingueiros, as carruagens de praça abrigadas no lado da sombra, aumentavam a sensação de calma e de inércia. Uma poeira subtil embaciava o azul luminoso e um som de sinos arrastava pesadamente no ar mole.» E Godofredo, após expulsar a mulher da sua residência e devolvê-la a casa de seu pai, iria procurar os seus maiores amigos, o Carvalho e o Teles Medeiros, que se encarregariam das condições, marcação do local e data, para um duelo, única forma de salvar a «honra» perante a sociedade.
Mas a argumentação dos amigos do «adversário», as discussões, a reflexão mais serena acerca de um caso que afinal não seria assim tão grave, fizeram alterar a contenda, que inicialmente seria à pistola, depois à espada, finalmente não seria nada.
« – Nestas coisas é necessário, sobretudo, dignidade». Todos sabiam histórias de indivíduos que saltavam pela janela, quando surpreendidos, e o Medeiros conhecera um caso de um amigo dele que ficara escondido num curral de porcos durante seis horas. Concluíram que o duelo seria a prova de que houvera realmente adultério e ainda lesava a sociedade comercial.
Além do mais o sossegado comerciante não conseguiu suportar aquela viuvez forçada, numa casa onde as criadas o não respeitavam e até as noites com fogo preso no Passeio Público se tornaram dolorosas. Chegou mesmo a procurar a mulher. «Ela parara, espantada. Estavam junto de uma loja de mercearia, na luz do gás, e ficaram defronte um do outro, sem achar palavra, enleados com todo o sangue na face.» Algum tempo depois começou a reconciliação, como um segundo namoro, ou nova lua-de-mel, que incluiu hotel em Sintra, e em Lisboa, camarote em S. Carlos. E os dois sócios, por entre bailes e jantaradas, iriam também restabelecer a amizade enquanto a firma progredia. Brandos costumes.


Mário Machado Fraião

domingo, 1 de junho de 2008

rabiscos [quase] exemplares


Tirado do Irmão Lúcia

A IMPORTÂNCIA DE SE CHAMAR TAMANHO

Há uns anos valentes o professor António José Saraiva escreveu uma crítica das ideias comuns. Desvalorizado hoje em dia, a crítica consequente, abanão nas mentes imbuídas da mecânica do lucro nos dias e actos, o livro construía-se a partir de um diagnóstico das ideias feitas, do preconceito. Este move-se como o burro em que o meu avô ia dar aulas lá no topo da pedra, Marvão. O avô doente e o burro cumpria, nos mesmos horários, o mesmo caminho, para a mesma escola: infelizmente, o passo seguinte não acontecia, o animal não zurrava o alfabeto e chegada a hora, pela mesma via retornava, dentuça aberta na antevisão da palha – Pavlov explica.
De negativo identitário temos muito e bem assente, enraizados atavismos, o preconceito na profundidade da esclerose. A língua tradu-los: “a mulher quer-se pequena como a sardinha”. É um revelador, a língua, e as suas cristalizações todo um programa sobre as nossa patologias idiossincráticas, marialvismo ancorado na raiz, variação de tipo humano específico gerado numa periferia de maresias, longe da sofisticação interior a que levam Invernos rigorosos, vida mais sob telha e entre paredes, cá mais no meio da rua em gastronomias alegres, evoluindo numa constante salmoura de tintos e brancos – irresistível atracção do timbre de cada casta, baga, loureiro, trincadeira preta, fernão pires, sirah, síria – há agora um Quinta do Cardo!!, paladares olímpicos.
Mas o orgulho excitado do pequeno foi-se com os iogurtes e depois da ponte Vasco da Gama e da inolvidável feijoada para 13.000 nada nos detém. A maior árvore de natal da Europa, o maior pão-de-ló do mundo civilizado, a maior mariscada, e mesmo na cerveja, essa especialidade alemã e belga, já os rapazes e raparigas de Coimbra disputam a primazia aos bávaros de Munique na extraordinária cerimónia de iniciação que são queimas e fitas.
Pois isto vem a propósito do Grande. Somos agora pelo Grande seja qual for a circunstância: somos sempre maiores do que o tamanho que temos e temos uma enorme incapacidade de, vendo-nos no espelho do real, termos a noção do nosso tamanho exacto, político, intelectual, cultural e tamanho tamanho. “Os homens não se medem aos palmos”. Pois claro que não. Nem as mulheres, se nesses “homens” não estiver o h grande de Humanidade. Mas medem-se as suas realizações e desconformidades, assim como as manias. E a mania do Grande chegou para ficar. Foram todos esses estádios de futebol que se construíram e que não foram projecto cultural e educativo, mas mais futebol a juntar a mais Fátima e mesmo a mais Fado, agora felizmente “World Music” e Nova-Iorquino.
E que dizer dos equipamentos culturais GIGANTESCOS que, de um momento para o outro, em plena regressão cultural – a da política cultural, não a do mercado do entretenimento, nem a das indústrias criativas, conceito puramente económico – pululam por pequenas cidades do país, Bragança, Vila Real, Braga, Faro, Torres Novas, Guarda, e agora Caldas da Rainha, etc.,?
E pensar que, poucos deles, a Guarda por exemplo, foram um programa para uma arquitectura, um projecto resultado de um desígnio!?
Na floresta do real, no país real, abundam agora novidades frescas que esta nova rede de frio vai permitir descongelar e apresentar, a cada vez, como absolutos novos. Como se bastasse comprar e exibir. As excepções a este óbvio são tão raras quanto o estímulo à verdadeira criação e à inscrição do novo numa tradição clássica – a que não é descartável porque vulgar. Quanto melhor pior! Será?

Fernando Mora Ramos

Da Liberdade..

A deseducação parece ser essencial, penso neste país cada vez mais como uma democracia-pocilga, berço de miserihabilidades de fundo.
É angustiante ver como se alastra a tudo e se confunde a educação (capacidade de se dizer o que se pensa sem se cometer assassinato, ou seja, de se ser sensível ao outro que é sobretudo respeitável porque não assassina, podendo fazê-lo porque também imperfeito) com a alegria triste de se ejectar o despojo pessoal com tamanha facilidade, garantia de tanta liberdade anémica..

Alexander Kojève chez Lacan

No" Journal "de Raymond Queneau , soma de três volumes, há uns relatos deliciosos sobre a vida social e literário-filosófica que envolvia os grandes vultos da época , os anos 50/60.
Destaque para as referências a Alexander Kojève , Claude Levi-Strauss , Lacan e Sylvie Bataille, que privavam muito e discutiam as ideias com paixão e soberania . Desse manancial relato de uma charada proposta pelo hegeliano Kojève a Lacan na presença de Queneau e dos outros convivas referidos.

Quatro questões ao psicanalista

O que desejava que um cão fizesse no Jardim que Você não pode fazer ?

O que é que a vaca tem em número de 4 e a mulher em número de dois?

O que é que ultrapassa o pijama de um homem e onde se pode pendurar um chapéu?

O que é que um homem faz de pé, uma mulher sentada e um cão sobre três patas?

Aceitam-se respostas!

FAR

Ilha de Moçambique (12)


Bibinha. 2002

Foto Sérgio Santimano

A TORRE

Assombro o relógio, persigo as horas, declaro guerra ao tempo
Existo momento, guilhotino a janela, cerro a porta ao instante
Humilho o papel, estendo o lençol, aguardo-me fim fatigado
Esmago o piano, conspurco o livro, lanço-me nu ao rio

Corto a cabeça da boneca, corto o pelo do cão, desassombro-me
Olho nos olhos do ídolo, desmascaro-o, cuspo-lhe na roupa nova
Arranco as asas do anjo, arranco a minha mão desnecessária
Mão de ferro forjada, esguicha o sangue e domino-o à dentada

Dinamito a pérola, emendo a morte cortando os lábios amados
Metralho o Sol, rebento com a Lua, fico só eu e as estrelas
Não me chega o vácuo, tinjo-o pulverizante de matéria negra
Retiro a moldura ao quadro, apago-lhe as flores, apago-o

Assopro na vela e decreto a noite como natureza das almas
Retiro a máscara, sujo-me de verdade, espanco o cachaço dos homens
Faço navegar o barco para fora da garrafa, decreto-me seu capitão
Despeço os carregadores de liteiras, e carrego-as eu às costas

Amanso o mar, afundo a ilha, descoloro as cores tropicais
Lanço-me louco nas profundezas da alma, torno a loucura banal
Mato Deus, ressuscito-o para que perceba quem manda
Entro nos cérebros e apago as histórias, acordando não haverá nada

Desboto os papeis escritos, serão todos escritos em vão
Danço o tango com o poeta, ele fica tonto, eu atiro-o para o chão
Assenhoro-me dos dedos do músico e ensino-lhe a música da morte
Estorvo a passagem da ambulância convencendo o moribundo da sua sorte

Avanço aos pulos sobre os telhados, escarneço dos superficiais
Rodopio na auréola do anjo, masturbo-me na cauda de Satã
Desfaço o nó da gravata, tiro a camisa, arranco a pele
Ponho a mão no coração e arranco-o também, a seguir a jugular

Faço malabarismos com o fígado, o baço e o pâncreas
Surjo na rua corpo sem órgãos, encontro uma camisa e uma gravata
Como a gravata e vomito, troco os meus órgãos pela camisa
Embrulho o vómito na camisa e caminho sem direcção