segunda-feira, 5 de junho de 2006

Pesca


Foto de Sérgio Santimano
Ilha de Moçambique. 2002.


Da série "Uma História Fotográfica Sobre A Ilha De Moçambique"

TABUADA PO_ÉTICA (cont.)

Po-ética doze

a dúzia é um número preclaro
sobre o qual nada há a dizer
apenas que raramente nos saldos
fazem doze por centro
desvantagem de ser perfeito



Po-ética treze

sobre este nada a dizer
melhor ir à bruxa
ao curandeiro
se a coisa não desentorta
sofismar até à implosão em noites de estar só
aí vira-se sapo cheio de presunção e costas voltadas para o umbigo
ou então ossos de baleia transviados do curso atlântico
camaleão estático
todos em suspensão num poema de ondas de pequena vaga
no mar doméstico de um banho Maria
pelas mãos de alguém entram uns pés de palavras em barbatanas
como se diz da salsa que tem pés
e semeiam-se : entre talheres pegam de estaca
na mesa velha
com eficácia rigorosa
enfim diálogo com as raízes

f.arom

(continua)

sexta-feira, 2 de junho de 2006

Baía azul


Foto de Gabriela Ludovice
Província de Benguela, Angola. 2005


Ontem tive uma conversa, muito animada, com o André, o João, o Jójó, a Ana, o Carlitos e a Paula.
Hoje o Jójó mandou-me este "boneco" que aqui publico. Deste modo continua a conversa, em que sou parte interessada.

Freud, Nobel e a realidade objectiva

O que se passa com alguns laureados com o Prémio Nobel? Vários sinais estranhos, incompreensíveis, foram detectados nos últimos dias em pelo menos três galardoados.
1. José Saramago considerou ontem que a leitura "sempre foi e será coisa de uma minoria". Para o prémio Nobel da Literatura, estar na comissão de honra do Plano Nacional de Leitura é uma "uma fatalidade, como as bexigas".
2. José Ramos-Horta vai ser nomeado ministro da Defesa de Timor-Leste já amanhã. Num país à beira da guerra civil, nada melhor do que um laureado com o Nobel da Paz em 1996 para assumir o comando das tropas. Guerra e Paz? Paz e Guerra? Porque não Paz e Amor?
3. Dalai Lama, Nobel da Paz em 1989, premiou ontem em Bruxelas Tintín por ter contribuído para que o Tibete fosse mais conhecido a nível mundial. Sim, Tintin, o repórter da banda desenhada celebrizado por Hergé. O livro “Tintín no Tibete” é recente, foi só scrito em 1959. E cheio de embalagem, aproveitou para atribuir ao seu amigo Desmond Tutu, também Nobel da Paz em 1984, o prémio Luz da Verdade. Coisas de clegas?

U kéké ixómeu?

Us profs vao a ser avaliadjs, ns k sms bns n tms problms m us pais ds filhs xats sabm k ist e axim: kk cena + xat vai ser xat p elex; e axim a vida

Da Capital do Império

Olá,
Como vem aí o “Mundial” hoje vou falar-vos de Sunil Gulati. Vocês não sabem quem ele é, mas não se preocupem pois muito pouca gente o conhece. Nasceu na Índia há 46 anos, é Professor de Economia na Universidade de Colombia em Nova Yorque e é também …. presidente da Federação de Futebol dos Estados Unidos.
Sem nunca ter jogado futebol profissional ou ter sido treinador de futebol Gulati é o responsável pelo facto do futebol nos Estados Unidos ter hoje um lugar estabelecido na cena desportiva do pais, de passar do zero e de anedota à posição de potencia regional derrotando sistematicamente o México e também pelo facto dos Estados Unidos estarem hoje em quinta posição nos “rankings’ da FIFA. Como diz com um certo orgulho a federação em anúncios na televisão a pedir o apoio do público americano (ainda têm que o fazer!): “Tem piada mas hoje já ninguém gosta de jogar contra nós”.
Gulati é também responsável pela criação em 1996 da liga de futebol profissional dos Estados Unidos, a Major League Soccer (MLS) que tem 10 equipas, vai expandir para 11 no próximo ano, 12 no ano seguinte e planeia ter no mínimo 14 e talvez 16 equipas até 2010. A sua media de espectadores por desafio é hoje de 15.000 mas este ano devera aumentar para 16.000. Os jogos da selecção atraem à vontade 30.000 espectadores.
Há que dizer que o futebol é ainda ( e vai certamente continuar a ser) desporto de quarta categoria nos Estados Unidos (abaixo do futebol americano – o dos capacetes -, do basebol, do basquetebol mas já ultrapassou o hóquei sobre o gelo embora isso custe a aceitar por muitos americanos que consideram ainda o futebol como um desporto de … meninas e/ou maricas). Alguns dos grandes jornais americanos como o New York Times praticamente não cobrem o desporto, símbolo de uma resistência cultural ao futebol que é visto como algo de estranho, de europeu. O antigo candidato presidencial Jack Kemp descreveu em tempos o futebol como “um desporto socialista europeu e portanto não americano”!
Sunil Gulati viu isso tudo mas viu também, em bom estilo americano oportunidade. Para tal teve que correr riscos e inovar. Teve que procurar investidores, fazer do futebol um negócio. O modo como o futebol é administrado nos Estados Unidos pode causar arrepios aos que gostam do futebol aí do outro lado do lago. A MLS é na verdade uma cooperativa dos clubes membros em que todos têm comparticipação nos lucros e prejuízos e onde para minimizar despesas foi imposto um tecto salarial estrito a todas as equipas. Não há promoção ou despromoção da liga. Entra-se como um investimento numa cidade onde estudos comerciais indicam potencialidade de eventuais lucros ou de contribuição para a MLS em termos de mercado televisivo Aqui equipas que não produzem resultados comerciais desejados fecham as portas. Duas equipas da MLS ( Miami e Tampa Bay) foram encerradas há uns anos atrás devido a maus resultados financeiros. Ou então mudam de cidade à procura de mais entusiasmo… e mais massa.. A equipa do Sao José Earthquakes mudou de cidade quando não conseguiu atrair investidores ou levar a câmara municipal a investir num estádio. Mudou-se pura e simplesmente para Houston no Texas onde as autoridades locais concordaram em financiar um estadio. (Traz negócios que trazem impostos, pois não!) O New York MetroStars mudou pura e simplesmente de nome este ano depois de ter sido comprado pela companhia Red Bull da Áustria e a MLS concordou devido às promessas de grandes investimentos em jogadores e estadio. Era como o Benfica ser comprado pela Sogrape e passsar a chamar-se Sogrape Futebol Club!!!
A MLS inicialmente comprou tempo de antena para ter os seus jogos transmitidos! Quem pensaria tal coisa? Hoje já há concorrência pela transmissão dos jogos da MLS ainda que os seus contractos sejam ínfimos quando comparados com os outros desportos grandes.
“Não há modelo (para o nosso futebol),” disse o agora presidente da Federação de Futebol dos Estados Unidos. “Muitos poucos países têm a concorrência que existe entre nós pelos dólares gastos em entretenimento, a geografia dos Estados Unidos …As soluções para o futebol nos Estados Unidos têm que ser diferentes do que em qualquer outra parte do mundo,” disse ele.
Os resultados têm sido sensacionais. A Federação de Futebol dos Estados Unidos tinham em 1987 um total de 16 pessoas a trabalharem para si. Hoje tem 90 incluindo diversos treinadores para as diferentes selecções. Em 1987 os Estados Unidos tinham duas equipas nacionais de jovens (abaixo dos 21 anos). Hoje têm 14. Hoje há quatro milhões de jovens a jogar futebol pelo pais em clubes e campeonatos locais.
Nos anos 80 a federação esteve varias vezes à beira de declarar a falência. Em 1984 o então presidente da federação Werner Fricker que era dono de uma empresa de construção teve que pedir a varias companhias para emprestarem dinheiro à federação devido a recusa dos bancos. Veteranos da selecção americana dos anos das “cabazadas dos anos 80” lembram-se de verem Gulati, ele já professor de economia, a servir de guarda roupa apanhando as camisolas sujas dos jogadores no chão dos balneários ou então a servir de professor de matemática a jovens das selecções de juvenis afastados das escolas por compromissos das selecções Este ano a federação tem um excedente de 40 milhões de dólares. Na Florida a federação tem uma escola de jogadores com professores de todas as disciplinas!
É certo que o futebol nos Estados Unidos continua a ser em grande escala o que os peritos em “marketing desportivo” chamam de “um desporto de família” e dai o grande número de crianças que assistem aos jogos acompanhados pelos seus pais. Mas já surgem grupos de adeptos ferrenhos como a “Barra brava” do Washington DC United que faz tremer as bancadas do estádio Robert Kennedy aqui na capital do império. Gulati sonha agora “ganhar o campeonato do mundo, não sei quando, com uma selecção de hispânicos, negros, uma selecção que representa a composição racial do nosso país”.
Este ano a selecção americana será talvez menos surpreendente do que há quatro anos atrás quando atingiu os quartos de final derrotando Portugal no primeiro jogo. Tem também um grupo muito difícil. Mas tenham em atenção dois jovens que provavelmente estarão no banco mas que serão certamente usados, Bobby Convey e Clint Dempsey. Tenham também em atenção esse defesa central com o apelido nigeriano de Onyewu mas a quem os americanos chamam de Gooch. Intimidante!
Mas lembrem-se acima de tudo de Sunil Gulati. Gulati, o imigrante da Índia e alguns poucos outros que gostam de futebol, sonharam com uma liga profissional, fizeram-no de forma inovadora quiçá chocante para os puristas e no processo …. fizeram uma revolução desportiva interna. Quando se escrever a história do futebol nos Estados Unidos terá certamente que haver um capítulo titulado: Gulati.
FIM

Jota Esse Erre

quinta-feira, 1 de junho de 2006

Perguntas sobre o desastre anunciado

O essencial sobre a avaliação dos professores pelos pais não é, na minha opinião, a eventual impreparação destes para opinar sobre aqueles, mas a total subversão dos princípios pela qual se rege a Educação. Imaginemos uma família de classe média-alta, com sonhos e aspirações, legítimas ou não, sobre o destino do rebento: médico, advogado, economista, um futuro de sucesso sonhado. Qual a opinião deste pai ao avaliar um professor que chumba o seu filho? Ou que lhe dá um 16 em vez do 17 que permitia a média de entrada para Medicina? Imaginam os defensores desta medida que, no mundo da competição cega em que vivemos, os pais se preocupem sinceramente sobre a qualidade das aulas ou a cultura dos seus filhos? Sucesso, eis o que interessa a toda a gente. Naturalmente, os professores, que hoje já se vêm aflitos para chumbar um aluno (tem de apresentar um extenso relatório sujeito a contestação), simplesmente deixarão de o fazer, preocupados com a sua própria avaliação. É assim que queremos um ensino de qualidade e exigência? E o que acontecerá com aqueles professores, que todos tivemos e conhecemos, cujo saber e criatividade os colocam à margem dos programas, e que deixam marcas para sempre nos seus alunos? Como serão avaliados por pais conservadores e botas-de-elástico, que tem horror à diferença e a tudo o que possa tornar os filhos diferentes de si mesmos? Mais um passo no desastre, a caminho da uniformização e nivelamento por baixo da Educação. Mas não era este o grande desígnio nacional?

Esclarecimento

Uma irritante e recorrente avaria no PC não me permite voltar à colaboração regular que prometi.

Foto de José Carlos Mexia

TABUADA PO_ÉTICA (cont.)

Po-ética dez

duas mãos são o início de uma aventura
de um silêncio mais fundo que um poço
de um orgasmo latente
são cinco mais cinco que se unem
como os fios de sisal cumprem a corda
e mãos também lembram mães
e com elas tudo começa
incluindo a vida


Po-ética onze

sobre esta quantificação
dizer que é um team de bola
é anglofilia
e
significa pôr a poesia mais do que na rua
significa hooliganá-la
e por entre os amplos grunhidos de latrina
atirá-la às feras como os cristão primitivos

f.arom

(continua)

Junho começou assim

"Vietnam Napalm", Junho de 1972
Prémio Pulitzer
Fotógrafo Nick Ut / The Associated Press
*
Hoje é o primeiro dia de Junho. Para os pessimistas ainda faltam 213 dias para beber champanhe na passagem de ano, mas para a maioria dos mortais, este é o Dia Mundial da Criança. Os menos jovens, pensam continuar a alimentar a criança que “há em si”, uma forma poética de dizer “porra, estou a ficar velho”. Mas há outros que gostam das crianças fora de si. Quer dizer, mais ou menos. É o caso do holandês Ad van Denberg, pedófilo assumido, que defende a legalização de relações sexuais com crianças a partir dos 12 anos. Está a tentar formar um partido político, chamado, vejam bem, "Caridade, Diversidade e Liberdade", que tem na sombra uma cambada de tarados pedófilos. É caso para dizer: isto só na Holanda. Mas este é apenas um aspecto negro de um dia que tem tudo para ser positivo. Há que ter especial atenção com as crianças, se as tiver. Se não for caso disso, beba um copo à saúde da sua educadora de infância.
*
Mas o primeiro dia de Junho não se esgota aqui. Em 1890, o escritor Camilo Castelo Branco suicidava-se. Esta tristeza só foi compensada 36 anos depois, quando nasceu Marylin Monroe (1926), a maior diva de todos os tempos. Só mesmo ela conseguiu manter erecta e firme a libido de muitos, durante uns bons anitos. Ron Wood também gostava de Marylin. Por isso, o futuro guitarrista dos Faces e dos Rolling Stones também quis nascer neste dia (1947). Os Beatles não têm nada a ver com esta data, a não ser o gosto obsessivo pelo número um. Por isso, aproveitaram o primeiro dia de Junho para lançar o melhor álbum de música rock de sempre (1967). "Sgt.Peppers's Lonely Hearts Club Band" entrou em forma de rodela de vinil nas discotecas, depois de ter sido gravado em Abbey Road, durante 700 horas.
*
Quem não viu nada disto foi o compositor e pianista Viana da Mota, um dos últimos alunos de Liszt. Morreu em Lisboa (1948) talvez incomodado por ter sido nesta data (1942) que os nazis obrigaram todos os judeus a usarem a estrela amarela. Mas não ficou indiferente perante as exportações de volfrâmio que Salazar insistia em enviar para a Alemanha nazi. O fornecimento acabou quando a guerra estava a chegar ao fim (1944). Parvo é que ele não era. Mas a comunicação social acompanhou esta e outras histórias passo a passo. Talvez por isso é que as autoridades chinesas proibiram a imprensa estrangeira de entrar na Praça de Tiananmen (1989) e falar com os estudantes. Mas quem não abriu mão da presença dos jornalistas foi o Governo interino do Iraque, presidido por Iyad Allawi, quando tomou posse (2004).
*
Já José Mourinho esteve-se nas tintas para tudo isto. Assinou neste dia um contrato milionário com o Chelsea (2004), não se importando com o facto de Tony Blair ser um dos obreiros da guerra no Iraque. Quem previa que tudo isto iria acontecer foi Nelson Mandela, que entregou as rédeas do poder na África do Sul a Thabo Mbeki (1999). Nesta altura Mandela, malandreco, já andava embeiçado por Graça Machel. Mas ainda estava preso (1962) quando soube o que aconteceu ao ministro britânico da Defesa John Profumo, que teve de se demitir. Andava enrolado com uma "call-girl", que por sua vez se deitava com um funcionário da embaixada da RDA, em Londres (1963). Coisas do tempo da guerra fria. Hoje, 1 de Junho de 2006, o ocaso vai ocorrer perto das nove e a Lua está em fase crescente, o que é um bom sinal. Talvez por isso, Camilo Castelo Branco nos tenha deixado pensamentos como este: “O amor é uma luz que não deixa escurecer a vida”.

quarta-feira, 31 de maio de 2006

"O petróleo absorve todos os erros"

Andrew Solomon, da revista " The New Yorker ", visitou a Líbia

Círculo de fogo ou de imaginação? O grande repórter foi à Líbia para ver como se desenrola o " degelo" qaddafiano. E o que encontrou foi uma indisfarçável luta:" Os círculos governamentais líbios estão ocupados num combate, entre os que entendem que uma aliança e laços estreitos com o Ocidente são boas opções e os que desconfiam muito dessa temática ". O impasse político da " revolução verde ", de significado militar e ditatorial, " obriga " a acumulação " de iniciativas políticas nem sempre coincidentes. O líder do golpe de estado decidiu usar o " carisma " de chefe beduíno inspirado no deserto: joga um dos seus filhos-varões contra o ideólogo do regime, Ahmed Ibrahim, um dos três elementos -chave da ala conservadora, que engloba Musa Kusa, chefe da secreta libanesa, e Abdallah Senoussi, chefe da segurança interna.

O regime tem taras complicadas herdadas do " leninismo " revolucionário " dos primeiros anos e dos reflexos atávicos de dois tipos de colonialismo, a bizantina corrupção conjugada com a burocracia italiana. Apesar dos cofres cheios de divisas fortes provenientes da venda do petróleo de mais alta qualidade do Mundo, o clan Qaddaphi não descura impulsionar as reformas vitais para a sobrevivência do regime, que se agudizam na área do Emprego e da Economia interna. Os empregos na administração e na companhia de petróleo são atribuídos por cotas tribais sem controlo." Devido aos bens essenciais serem massivamente subsidiados, o desemprego é enorme e de conveniência, pois os libios pagam muito pouco para sobreviverem e por isso podem recusar empregos".

O PM lembra ao repórter, a propósito, que o livro verde do líder faz a apologia da troca de produtos, e não da concorrência, assim como descreve o povo como parceiro e não como assalariado. Os empregados por conta de outrém só trabalham da parte da manhã e desconfiam do regime de cotas tribais por causa das maiorias. As mulheres podem usar bikini na praia e são obrigadas a usar o véu islâmico na via pública. O álcool é proíbido e os prisioneiros políticos foram " trasformados " em presos de delito comum, não existindo Imprensa livre.

As receitas do petróleo permitiram acabar com a iliteracia e cobrir o país com uma modelar rede de auto-estradas. O investimento na cobertura sanitária foi colossal e a electricidade chega a todos os lugares, mesmo no deserto. Apesar do " degelo " e da política de sedução para com Ocidente, em geral, e os EUA, em particular, a Líbia confronta-se ainda com graves entraves à liberdade de expressão e reunião. A esperança democrática criou-se em torno da candidatura formal( e ainda no segredo dos deuses...) do filho mais velho do líder,Seif el-Islam al-Qaddafi, formado pela London School of Economics, que liderou as conversações para as compensações para as vítimas de Lockerbie e estreitou laços com a Amnistia Internacional e outras ONG´s de combate ao crime e à corrupção.

O jornalista viajou e encontrou-se com o futuro sucessor declarado de Qaddafi, o PM e altos funcionários do estado e do partido único, sentindo-se sempre muito vigiado. E narra esta edificante história que retrata o impasse líbio: " Um ministro disse-me, a propósito, que se em muitos estados da Europa existem muitos partidos e nos EUA só dois. Por isso, aqui, só existe um único! É a nossa grande diferença ". " Mesmo os reformadores expressam pouco entusiasmo pela democracia eleitoral. A maioria aspira a uma espécide de moderna autocracia: o seu ideal está mais próximo do regime de Atatürk ou do Xá da Pérsia do que do incarnado por Vaclav Havel...", sublinha. A reportagem é fascinante, desdobrada e estruturada pela mediação sublime da inteligência histórica e ideológica.

FAR

Foto de Sérgio Santimano
Ilha de Moçambique. 2002


Da série "Uma História Fotográfica Sobre A Ilha De Moçambique"

Vizinhanças

A blogosfera aumenta a olhos vistos e no meio da quantidade vem muita qualidade. Por isso, não com orgulho, porque como diria Georges Bataille "o orgulho é igual à humildade: é sempre mentira", mas com muita satisfação decidimos juntar aos links do 2+2=5 o Arrastão, do Daniel Oliveira, o Avesso do Avesso, do Filipe Moura, o Boato, do Alexandre Borges, o Cha-no-Yu, da Folha de Chá, Contra a Corrente, do Carlos do Carmo Carapinha, o colectivo Desejo Casar, Estado Civil, do Pedro Mexia, Frangos para fora, de Victor Lazlo and The Bird, Franco Atirador, do Luís M. Jorge, Homem a Dias, O Janseista, o fotográfico João Luc, o colectivo Mau Tempo no Canil, a deliciosa Miss Pearls, Moody Swing, Mundo Pessoa, Poesia & Lda, do João Luís Barreto Guimarães, o musical Quase Famosos, Serendipity, Tabacaria, Tristes Trópicos, (o vazio), do Carlos Gil, Viagens Interditas, de m.m. botelho, Vidro Duplo e o cinéfilo O Zombie Comeu o meu blog. São a nossa proposta do mês e merecem ser visitados.

Os culpados do costume

O Estado português é o pior a pagar dívidas num universo de 22 países europeus. Portugal demora em média 150,8 dias a regularizar as suas obrigações. O estudo agora tornado público é do Intrum Justitia, o principal grupo europeu do sector das cobranças. A pequenina Estónia, por exemplo, está a meio da tabela, em 11º lugar, e demora em média 19,6 dias a pagar o que deve. Para o responsável da Intrum Justitia em Portugal, a "situação é de tal forma preocupante que os atrasos do Estado acabam por funcionar como bola de neve". De acordo com Luís Salvaterra, "o Estado deve às câmaras, aos tribunais, às empresas, aos contribuintes. As câmaras devem às juntas, à electricidade, à água, às construtoras". Partindo do princípio que o relaxe obriga ao pagamento de juros, não seria uma boa ideia penalizar os responsáveis públicos por esta situação? E terminar com este eterno estado de coisas em que nós acabamos por pagar tudo? Não faz sentido continuar a apertar os contribuintes individuais ou colectivos e pouco se fazer para tornar a Administração Pública mais responsável. Atrás de cada dívida há uma cara, na origem de cada falha há uma mão. Seja de director, ministro ou presidente de Câmara. Eles que paguem. Não é justo que continuem a gastar o dinheiro dos nossos impostos para pagar a balda da Administração Pública ou Autárquica. A não ser que vivamos num Estado fora da lei. Será o caso?

terça-feira, 30 de maio de 2006


Ilustração de Ivone Ralha

(...)
Invento a alegria
da terra que habito
porque nela moro.
(...)
António Ramos Rosa

Foto de José Carlos Mexia

TABUADA PO_ÉTICA (cont.)

Po-ética nove

nove são os orifícios de que somos proprietários
a humana espécie
nem todos fedem
alguns até iscam
e são belos
mesmo os tais que fedem
a escatologia é isso
essa ligação entre o belo e o mal cheiroso
e não esqueçam :
ao cheiro da canela
povoou-se o império – pouco, dado o tamanho do jardim e a imensidão da descoberta -
mais tarde o cheiro foram as férias graciosas
a cavalo no paquete
em ampla descoberta dos rissóis de camarão
- por esse tempo o camarão não era ainda classe média
pois a classe média não era ainda média -
a canela diga-se
foi de primórdios dupla :
veio mulata
mas deu
um brasil que não foi total
falta cumpri-lo

f.arom

(continua)

segunda-feira, 29 de maio de 2006


Paul Klee


Poder-se-ia imaginar que três dos mais geniais sábios do século XX, todos
judeus, por acaso, conversando, tivessem tido o diálogo que se segue:

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Walter Benjamin - Há uma quadro de Klee que se intitula «Angelus Novus».
Representa um anjo que parece estar na iminência de se afastar de qualquer
coisa, que fixa com o olhar. Os seus olhos estão esbugalhados, a sua boca
aberta, as suas asas estendidas. É a essa imagem que se deve assemelhar o
Anjo da História. O seu rosto está virado para o passado. Onde nós vemos uma
cadeia de acontecimentos, ele mais não vê que uma só e única catástrofe, que
sem cessar amontoa ruínas sobre ruínas e as precipita aos seus pés. Ele bem
gostaria de se demorar, acordar os mortos e reunir o que foi desmembrado.
Mas do paraíso sopra uma tempestade que se apossou das suas asas com uma
violência tal, que o anjo já não as poderá fechar. Essa tempestade arrasta-o
irresistivelmente para o futuro, ao qual ele vira as costas, enquanto a
pilha de ruínas se eleva ao céu. Essa tempestade é aquilo a que chamamos
progresso.

In «Sobre o Conceito de História».


Franz Kafka - Acreditar no progresso não significa acreditar que já tenha
havido algum progresso. Isso não seria acreditar.

In «Considerações sobre o pecado, o sofrimento, a esperança e o verdadeiro caminho».


Hannah Arendt - O Progresso e a Ruína são duas faces da mesma moeda; são
artigos de superstição, e não de fé.

In «As Origens do Totalitarismo».

A Arendt e o Benjamin foram amigos, muito amigos em vida. Ambos nutriam por Kafka uma admiração - julgo que posso dizer - ilimitada.