terça-feira, 9 de novembro de 2010

Direito à greve?

Uma fonte interna informou-me hoje que a PT está a pedir aos chefes de departamento o nome das pessoas que vão fazer greve no dia 24, supostamente para "garantir os serviços mínimos". Mais concretamente: quem vai trabalhar nesse dia, e se é efectivo ou contratado. Este "pedido de informações" abarca áreas que vão muito para além daquelas que tem de facto de assegurar serviços mínimos (basicamente a gestão da rede). Além de configurar uma óbvia ilegalidade, o "inquérito" da PT é, claro, uma forma de intimidação dos seus trabalhadores e uma evidente limitação do direito à greve. É esta, portanto, a cultura das nossas empresas e dos nossos empresários, o desrespeito pelos direitos dos seus trabalhadores e uma atitude de perseguição e confrontação gratuita, para os "pôr na ordem", e para que trabalhem quietinhos e caladinhos (e note-se que nem é uma greve especificamente da PT, mas uma Greve Geral). Face a este tipo de atitudes, torna-se claro que ter esperanças na "concertação" e no "compromisso", como tantas vezes fazem os nossos sindicatos, é apenas cair na cilada habitual. Para defender os nossos direitos, não resta outra via que a do confronto, e não foram os trabalhadores que a escolheram.

Manifesto dos economistas aterrorizados (introdução)


Crise e Dívida na Europa:
10 falsas evidências, 22 medidas em debate para sair do impasse
Philippe Askenazy (CNRS, Ecole d’économie de Paris), Thomas Coutrot (Conselho Científico da Attac), André Orléan (CNRS, EHESS, Presidente da AFEP), Henri Sterdyniak (OFCE)
(Tradução de Nuno Serra; Revisão de João Rodrigues)
Introdução
A retoma económica mundial, que foi possível graças a uma injecção colossal de fundos públicos no circuito económico (desde os Estados Unidos à China) é frágil, mas real. Apenas um continente continua em retracção, a Europa. Reencontrar o caminho do crescimento económico deixou de ser a sua prioridade política. A Europa decidiu enveredar por outra via, a da luta contra os défices públicos.
“Na União Europeia, estes défices são de facto elevados – 7% em média em 2010 – mas muito inferiores aos 11% dos Estados Unidos. Enquanto alguns estados norte-americanos com um peso económico mais relevante do que a Grécia (como a Califórnia, por exemplo), se encontram numa situação de quase falência, os mercados financeiros decidiram especular com as dívidas soberanas de países europeus, particularmente do Sul. A Europa, de facto, encontra-se aprisionada na sua própria armadilha institucional: os Estados são obrigados a endividar-se nas instituições financeiras privadas que obtêm injecções de liquidez, a baixo custo, do Banco Central Europeu (BCE). Por conseguinte, os mercados têm em seu poder a chave do financiamento dos Estados. Neste contexto, a ausência de solidariedade europeia incentiva a especulação, ao mesmo tempo que as agências de notação apostam na acentuação da desconfiança.
Foi necessário que a agência Moody baixasse a notação da Grécia, a 15 de Junho, para que os dirigentes europeus redescobrissem o termo “irracionalidade”, a que tanto recorreram no início da crise do subprime. Da mesma forma que agora se descobre que a Espanha está muito mais ameaçada pela fragilidade do seu modelo de crescimento e do seu sistema bancário do que pela sua dívida pública.”
Para “tranquilizar os mercados” foi improvisado um Fundo de Estabilização do euro e lançados, por toda a Europa, planos drásticos – e em regra cegos – de redução das despesas públicas. As primeiras vítimas são os funcionários públicos, como sucede em França, onde a subida dos descontos para as suas pensões corresponderá a uma redução escondida dos seus salários, encontrando-se o seu número a diminuir um pouco por toda a parte, pondo em causa os serviços públicos. Da Holanda a Portugal, passando pela França com a actual reforma das pensões, as prestações sociais estão em vias de ser severamente amputadas. Nos próximos anos, o desemprego e a precariedade do emprego vão seguramente aumentar. Estas medidas são irresponsáveis de um ponto de vista político e social, mas também num plano estritamente económico.
Esta política, que apenas muito provisoriamente acalmou a especulação, teve já consequências extremamente negativas em muitos países europeus, afectando de modo particular a juventude, o mundo do trabalho e as pessoas em situação de maior fragilidade. A longo prazo, esta política reactivará as tensões na Europa e ameaçará por isso a própria construção europeia, que é muito mais do que um projecto económico. Supõe-se que a economia esteja ao serviço da construção de um continente democrático, pacífico e unido. Mas em vez disso, uma espécie de ditadura dos mercados é hoje imposta por toda a parte, particularmente em Portugal, Espanha e Grécia, três países que eram ditaduras no início da década de setenta, ou seja, há apenas quarenta anos.
Quer se interprete como um desejo de “tranquilizar os mercados”, por parte de governantes assustados, quer se interprete como um pretexto para impor opções ditadas pela ideologia, a submissão a esta ditadura não é aceitável, uma vez que já demonstrou a sua ineficácia económica e o seu potencial destrutivo no plano político e social. Um verdadeiro debate democrático sobre as escolhas de política económica deve pois ser aberto, em França e na Europa. A maior parte dos economistas que intervém no debate público, fazem-no para justificar ou racionalizar a submissão das políticas às exigências dos mercados financeiros. É certo que, um pouco por toda a parte, os poderes públicos tiveram que improvisar planos keynesianos de relançamento da economia e, por vezes, chegaram inclusive a nacionalizar temporariamente os bancos. Mas eles querem fechar, o mais rapidamente possível, este parêntese. A lógica neoliberal é sempre a única que se reconhece como legítima, apesar dos seus evidentes fracassos. Fundada na hipótese da eficiência dos mercados financeiros, preconiza a redução da despesa pública, a privatização dos serviços públicos, a flexibilização do mercado de trabalho, a liberalização do comércio, dos serviços financeiros e dos mercados de capital, por forma a aumentar a concorrência em todos os domínios e em toda a parte…
Enquanto economistas, aterroriza-nos constatar que estas políticas continuam a estar na ordem do dia e que os seus fundamentos teóricos não sejam postos em causa. Mas os factos trataram de questionar os argumentos utilizados desde há trinta anos para orientar as opções das políticas económicas europeias. A crise pôs a nu o carácter dogmático e infundado da maioria das supostas evidências, repetidas até à saciedade por aqueles que decidem e pelos seus conselheiros. Quer se trate da eficiência e da racionalidade dos mercados financeiros, da necessidade de cortar nas despesas para reduzir a dívida pública, quer se trate de reforçar o “pacto de estabilidade”, é imperioso questionar estas falsas evidências e mostrar a pluralidade de opções possíveis em matéria de política económica. Outras escolhas são possíveis e desejáveis, com a condição de libertar, desde já, o garrote imposto pela indústria financeira às políticas públicas.
Procedemos de seguida a uma apresentação crítica de dez postulados que continuam a inspirar, dia após dia, as decisões dos poderes públicos em toda a Europa, apesar dos lancinantes desmentidos que a crise financeira e as suas consequências nos revelam. Trata-se de falsas evidências, que inspiram medidas injustas e ineficazes, perante as quais expomos vinte e duas contrapropostas para debate. Cada uma delas não reúne necessariamente a concordância unânime dos signatários deste manifesto, mas deverão ser levadas a sério, caso se pretenda resgatar a Europa do impasse em que neste momento se encontra.

domingo, 7 de novembro de 2010

Todo o Tempo-Mundo.



Pelo menos, tanto nos parece acreditar que sim.
We Have All the Time in the World - Louis Armstrong;

quarta-feira, 3 de novembro de 2010

Abaixo o jornalismo!

Será que eu sou assim tão inteligente? Não pode ser. Bem vistas as coisas, eu sei que nem o sou por aí alem. Qual será, então, a razão para que as coisas mais simples e óbvias sejam impossíveis de entender por quase toda a gente? Como se repetem por todo o lado as patranhas mais básicas, sem que ninguém se pareça aperceber delas?
O que é, hoje, um jornalista? Onde ficou, em que beco da história, o seu antigo papel crítico? Quando foi que o jornalista culto, atento, desconfiado, se começou a tornar uma espécie em extinção? Quem são, agora, os "jornalistas", que, com raras excepções, se limitam a servir de papagaios servis, de amibas que há muito esqueceram até a inteligência, quanto mais a capacidade crítica, e cujo papel passou a ser o de repetir as "informações" que são criteriosamente seleccionadas pelas "fontes", isto é, a narrativa condicionada, e muitas vezes falsa até ao tutano, que lhes é transmitida, e que aceitam e reproduzem sem por uma vez pestanejar?
Vou dar só um exemplo. Convido quem quiser a encontrar mais trinta mil exemplos lendo os jornais ou vendo telejornais. O projecto do Sarkozy para o aumento da idade mínima da reforma em França, significa aumentar a idade MÍNIMA da reforma (noto outra vez o MÍNIMA) para os 62 anos, e a idade da reforma para os 67. Alguém me explica porque é que TODOS, mas TODOS os jornais e telejornais se referem ao projecto como "aumentando a idade da reforma para os 62 anos"? Querem fazer de nós estúpidos, ou será que nós somos mesmo estúpidos? Inclino-me para a segunda hipótese, apesar de eu ser extraordinariamente inteligente. Somos também o saber colectivo, e por isso eu devo ser totalmente estúpido também, é a única explicação.
Quanto aos jornalistas propriamente ditos, atrevo-me a achar que, na maior parte dos casos, não o fazem por mal. Tornaram-se uns tarefeiros, uns técnicos, ou pior, uns operários, no mau sentido. Para eles agora o jornalismo é "produzir notícias", isto é, receber acriticamente as patranhas e embrulhá-las o melhor possível no seu papagueado pseudo-técnico, esse que demonstra risivelmente a sua vacuidade e a incapacidade de pensar, nem é a de pensar para além do discurso dominante, é a de pensar ipsis verbis. Deve ser por isso que os jornalistas actuais gostam tanto da companhia daqueles técnicos que são os economistas da treta que saltitam de noticiário em noticiário. Os jornalistas imbecis olham para eles com admiração, e os economistas vendidos olham para os jornalistas com comiseração. O negócio está feito, todos ganham. Essa classe profissional à qual pertenceram o Hemingway, o Mark Twain, o John Reed, o Sartre, olha agora para o Medina Carreira como um guru. Sinal dos tempos, não haja dúvida. Que tempos tão idiotas.
O projecto: acabar com o jornalismo. Nem mais um tostão para um jornal. Nem mais um segundo de atenção para um telejornal. Livremo-nos desta mediocridade rastejante e subserviente que lambe o rabo do poder. Eram o quarto poder? Eram a consciência crítica das sociedades? Isso mesmo, eram. Agora não passam de uns lambe-botas satisfeitos, dispostos a tudo para não perder a posição e a massa que o seu estatuto de cãezinhos lhes proporcionou. E se o jornalista imbecil é a regra, pior ainda é a excepção: o jornalista que tem uma ideia das coisas, mas se cala porque acha que mais vale estar por dentro do assunto (ilude-se tomando esse papel de desprezível colaboracionista como digno), ou, o mais habitual, porque vive bem, e mesmo sabendo que representa o papel de papagaio, o seu métier é o de jornalista, é a sua vocação, as suas skills - um tarefeiro, em suma. Pode ter mil razões, mas o que ele já não é de certeza é o tal quarto poder, a consciência crítica, ou seja o que for, e o que ele já não tem é nenhuma razão de interesse social para eu considerar a sua profissão diferente de a de cavar buracos.
Abaixo o jornalismo!

Moya

They broke their backs lifting Moloch to Heaven

They broke their backs lifting Moloch to Heaven
«It is not surprising that in all efforts to measure great personalities according to psychiatric standards one standard is regularly found to be inadequate: the man doing the measuring. It is not the lack of tact alone which makes the attempt so futile but also the apparent struggle between minds. Hardly ever is the mind of the critical investigator superior to the personality he is testing.»
Hans Prinzhorn in 'ARTISTRY OF THE MENTALLY ILL', first published by Verlag Julius Springer, in Berlin, in 1923
© Manabu Yamanaka, Arakan, 1995
Laura Nadar

terça-feira, 2 de novembro de 2010

"África em foco" - Bok & Bibliotek (Göteborg Book Fair), 23-26 de Setembro de 2010 (2)

Véronique TADJO (Costa do Marfim) prosa, lírica e literatura infantil
Foto de Sérgio Santimano

Sinais

Desenho de Maturino Galvão

Dilma

Tenho dois amigos brasileiros, ambos acima dos cinquenta anos. Partilham um passado de extrema-esquerda e pertencem à ínfima minoria de não-religiosos. Ambos falam dos EUA de um modo que nós, europeus, simplesmente não conseguimos entender: as recordações dos golpes, das perseguições e torturas, que os americanos patrocinaram por toda a América Latina ("o seu quintal") pelos anos 60, 70 e 80, são demasiado presentes, por vezes até para que se possa discutir a política americana de um modo equilibrado com eles. Isto para dizer que o Brasil, queira-se ou não, é outra coisa. Esses meus amigos, uns radicais do pior, exultam com a vitória da moderadíssima Dilma Roussef. Dizem-me que, pela primeira vez na sua vida, olham para o seu país e vêm a vida de facto a melhorar, que pela primeira vez faz-se uma efectiva distribuição da riqueza produzida, e, mais importante até, que o Brasil passou a caminhar de cabeça erguida, que se recusa a continuar a ser o quintal dos americanos e a coutada privada dos caciques. Tudo isso, dizem-me, o devem a Lula, e por isso partilho com eles a sua alegria pela vitória da candidata da continuidade, e o facto de, finalmente, se sentirem vencedores. Isto que acima descrevi, a impressão nítida de que as coisas estão a melhorar, não é algo que se sinta muito neste "mundo ocidental", e por maioria de razão ainda menos neste nosso Portugal, e por isso devíamos olhar para esse Brasil e aprender algumas coisas. Por exemplo, que é, apesar de tudo, possível governar à Esquerda, com independência, com um governo suficientemente forte para se marimbar nos "mercados financeiros" e nas "inevitabilidades" do discurso dominante, e fazer uma sociedade avançar através de receitas que por aqui se consideram velhas e ultrapassadas, como sejam promover o desenvolvimento económico e a redistribuição da riqueza. Com certeza que por cá as condições são diferentes, mas serão assim tão diferentes?

As crises do capitalismo

sábado, 30 de outubro de 2010

Punk is not Daddy

É um título de que gosto muito. E é o mais recente filme de Edgar Pera, sobre a música moderna portuguesa, na década de 80. A não perder, para os verdadeiros melómanos. Mais informações, aqui:
http://crackinthecloud.blogspot.com/2010/10/punk-is-not-daddy-de-edgar-pera-hoje-no.html

A propósito, fui ontem ver O Filme do Desassossego, de João Botelho, baseado nos textos e excertos do Livro do Desassossego, de Bernardo Soares. Uma realização cuidada, imagens excelentes e um grande actor e amigo meu no papel do Bernardo Desassossegado, Cláudio da Silva. Fora isso, é um excelente filme que parece teatro, em que o rigor está na mais ínfima das cenas. O leque de actores é muito bom. Pela negativa, apenas Rita Blanco e Catarina Wallenstein. A primeira por fazer sempre dela própria (o que aqui choca com o ritmo e tom dos outros actores) e a segunda pela deficiente dicção e apressado ritmo do texto, embora os planos da cena principal em que participa sejam belíssimos. No entanto, um dos melhores filmes nacionais dos últimos anos, seguramente. Sobre o conceito de exibir este filme apenas em teatros, eis aqui uma pequena entrevista com o realizador.
http://dn.sapo.pt/gente/interior.aspx?content_id=1670706

E para quem tiver coragem, há o Mistérios de Lisboa, do Chileno Raúl Ruiz. Um filme de 4 horas e picos. (227 min.) Ainda não o vi, mas estou a preparar-me para a maratona! Diz quem viu que vale a pena! Eis o site: www.misteriosdelisboa.com/pt/
Boas Cinefilias!

Sinais

Desenho de Maturino Galvão

quinta-feira, 28 de outubro de 2010

"África em foco" - Bok & Bibliotek (Göteborg Book Fair), 23-26 de Setembro 2010 (1)

Lesego RAMPOLOKENG (África do Sul) - lírica
Foto de Sérgio Santimano

”África em foco” - Bok & Bibliotek (Göteborg Book Fair), 23-26 de Setembro 2010 (introdução)


Realizou-se em Gotemburgo mais um BokMässa (Feira Internacional do Livro).
Este ano como convidado principal vários países africanos com os seus escritores.
Na abertura oficial esteve a escritora Nigeriana Sefi Atta que viria a receber pelas mãos da ministra da cultura sueca Lena Adelsohn o prémio literário “Noma Award”; Carin Norberg, directora do Instituicão Nordica para África, também participou neste acto, abrilhantado depois com a presenca músical de Dobet Gnahoré (Costa do Marfim).
Pelo palco desta feira em Gotemburgo foram desfilando mais de 70 convidados, dez editores de 28 Países africanos, 62 seminários, entrevistas ou apresentações.
Um conhecido escritor dizia que de África, conhecemos as suas danças, os seus batuques, praias , hoteis de luxo, etc., mas sobre a sua intelectualidade pouco ou nada sabemos deste continente…
De uma maneira geral, pelas palestras por mim presenciadas, notava-se por parte de alguns escritores um certo desânimo sobre a realidade actual, interrogando-se as gerações que lutaram e se sacrificaram pelas suas idependencias e liberdades, se era isto que se vê nos dias de hoje o espelho das suas aspirações….?
Sem dúvida que este foi um grande passo para a divulgação dos escritores do nosso continente, muitos deles já com grande projecção internacional, e sempre com aquela vontade de a este estágio virem a chegar muitos mais, num futuro breve… Procurando aumentar mais o interesse pela literatura africana na “cena internacional”. Certamente que em quatro dias não se pode conhecer tudo sobre a literatura deste continente, mas um passo importanto foi já dado, não só o de trazer os escritores africanos como também as suas editoras, porque são estas, afinal, que tem a possibilidade de fazer a divulgação dos livros nos paìses nórdicos. Sem duvida que esta apresentacão da literatura africana nos paises nórdicos foi a maior de sempre!
O 2+2=5 irá a partir de agora publicar algumas fotos de participantes nesta feira.

Texto de Sérgio Santimano